Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Era o Gonçalo Suçuarana.<br />
XXIII<br />
Vampiro<br />
Quando Gonçalo se curvava para soerguer o corpo do fazen<strong>de</strong>iro e<br />
arremessa-lo no meio das chamas, um vulto emergiu da sombra.<br />
Jão Fera estava em face <strong>de</strong>le.<br />
Recuou o Suçuarana <strong>de</strong> um salto, e sacou da cinta a pistola que<br />
<strong>de</strong>sfechou sobre o inimigo à queima-roupa. Não acertando o primeiro<br />
e segundo tiro, puxou da catana; e começou a esgrimi-la cortando o<br />
ar.<br />
O capanga avançava lento, mudo, sombrio, sem arma em punho,<br />
nem sequer um gesto <strong>de</strong> ameaça; e, todavia, era ele Gonçalo, apesar<br />
<strong>de</strong> armado, quem recuava diante daquele vulto impassível.<br />
Afinal, o pulso do Suçuarana, fatigado <strong>de</strong> cutilar o vento, afrouxou.<br />
Não teve ele tempo <strong>de</strong> pressentir o perigo; colhido pelas espáduas<br />
girou no ar e foi abater-se no canavial abrasado on<strong>de</strong> o arrojara o<br />
braço pujante <strong>de</strong> Jão Fera, que antes <strong>de</strong> arremessar o corpo, o havia<br />
estrangulado.<br />
Nesse momento conseguira erguer-se Luís Galvão. Recobrando<br />
gradualmente os sentidos, observara o fazen<strong>de</strong>iro o fim da luta, e<br />
compreen<strong>de</strong>ra que <strong>de</strong>via a existência a Jão Fera.<br />
Este fitava a labareda que envolvera o corpo do Suçuarana. Espessa<br />
e carregada <strong>de</strong> grosso fumo, a chama se arrastava como a jibóia que<br />
lambe a presa para traga-la; mas outra vez ligeira e farfalhante<br />
<strong>de</strong>spren<strong>de</strong>u-se no ar como a língua da serpente; e fen<strong>de</strong>ndo-se<br />
mostrou no meio do brasido o corpo já calcinado do fanfarrão.<br />
Um sorriso <strong>de</strong> feroz volúpia franziu os lábios do capanga, que ficou<br />
um instante absorto naquele intenso prazer. Recobrado afinal, voltouse<br />
com a idéia <strong>de</strong> correr além, e <strong>de</strong>u com Luís Galvão, que estendialhe<br />
a mão:<br />
- Você me salvou, Jão! Obrigado!<br />
- Salvei; mas não sabe por que? respon<strong>de</strong>u o capanga com a fala<br />
soturna, cravando um duro olhar no semblante do fazen<strong>de</strong>iro.<br />
Este ia respon<strong>de</strong>r; Jão atalhou-o.<br />
158