16.06.2013 Views

Til – José de Alencar

Til – José de Alencar

Til – José de Alencar

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

- Quem é?... Ah! nhô Gonçalo!<br />

- Ora, bem aparecido!... Parece que por cá anoiteceu <strong>de</strong><br />

madrugada!...<br />

- Não sei o que é; mas ando com uma canseira agora. Tenho<br />

cismado que seja dureza. Levo só a dormir!...<br />

No rosto do Chico nem vestígios restavam mais da expressão<br />

aborrida que provocara a presença do Gonçalo. Ao contrário, com o<br />

riso postiço e a oficiosida<strong>de</strong> própria dos estalaja<strong>de</strong>iros, que sabem<br />

seu ofício, se erguera para falar ao freguês; e, apenas o viu apear,<br />

preparou-se para acudir pressuroso a seu serviço.<br />

Neste ponto fazia o dono da taberna uma exceção à habitual<br />

indiferença com que <strong>de</strong> ordinário via chegarem à sua casa, e nela<br />

posarem, viajantes <strong>de</strong> posição muito superior à do Gonçalo. Haveria<br />

por ventura a respeito <strong>de</strong>ste alguma razão particular.<br />

- Bebe-se café por aqui, ou não se usa?<br />

- Sempre há <strong>de</strong> se arranjar!<br />

- Pois então vamos a isto; enquanto <strong>de</strong>scanso um tantinho.<br />

Aqui on<strong>de</strong> vê este <strong>de</strong>gas, já <strong>de</strong>sanquei uma capangada! Quiseram se<br />

meter <strong>de</strong> gorra!...<br />

- Nhanica!... bradou o Chico para <strong>de</strong>ntro. Coa um bocado <strong>de</strong><br />

café!<br />

Ergueu-se então a rapariga e sem espreguiçar-se; tirou da<br />

trempe a panela <strong>de</strong> feijão para <strong>de</strong>itar o boião d’água; e arranjando o<br />

saco, on<strong>de</strong> ainda estava o polme da véspera, que servia para dois<br />

dias, correu a buscar água para lavar a louça.<br />

Entretanto o Gonçalo, <strong>de</strong>rreado sobre o balcão, chalrava com o<br />

Chico sobre o que vinha a pelo:<br />

- E o Bugre, como vai? perguntou <strong>de</strong> repente o Gonçalo.<br />

- Eu lá sei, homem! Anda pelos matos, enquanto não dão cabo<br />

<strong>de</strong>le, que não tarda muito!...<br />

- Então acha que o filma mesmo? Acudiu o Gonçalo com um<br />

alvoroto <strong>de</strong> prazer, que mal disfarçou.<br />

- É o mais certo! Dizem que estão lhe pondo o cerco.<br />

- Ora, isso há muito tempo!<br />

- Mas um dia chega a caipora.<br />

- Como? Se ninguém sabe on<strong>de</strong> ele vive?...<br />

- Lá isso é verda<strong>de</strong>! ninguém!<br />

- Pois eu cá não me escondo! Quem quiser que venha!<br />

De costas para o interior da venda, o Gonçalo, embora olhasse<br />

para fora, espreitava <strong>de</strong> soslaio o Tinguá, que nesse momento,<br />

<strong>de</strong>bruçado sobre o tampo do balcão, on<strong>de</strong> fincava os cotovelos,<br />

parecia inteiramente absorvido em examinar as ferraduras da mula.<br />

- Um dos cravos da mão está bambo! disse ele apontando para<br />

o casco do animal.<br />

- É mesmo! tornou Gonçalo, que levantara a pata da mula.<br />

Pincha-me cá o martelo.<br />

Nesse instante, no topo do caminho que <strong>de</strong>scia à esquerda pela<br />

rampa <strong>de</strong> uma colina, apareceu uma troça <strong>de</strong> caipiras. Vinham a pé,<br />

57

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!