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Til – José de Alencar

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levara. Somente sabia-se que não estava em Itu, ou qualquer outra<br />

vila próxima. Esse abandono, que o marido parecia ter feito <strong>de</strong>la, foi<br />

o que <strong>de</strong>u coragem a Besita para resistir à <strong>de</strong>sgraça que a<br />

acabrunhara, sobretudo quando lhe conheceu todo o alcance.<br />

Mais <strong>de</strong> um ano, <strong>de</strong>pois que a abandonara o Ribeiro, teve<br />

Besita uma filha, cujo nascimento foi inteiramente ignorado em Santa<br />

Bárbara, pelo isolamento a que se con<strong>de</strong>nara a moça <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a morte<br />

do pai. Só o soube, fora Zana, Jão Bugre, cuja <strong>de</strong>dicação apurava-se<br />

com o infortúnio daquela por quem sacrificaria a vida, se pu<strong>de</strong>sse por<br />

este preço resgata-la aos dissabores.<br />

Um dias às ocultas, levou o capanga nos braços a criancinha a<br />

Campinas, a fim <strong>de</strong> a batizar o vigário <strong>de</strong>ssa vila, pondo-lhe o nome<br />

<strong>de</strong> Berta, que tinha sua mãe. Havia ajuntamento na igreja para<br />

assistir a um casamento: era o <strong>de</strong> Luís Galvão com D. Ermelinda.<br />

Custou ao Bugre conter-se, que no seu exaspero não insultasse ali<br />

em face <strong>de</strong> toda gente aquele homem <strong>de</strong> quem fora amigo, e por<br />

quem tinha agora a maior aversão. Reprimiu-lhe o primeiro ímpeto a<br />

lembrança <strong>de</strong> Besita e da mágoa que lhe podia causar o escândalo.<br />

Voltou sombrio e sinistro:<br />

- É preciso que eu mate esse homem! disse ele à moça<br />

entregando-lhe o filho.<br />

- Não quero que lhe faças o menor mal! respon<strong>de</strong>u Besita com<br />

império.<br />

- Mecê sofreria se eu o matasse?<br />

- Muito!...<br />

- Basta, Nhazinha! atalhou Jão.<br />

Algum tempo viveu Besita com sua filhinha no mesmo<br />

isolamento sem outra companhia além <strong>de</strong> Zana, que lhe <strong>de</strong>ra <strong>de</strong><br />

mamar, e o capanga, o qual a servia como um escravo humil<strong>de</strong> e fiel<br />

da casa. Convencida <strong>de</strong> que realmente seu marido a abandonara <strong>de</strong><br />

vez, habituara-se com o correr do tempo à placi<strong>de</strong>z e serenida<strong>de</strong><br />

daquela existência recôndita, que embeleciam as efusões do amor<br />

materno. No seio <strong>de</strong>ssa tranqüila solidão, cercada <strong>de</strong> afeições<br />

sinceras, sentia-se quase feliz.<br />

Seu prazer, nos momentos que lhe <strong>de</strong>ixava a criação, era<br />

enfeitar a filha, e fazer bonito o seu Bebê, arranjando-lhe ora toucas<br />

<strong>de</strong> rendas, ora roupas. Lembrou-se um dia <strong>de</strong> bordar-lhe um cinto<br />

com signo-saimão, zodíacos, figas e outras figurinhas <strong>de</strong> prata, como<br />

se usava então para livrar do quebranto.<br />

Não havendo por perto ourives capaz <strong>de</strong> lavrar os emblemas,<br />

mandou Besita o Bugre a Itu, a fim <strong>de</strong> os encomendar. Com<br />

repugnância, e um inexplicável constrangimento, ausentou-se Jão por<br />

alguns dias <strong>de</strong>ssa casa on<strong>de</strong> vivia quanto amava neste mundo e<br />

sobre a qual velava como um cão fiel e <strong>de</strong>dicado.<br />

Foi isto em uma terça-feira. Na quinta seriam oito horas da<br />

manhã, e Besita fazia saltar sobre os joelhos o seu lindo Bebê,<br />

sentada na alcova, com uma rótula aberta a meio. Eis que<br />

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