editorial protagonistas de um passado histórico recente: lutas
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espondia a essa questão, lágrimas tímidas surgiam. Era como se lhe<br />
tivessem pedido <strong>um</strong>a razão pela qual a sua passagem nesse mundo valeu a<br />
pena. E esse choro contido não era <strong>de</strong> arrependimento. “Eu tinha convicção.<br />
Quando a gente vai pra <strong>um</strong>a luta <strong>de</strong>ssa, a gente sabe que po<strong>de</strong> ser morto,<br />
levar <strong>um</strong>a bala e ficar aleijado, posso viver 30 anos sem ver família, sei lá<br />
se eu ia ter família... A gente ia pro <strong>de</strong>sconhecido disposto a tudo. Abdicava<br />
<strong>de</strong> tudo por causa <strong>de</strong>sses valores. Quando você toma essa <strong>de</strong>cisão, não vê<br />
mais nada pela frente. Não tinha perspectiva nenh<strong>um</strong>a a não ser <strong>de</strong> estar<br />
na luta. Fi<strong>de</strong>l Castro virou presi<strong>de</strong>nte, mas po<strong>de</strong>ria ter levado <strong>um</strong>a bala. Já<br />
Che morreu. Então, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tomar <strong>um</strong>a <strong>de</strong>cisão assim, não era qualquer<br />
coisa que ia me abalar. A gente dizia que, se fosse preso, a luta seria na<br />
trincheira do inimigo. Lá, primeiro a gente não podia permitir que eles<br />
<strong>de</strong>struíssem a organização. Segunda coisa era proteger os companheiros. E<br />
tentar salvar a vida. Preservar a vida <strong>de</strong>ntro daquela perspectiva. Não era<br />
muito fácil não”.<br />
E iria ficar mais difícil ainda. Quem foi buscar Momesso para levá-lo<br />
<strong>de</strong> volta a São Paulo foi o <strong>de</strong>legado Sérgio Paranhos Fleury, conhecido pelos<br />
métodos cruéis e <strong>de</strong>s<strong>um</strong>anos <strong>de</strong> tortura usados durante os interrogatórios<br />
que presidia para obter confissões. “No aeroporto tinham duas filas <strong>de</strong><br />
policiais esperando a gente, tipo batalhão <strong>de</strong> choque, e a gente <strong>de</strong>sarmado.<br />
Esse pessoal tá com medo do quê? (risos)”. No Dops, Momesso foi colocado<br />
n<strong>um</strong>a cela pequena com mais nove pessoas. Lá estava o grupo que tinha<br />
seqüestrado o embaixador americano, Charles Elbrick. “A gente conversava<br />
muito, então distraía”. Cela superlotada, on<strong>de</strong> nem todo mundo podia<br />
<strong>de</strong>itar-se à noite, com banheiro fedido, era distração em comparação às<br />
pessoas arrebentadas que ele via <strong>de</strong>scer todos os dias. Até então, Momesso<br />
só tinha sido interrogado. Por três dias ele foi chamado pelos policiais, mas<br />
não entregou nenh<strong>um</strong>a informação. Dizia apenas que tinha saído <strong>de</strong> São<br />
Paulo para reorganizar a vida pessoal. “Quando pegavam em flagrante,<br />
caíam <strong>de</strong> pau. Quando não, era <strong>um</strong>a ação diária pra quebrar a resistência.<br />
(...). ‘Ah é, não quer falar não? Então vamo ver’. Me colocavam na porta da<br />
sala <strong>de</strong> tortura, e tinha nego gritando lá <strong>de</strong>ntro. ‘Ah, tá ocupado agora.<br />
Daqui a pouco eu chamo’. E eu ficava lá esperando ser chamado pra ser<br />
torturado. Cada vez que abria a porta, [pensava] ‘é agora’. Das minhas<br />
convicções eu tava tranqüilo, mas aquele clima <strong>de</strong> terror, esperando pra ser<br />
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