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Memórias de Padre Germano

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pela violência da tempesta<strong>de</strong> <strong>de</strong>viam exalar, e chorava,<br />

consi<strong>de</strong>rando tantos outros infortúnios, tantas esperanças<br />

perdidas, tantas horas <strong>de</strong> árduo trabalho. Pobres, pobres<br />

lavradores!<br />

De repente, entrou Miguel, meu velho companheiro,<br />

segurando Sultão pela orelha, dizendo-me muito assustado:<br />

- Ah, senhor! Sultão enlouqueceu, não sei o que este animal<br />

tem. Entrou na igreja e começou a puxar as mulheres pelos<br />

vestidos e a arranhar os casacos dos homens, correndo <strong>de</strong> um<br />

lado a outro. Latindo agitado, pulou em cima <strong>de</strong> mim e por<br />

pouco me <strong>de</strong>rruba ao chão, e a duras penas consegui trazê-lo<br />

até aqui.<br />

Eu olhei para Sultão, que pingava água e lodo. Peguei sua<br />

cabeça, examinei seus gran<strong>de</strong>s olhos e vi que estavam cheios<br />

<strong>de</strong> lágrimas. O pobre animal; como se compreen<strong>de</strong>sse o relato<br />

<strong>de</strong> Miguel, estava quieto, olhando para mim lastimosamente.<br />

Eu, que amava Sultão como um amigo íntimo da vida inteira,<br />

acariciei-o dizendo:<br />

Por que assustas as pessoas? Por que impacientas Miguel,<br />

que divi<strong>de</strong> contigo seu alimento? Vamos, pe<strong>de</strong>-lhe perdão.<br />

Miguel pôs-se a rir e <strong>de</strong>u vários tapinhas na cabeça <strong>de</strong><br />

Sultão, que, ao se ver acariciado, ganhou novos brios e<br />

começou a grunhir, a dar fortes uivos, pulando em nós dois.<br />

Puxava nosso hábito, cavava o chão impaciente, corria para a<br />

porta, ficava em pé, apoiando-se na janela, batia nos vidros<br />

como se os quisesse quebrar, voltava <strong>de</strong> novo a mim, pegavame<br />

pela manga e me fazia andar à força.<br />

Vendo esse empenho inusitado, eu disse a Miguel:<br />

O que Sultão tem é que <strong>de</strong>ve ter visto algum <strong>de</strong>sventurado e<br />

está nos dizendo que o salvemos.<br />

Ao ouvir isso, Sultão começou a latir <strong>de</strong> novo. Vesti minha<br />

capa e o capuz, e Miguel olhou para mim espantado, dizendo:<br />

Mas, senhor, enlouquecestes? Aon<strong>de</strong> vais chovendo <strong>de</strong>sse<br />

jeito?<br />

Vou aon<strong>de</strong> meu <strong>de</strong>ver me chama. Os homens não <strong>de</strong>vem<br />

ser menos generosos que os cães.

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