02.08.2013 Views

miolo anais final 25cm:miolo anais final 25cm - Fundação Biblioteca ...

miolo anais final 25cm:miolo anais final 25cm - Fundação Biblioteca ...

miolo anais final 25cm:miolo anais final 25cm - Fundação Biblioteca ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>miolo</strong> <strong>anais</strong> <strong>final</strong> <strong>25cm</strong>:<strong>miolo</strong> <strong>anais</strong> <strong>final</strong> <strong>25cm</strong> 3/22/07 3:27 PM Page 85<br />

85<br />

Otinha, a dedicada coletora de música, línguas, lendas e estórias de vida de<br />

pretos freqüentadores dos xangôs de Pilar e autora da carta transformada em epígrafe<br />

com a qual iniciei esse texto, misturava seus informes etnográficos a notícias<br />

familiares que enviava a Ramos. Entre 1937 e 1939, várias foram as cartas<br />

endereçadas a Ramos contendo referências aos percalços enfrentados pela não<br />

treinada pesquisadora, às voltas com pais-de-santo e velhos pretos, relutantes em<br />

ceder aos seus artifícios de sedução. Como sugere a epígrafe, àquela época Otinha<br />

devotara toda sua atenção ao sargento Padre Nosso e a outras personagens locais,<br />

“descobertos” graças à fama então alcançada pelo ilustre filho da terra, Arthur<br />

Ramos. O médico tornara-se referência assídua dos jornais alagoanos e seu prestígio<br />

local seria reforçado pela reconhecida autoridade do antropólogo especialista<br />

nas “coisas africanas”.<br />

“Na sexta-feira P. N. (sargento Padre Nosso) esteve aqui e me disse que quando<br />

fosse lá não deixasse de levar O negro brasileiro porque este livro serviria de bilhe -<br />

te de entrada. Disse mais, que, quando veio aqui pela primeira vez, se eu não<br />

tivesse lido aqueles trabalhos seus, não teria arranjado coisa alguma. Falando sobre<br />

o preto de que lhe mandei o retrato, disse que ele entende da presente coisa,<br />

mas não está com as faculdades mentais perfeitas (...) tenho notado que eles<br />

querem se aproveitar de mim, querem que eu consiga licença para a seita funcionar<br />

sem interrupção (...) perguntei a Padre Nosso se tinham algum livro que ensinasse<br />

todas as palavras de nossa língua para o africano. Disse que não e que o<br />

velho babalorixá é que ensina muita coisa. Quero ver se consigo agradar o ve lho<br />

e apanhar um bocado de coisas. Se você tem alguma coisa que deseja saber, será<br />

bom dizer, porque assim será mais fácil para mim. Ou melhor, escreva, dizendo<br />

o que deseja que eu consiga do velho babalorixá.” 39<br />

Mas o caso é que a obstinada Otinha se via açodada por outras forças muito<br />

mais poderosas, com as quais aprendera a lidar. Num tom de denúncia, relatava<br />

atos criminosos de policiais locais e tráfico de influência. Em vez de mantidos<br />

no Instituto Médico-Legal do Estado, os objetos de culto apreendidos nos terreiros<br />

alagoanos eram vendidos e enviados para “instituições e pessoas de outros<br />

estados”. Mesmo assim, Otinha não se descuidava de suas obrigações, ao contar<br />

a Ramos como atendera aos assédios dos praticantes da seita e como convencera<br />

o delegado local a relaxar suas incursões policiais aos terreiros nos dias em que<br />

lá estava a observar e colher informações para Ramos. 40 As informações concedidas<br />

por Padre Nosso, um ou outro objeto salvo do desterro e as cartas de Otinha<br />

– evidentemente destituídas de referências à economia doméstica que orientou<br />

An. Bibl. Nac., Rio de Janeiro, 119

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!