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miolo anais final 25cm:miolo anais final 25cm - Fundação Biblioteca ...

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<strong>miolo</strong> <strong>anais</strong> <strong>final</strong> <strong>25cm</strong>:<strong>miolo</strong> <strong>anais</strong> <strong>final</strong> <strong>25cm</strong> 3/22/07 3:27 PM Page 91<br />

91<br />

MEMENTO: A ANTROPOLOGIA MINIMA DO DR. RAMOS (E<br />

MISS SUE)<br />

“Somente agora soube que uma preta que esteve aqui empregada uma porção de<br />

tempo é da religião africana – sendo ‘filha do velho’, como diz o Preto Pinheiro,<br />

filha de Oxalufan” 47<br />

Entre os vários pedaços de papéis – sob a forma de cartões, folhetos, fotografias,<br />

lembretes e recortes de jornais – que povoam a Coleção de Ramos, um, em espe -<br />

cial, foi alvo da minha atenção. Em 1948, numa famosa revista de entretenimen -<br />

to, Lasinha de C. Brito publicava uma série de fotos emolduradas por um longo<br />

texto sobre o que chamava “o problema da criadagem”. 48 Sem exceção, fotos<br />

recheadas de mulheres mestiças e negras pretendiam revelar a incautas patroas o<br />

que poderia se esconder sob a face de devotadas empregadas domésticas. Em vez<br />

do interior das cozinhas, as imagens retratavam um universo aparentemente des -<br />

conhecido dos leitores da Fon-Fon. À noite, depois de penoso dia de trabalho,<br />

essas personagens cruzavam recônditos arredores da cidade rumo às gafieiras,<br />

quadras de samba e terreiros de macumba, em busca de prazeres exóticos.<br />

A matéria parecia desvendar segredos de uma cidade desconhecida cuja compre -<br />

ensão não mais se limitava a especialistas dos campos médico, jurídico e policial.<br />

As imagens erotizadas de criadas em roupas justas, cabelo em desalinho e faces<br />

de puro êxtase, expunham uma população cujos hábitos e cultura deveriam agora<br />

posicionar-se frente à lente de observadores mais especializados (Abu-Lughod,<br />

1991). Ramos, de volta da sua missão e viagem aos Estados Unidos, havia-se en -<br />

car regado de tarefas como as de conhecer, traduzir e explicar os sinais dessa estra -<br />

nheza, revelada tanto nos corpos quanto na cultura. Seus interlocutores, a partir<br />

de então, estavam mais próximos. A partir de meados da década de 1940, passou<br />

a encarregar-se dessas tarefas de forma mais direta: tomou os empregados do<br />

edifício em que morava no Rio de Janeiro – no então elitizado bairro do Leme<br />

– como porta de acesso a esse universo, transformando-os em informantes e nativos<br />

de uma curiosa etnografia. Nesse caso, as notas de Ramos sobre macumba,<br />

nas quais se encontram as referências a Guilhermina e Eulina, embora não de<br />

forma explícita, revelam de que maneira Ramos tomara a visão privilegiada do<br />

Edifício Tupi como ponto de partida para a desnaturalização do que não mais<br />

era concebido como patológico ou exótico, mas brasileiro. Sua compreensão ca -<br />

recia de um olhar diferenciado. Ainda assim, Ramos parece insinuar que as<br />

fronteiras dessa identidade deveriam ser reveladas por meio de processos psica -<br />

nalíticos semelhantes aos que parecia ter abandonado ao retornar ao país, em<br />

An. Bibl. Nac., Rio de Janeiro, 119

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