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Memórias de Padre Germano

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Porque fui muito má e, quando souber quem sou, o senhor<br />

me expulsará daqui. E, embora às vezes queira morrer, agora<br />

me sinto tão bem que temo per<strong>de</strong>r este abrigo. Fazia tanto<br />

tempo que não dormia sob um telhado!<br />

Como eu sofria ao ouvir suas palavras! Mas me recompus e<br />

disse:<br />

Não tenhas medo <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r a franca hospitalida<strong>de</strong> que aqui<br />

encontras- te. Eu, como sacerdote, tenho a obrigação sagrada<br />

<strong>de</strong> amparar os <strong>de</strong>svalidos, e ninguém mais <strong>de</strong>samparado que<br />

um cego quando reúne, como tu, a cegueira do corpo e a<br />

cegueira da alma. Eu te juro que nem um dia, enquanto<br />

estiveres na Terra, pa<strong>de</strong>cerás fome ou se<strong>de</strong>. Fala, pois, sem<br />

temor.<br />

Então, minha mãe falou, e seu relato foi tão horrível que,<br />

embora haja se passado muito tempo, tanta impressão me<br />

causa recordá-lo que não tenho coragem para passá-lo ao<br />

papel. Só direi que tive <strong>de</strong>z irmãos e todos foram<br />

abandonados, uns ao nascer, outros quando ainda não podiam<br />

nem andar. Eu fui o mais afortunado <strong>de</strong> todos. Ao saber que<br />

outros seres haviam dormido no mesmo claustro materno on<strong>de</strong><br />

eu passei as primeiras horas <strong>de</strong> minha vida, tentei ver se<br />

po<strong>de</strong>ria encontrar alguns <strong>de</strong>les, mas foi tudo inútil, pois minha<br />

mãe não recordava nem lugares nem datas. A única coisa que<br />

recordava era a data <strong>de</strong> meu nascimento, como se a Providência<br />

quisesse me mostrar todas as provas para que eu não<br />

duvidasse <strong>de</strong> que aquela infeliz era minha mãe.<br />

Ao falar <strong>de</strong> mim, ela dizia:<br />

- <strong>Padre</strong>, ele se chamava como o senhor: <strong>Germano</strong>. Que<br />

haverá sido <strong>de</strong>le? Pobrezinho! Era muito humil<strong>de</strong> e sofrido.<br />

Embora sentisse fome, nunca me pedia pão. Não era<br />

rancoroso nem vingativo, e isso que eu o atormentava, porque<br />

não o amava. <strong>Padre</strong>, por que será que não vejo esse e os<br />

outros <strong>de</strong>z vejo constantemente, me ameaçando e se<br />

transformando em répteis que se enrascam em meu corpo?<br />

Aqui estão, aqui! - E começou a chorar com tão profundo<br />

<strong>de</strong>sconsolo, dando uns gemidos tão lancinantes que meu<br />

coração se <strong>de</strong>spedaçava, e só pu<strong>de</strong> atrair sua cabeça contra<br />

meu peito e chorar com ela. Eu lhe teria dito: "Abraça-me, sou

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