ensaio sobre os costumes - Programa de Pós-graduação em ...
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eligi<strong>os</strong>a. Soma-se a isso o fato <strong>de</strong> que, <strong>em</strong> 1713, a bula papal Unigenitus<br />
con<strong>de</strong>nava o jansenismo 64 . Com a bula Unigenitus, a situação <strong>de</strong> intolerância<br />
religi<strong>os</strong>a acentuou-se ainda mais na França, já que a monarquia francesa passou<br />
a contar com o apoio da Cúria Romana <strong>em</strong> sua censura ao jansenismo <strong>em</strong><br />
território francês.<br />
O conflito religi<strong>os</strong>o influenciou profundamente a obra <strong>de</strong> Voltaire, <strong>sobre</strong>tudo<br />
a discussão acerca da tolerância. Ele passou a discutir a tolerância como a<br />
virtu<strong>de</strong> a ser aprendida e ensinada a<strong>os</strong> seus cont<strong>em</strong>porâne<strong>os</strong> para que a<br />
socieda<strong>de</strong> pu<strong>de</strong>sse pr<strong>os</strong>perar.<br />
Com esse entendimento, Voltaire se <strong>em</strong>penhou na <strong>de</strong>fesa da família Calas.<br />
Esse episódio resultou <strong>em</strong> uma <strong>de</strong> suas obras, Tratado <strong>sobre</strong> a Tolerância, 65 <strong>em</strong><br />
1763.<br />
Voltaire não esperou o processo Calas para se preocupar com a<br />
tolerância. A questão já agitava o meio <strong>em</strong> que foi criado: é<br />
notório o clima <strong>de</strong> discussões religi<strong>os</strong>as e <strong>de</strong> perseguições <strong>em</strong><br />
que terminou, durante a juventu<strong>de</strong> <strong>de</strong> Arouet, o longo reinado <strong>de</strong><br />
Luís XIV.<br />
Quando da morte do rei, <strong>em</strong> 1º <strong>de</strong> set<strong>em</strong>bro <strong>de</strong> 1715, as prisões<br />
estavam cheias <strong>de</strong> jansenistas, pessoas muito honestas, vítimas<br />
<strong>de</strong> sua fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> à teologia da ‘graça eficaz’. Infelizmente, Luís<br />
XIV obtivera da corte <strong>de</strong> Roma, reticente, a bula Unigenitus.<br />
Arouet, por sua família e círculo <strong>de</strong> amig<strong>os</strong>, vira <strong>de</strong> perto essa<br />
última tentativa <strong>de</strong> reduzir <strong>os</strong> partidári<strong>os</strong> <strong>de</strong> Jansênio, <strong>de</strong> Arnauld,<br />
<strong>de</strong> Quesnel. Depois, com o advento do Regente, abr<strong>em</strong>-se as<br />
prisões, a pressão atenua-se, mas não <strong>de</strong>saparece. O século<br />
inteiro será preenchido pel<strong>os</strong> esforç<strong>os</strong> do po<strong>de</strong>r para sufocar ou<br />
adormecer um partido religi<strong>os</strong>o, po<strong>de</strong>r<strong>os</strong>o, inerradicável. O<br />
Tratado <strong>sobre</strong> a tolerância evoca as fases <strong>de</strong> crise <strong>de</strong>sse<br />
enfrentamento prolongado. Como sói acontecer, o conflito<br />
religi<strong>os</strong>o permite que tensões <strong>de</strong> outra or<strong>de</strong>m se manifest<strong>em</strong><br />
(POMEAU, 2000, p. 7).<br />
64 Doutrina que t<strong>em</strong> como foco a discussão acerca da graça. Essa discussão dividira já <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />
século XVI, ag<strong>os</strong>tinian<strong>os</strong> e jesuítas. Os ag<strong>os</strong>tinian<strong>os</strong> que <strong>de</strong>fendiam o entendimento da graça na<br />
perspectiva <strong>de</strong> Santo Ag<strong>os</strong>tinho, segundo o qual o hom<strong>em</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> mais da graça que <strong>de</strong> sua<br />
capacida<strong>de</strong> intelectiva para a escolha e a vivência do b<strong>em</strong>. Os jesuítas <strong>de</strong>stacavam que o hom<strong>em</strong><br />
precisava essencialmente da razão. De acordo com eles, Deus conce<strong>de</strong>ra a razão ao hom<strong>em</strong> o<br />
que por sua vez lhe garantiria o acerto <strong>em</strong> suas escolhas e lhe preservaria o livre-arbítrio. Os<br />
jansenistas <strong>de</strong>fendiam a tese d<strong>os</strong> ag<strong>os</strong>tinian<strong>os</strong> e isso provocou uma gran<strong>de</strong> controvérsia teológica<br />
com <strong>os</strong> jesuítas n<strong>os</strong> sécul<strong>os</strong> XVII e XVIII. A Santa Sé manifestou-se com a con<strong>de</strong>nação <strong>de</strong><br />
algumas das teses jansenistas n<strong>os</strong> an<strong>os</strong> <strong>de</strong> 1642, <strong>de</strong> 1655 e <strong>de</strong> 1656, b<strong>em</strong> como com a<br />
con<strong>de</strong>nação do jansenismo com a bula Unigenitus <strong>em</strong> 1713. Para as autorida<strong>de</strong>s francesas, <strong>os</strong><br />
jansenistas eram <strong>os</strong> responsáveis pela divisão do Estado, o que fez com que apoiass<strong>em</strong> a bula<br />
papal e perseguiss<strong>em</strong> <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong>. (PETIT ROBERT, 1993, p923)<br />
65 VOLTAIRE, 2000b.