16.06.2013 Views

Til – José de Alencar

Til – José de Alencar

Til – José de Alencar

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Nesse estado <strong>de</strong> estupor, vagava a passos trôpegos pela casa,<br />

até que parava automaticamente na porta da alcova e estendia o<br />

pescoço para <strong>de</strong>ntro. Devia <strong>de</strong> ser <strong>de</strong> ser horrível o espetáculo que<br />

ali surgira a seus olhos, porque <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tantos anos, a só imagem a<br />

fulminava.<br />

Erguia-se-lhe o corpo hirto; um grito <strong>de</strong> terror estalava no peito<br />

e vinha estrangular-se nas fauces. Volvia sobre si; e tombava ao<br />

chão, como uma pedra.<br />

XIX<br />

O <strong>de</strong>sconhecido<br />

Tal era o esboço grosseiro do misterioso drama, que ali se<br />

representara e do qual Berta <strong>de</strong>bal<strong>de</strong> se empenhava em <strong>de</strong>vassar o<br />

segredo.<br />

Mais estimulava a sua curiosida<strong>de</strong> o cuidado com que em<br />

criança a tinham arredado da casa em ruínas, já inspirando-lhe um<br />

terror supersticioso da louca, já recomendando-lhe que nunca se<br />

dirigisse para aquela banda.<br />

Também quando a menina queria saber a história <strong>de</strong> Zana e a<br />

razão por que a negra doida ali vivia abandonada numa casa em<br />

ruínas, que <strong>de</strong>via ter pertencido a pessoa abastada, ninguém lhe<br />

respondia; mas procuravam uma evasiva para não falar sobre tal<br />

assunto.<br />

Tudo isto, longe <strong>de</strong> arredar a menina daquele sítio, bem ao<br />

contrário <strong>de</strong>senvolvia nela uma <strong>de</strong>ssas tentações <strong>de</strong> criança que não<br />

conhecem obstáculos. A pouco e pouco, <strong>de</strong> susto em susto, animouse<br />

ao cabo <strong>de</strong> muitas semanas a aproximar-se das ruínas e observar<br />

Zana em distância, até que afinal se convenceu que era uma criatura<br />

inofensiva a mísera doida.<br />

Já tinha então Berta seus quinze anos, e com a afoiteza da<br />

ida<strong>de</strong> também ganhara mais largueza e <strong>de</strong>senvoltura da ação para<br />

sair <strong>de</strong> casa e <strong>de</strong>morar-se fora sem inspirar cuidados.<br />

Berta passava por enjeitada e ela o sabia, pois nunca lho<br />

ocultavam. Fora a mãe <strong>de</strong> Miguel, nhá Tudinha, quem a recolhera e<br />

criara com o maior <strong>de</strong>svelo. Na casa, porém, on<strong>de</strong> se achava<br />

emprestada e por comiseração, era ela a verda<strong>de</strong>ira senhora, pois<br />

que os donos se faziam cativos seus e porfiavam em adivinhar-lhe as<br />

vonta<strong>de</strong>s para satisfazê-las.<br />

Sem dúvida que nhá Tudinha queria mais bem ao filho <strong>de</strong> suas<br />

entranhas; mas não tinha para ele os extremos, as <strong>de</strong>bilida<strong>de</strong>s e<br />

carinhos, que fazia por essa filha <strong>de</strong> criação, a enjeitadinha. De seu<br />

lado, Miguel, embora se estremecesse pela mãe, <strong>de</strong>certo que<br />

pensava mais em Berta, sua colaça.<br />

Sentindo a sedução que exercia em torno <strong>de</strong> si, não abusava<br />

todavia a menina, transformando-se em uma pequena tirania<br />

doméstica, à imitação <strong>de</strong> certas crianças <strong>de</strong>ngosas. A não ser para<br />

52

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!