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Til – José de Alencar

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cambaleando como um ébrio, afastou-se da menina, sem ânimo <strong>de</strong><br />

por os olhos no semblante <strong>de</strong>la.<br />

- Está embriagado! pensou Berta com indignação que se pintou<br />

em sua fisionomia.<br />

Mas já a carida<strong>de</strong> vibrava as cordas mais suaves <strong>de</strong> sua alma, e<br />

o primeiro assomo <strong>de</strong> severida<strong>de</strong> se afogava nos eflúvios <strong>de</strong> uma<br />

compaixão inexaurível.<br />

- Coitado! murmurou.<br />

A blateração do Brás a surpreen<strong>de</strong>u nesse instante. Voltava<br />

com a roupa em frangalhos, a cara arranhada <strong>de</strong> espinhos, as mão<br />

escoriadas, os cabelos emaranhados <strong>de</strong> gravetos, e todo ele coberto<br />

<strong>de</strong> pó ou lama. Trouxera presa uma cotia, que fora caçar para Berta,<br />

em troca da outra.<br />

Quando a ia entregar à menina, vendo a repulsão que se<br />

<strong>de</strong>senhava no lindo semblante, e adivinhando a causa, o idiota soltou<br />

a sua bestial interjeição, apontando para o vulto <strong>de</strong> Jão Fera.<br />

- Hanh! hanh!...<br />

Tinha o idiota a atitu<strong>de</strong> e o gesto do mastim que interroga o<br />

olhar do senhor, e com um latido surdo pe<strong>de</strong>-lhe que o estume<br />

contar o inimigo.<br />

XXX<br />

Trama<br />

Era véspera <strong>de</strong> São João.<br />

Na fazenda das Palmas, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito cedo que se faziam os<br />

aprestos para a festa daquela noite <strong>de</strong> folguedos. Já o pátio estava<br />

enramado <strong>de</strong> coqueiros; e no centro erguia-se uma pilha <strong>de</strong> lenha<br />

para a fogueira fatídica.<br />

Nhá Tudinha se instalara na cozinha. Cercada <strong>de</strong> uma multidão<br />

<strong>de</strong> caçarolas, frigi<strong>de</strong>iras, gamelas, alguidares e latas, a repolhuda<br />

comadre repimpava-se no cepo do pilão, para distribuir suas or<strong>de</strong>ns<br />

pelas raparigas; mas não se podia ter que não saltasse logo do seu<br />

pe<strong>de</strong>stal e acudisse aqui e ali, em toda a parte, com uma azáfama<br />

crescente, o que fazia dizer a crioula Rosa, em aparte ao Faustino:<br />

- Gentes! Esta mulherzinha tem bicho-carpinteiro.<br />

D. Ermelinda abdicara naquele dia em nhá Tudinha o governo<br />

da cozinha e <strong>de</strong>spensa para ocupar-se exclusivamente com a<br />

recepção dos hóspe<strong>de</strong>s que eram esperados à tar<strong>de</strong>.<br />

Depois do almoço, Linda e Berta com os braços entrelaçados<br />

pelas cinturas, <strong>de</strong>sceram ao terreiro por uma das escadas laterais e<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> percorrerem as ruas <strong>de</strong> coqueiros e o pavilhão <strong>de</strong> folhagem<br />

que tinham arranjado ao redor da fogueira, foram abrigar-se do sol<br />

na horta à sombra <strong>de</strong> uma latada, on<strong>de</strong> podiam conversar à vonta<strong>de</strong>.<br />

Linda parecia triste. A próxima festa, longe <strong>de</strong> enflorar, lhe<br />

<strong>de</strong>sfolhava o brando e mavioso sorriso. Como o dourado inseto que<br />

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