02.08.2013 Views

miolo anais final 25cm:miolo anais final 25cm - Fundação Biblioteca ...

miolo anais final 25cm:miolo anais final 25cm - Fundação Biblioteca ...

miolo anais final 25cm:miolo anais final 25cm - Fundação Biblioteca ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

<strong>miolo</strong> <strong>anais</strong> <strong>final</strong> <strong>25cm</strong>:<strong>miolo</strong> <strong>anais</strong> <strong>final</strong> <strong>25cm</strong> 3/22/07 3:26 PM Page 64<br />

64<br />

Ramos e a propósito da celeuma deflagrada pela reação do antropólogo à publicação<br />

do livro de Ruth Landes, Édison Carneiro expõe suas impressões sobre a<br />

pouca afinidade de Ramos com a pesquisa (Carneiro, 1964). 9<br />

As mesmas observações podem ser feitas com relação a seus investimentos na<br />

utilização, interpretação e publicação da obra de Manuel Querino. O espólio intelectual<br />

do historiador e cronista Manuel Querino foi alvo de disputas entre sua<br />

família e aqueles que então ganhavam notoriedade pública como especialistas nos<br />

estudos sobre os negros na Bahia (Corrêa, 1998). Em 1938, em meio às comemo -<br />

rações oficiais do cinqüentenário da Abolição, a bibliografia de temas afro-bra -<br />

si leiros era enriquecida por um volume de rara importância. Manuel Querino,<br />

um autodidata preto e pobre e que “escreveu sobre sua gente”, <strong>final</strong>mente, seria<br />

publicado. Essa condição dava ao seu livro não só um valor histórico distinto,<br />

mas, àqueles que o promoveram, uma cumplicidade poderosa. A disputa em<br />

torno de seus escritos, porém, revelava que não só os seus descobridores e patro -<br />

cinadores tinham consciência do valor da obra de Querino no mercado intelectual<br />

e editorial. Na verdade, a organização dos manuscritos de Querino deu a<br />

Ramos o poder de costurar, sob o rótulo dos temas “africanos”, escritos de natu -<br />

reza diversa sobre culinária, história e geografia. Amigo pessoal, figura influente<br />

na cidade e um dos “informantes” mais citados nas etnografias realizadas na Bahia<br />

nos anos 1930 e 40, o médico Hosanah de Oliveira escrevia a Arthur Ramos em<br />

1936: “(…) pois a filha de Querino estava muito doente, vindo a falecer, <strong>final</strong>mente.<br />

O representante da família, marido da falecida, é um negro muito desca -<br />

rado. Várias vezes fui a sua casa e ele fica sempre de me procurar e até hoje<br />

não o fez. A carta contrato está em seu poder, só faltando assinar. Quando lhe<br />

dei a carta e lhe expliquei o negócio, ficou ele de consultar alguns amigos para<br />

me res ponder (…).” 10<br />

Dois meses depois, sem qualquer novidade a respeito do “negócio Querino”,<br />

Hosanah dava conta de que o “tal negro seu genro” se havia metido com uns<br />

“negócios atrapalhados”, tendo que sair da cidade. A negociação avançou para o<br />

ano seguinte e, mesmo depois de ter cedido os manuscritos de Os costumes africanos<br />

no Brasil (1938) para a coleção organizada por Ramos, o médico baiano reclama -<br />

va das “apoquentações” do genro de Querino. 11<br />

Por fim, tanto os contatos de Otinha quanto a tensa relação de Ramos com<br />

Édison Carneiro e as negociações de Hosanah de Oliveira com o genro de Manuel<br />

Querino constituem-se exemplos do que me referi como sendo a constituição de<br />

um campo de práticas de pesquisa entrecortado por relações de autoridade e domesticidade.<br />

A identificação dos pontos de tensão que marcam essas relações e<br />

os modos através dos quais foram vertidas em “material etnográfico” não é exa -<br />

An. Bibl. Nac., Rio de Janeiro, 119

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!