editorial protagonistas de um passado histórico recente: lutas
editorial protagonistas de um passado histórico recente: lutas
editorial protagonistas de um passado histórico recente: lutas
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Pernambuco, quando a docente responsável pela condução da disciplina<br />
tocou na temática da <strong>de</strong>sobediência civil. Sua fala con<strong>de</strong>nava a<br />
<strong>de</strong>sobediência segundo a arg<strong>um</strong>entação <strong>de</strong> que o direito jamais po<strong>de</strong>ria<br />
prever seu próprio <strong>de</strong>sc<strong>um</strong>primento. À época eu pesquisava justamente a<br />
prática da <strong>de</strong>sobediência civil por parte das rádios comunitárias e entendiaa<br />
como i<strong>de</strong>ntitária àqueles sujeitos que em seu exercício se uniam em nome<br />
da efetivação daquilo que reconheciam como <strong>um</strong> direito h<strong>um</strong>ano. Expus<br />
minhas discordâncias aos posicionamentos da docente, no que ouvi <strong>de</strong> <strong>um</strong>a<br />
colega <strong>de</strong> turma como resposta: - Mas qual é o problema <strong>de</strong>ssas rádios<br />
esperarem alguns anos para funcionar? Qual é a pressa? Imediatamente a<br />
docente complementou: - Também não entendi.<br />
Ainda tentei convencê-las da relevância das rádios comunitárias<br />
como sujeitos coletivos e movimentos populares, mas acredito que tenha<br />
sido minha tentativa <strong>um</strong>a tarefa frustrada. Suas concepções <strong>de</strong> mundo não<br />
permitiam que elas enxergassem o, e se permitiam faziam com elas<br />
discordassem do papel histórico das rádios comunitárias como sujeitos <strong>de</strong><br />
libertação dos(as) oprimidos(as). De fato, as rádios comunitárias percebem<br />
na legislação e no Estado <strong>um</strong>a injustiça que minha colega <strong>de</strong> turma e a<br />
docente não recebiam em suas concepções <strong>de</strong> mundo. Bem afirma Pierre<br />
Bourdieu “que a sensibilida<strong>de</strong> à injustiça ou a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> perceber <strong>um</strong>a<br />
experiência como injusta não está uniformemente espalhada e que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong><br />
estreitamente da posição ocupada no espaço social” (2007, p. 232).<br />
O campo jurídico, em sua luta simbólica pelo monopólio <strong>de</strong> revelar<br />
os direitos e, simultaneamente as injustiças, termina por “con<strong>de</strong>nar o<br />
sentimento <strong>de</strong> injustiça firmado apenas no sentido <strong>de</strong> equida<strong>de</strong>”<br />
(BOURDIEU, 2007, p. 232). Con<strong>de</strong>na, <strong>de</strong>ssa maneira, as rádios<br />
comunitárias e os movimentos sociais e populares que, por construírem a<br />
contra-hegemonia e anunciarem as injustiças por vias não consagradas pelo<br />
campo jurídico, ameaçam a hegemonia. Tal con<strong>de</strong>nação não <strong>de</strong>manda<br />
sentença transitada em julgado, ou <strong>de</strong>vido processo legal. É ela parte do<br />
habitus do campo jurídico, é constitutiva <strong>de</strong> seu senso-com<strong>um</strong>. Nesse<br />
campo, apesar da existência <strong>de</strong> alg<strong>um</strong>as posturas orgânicas aos interesses<br />
da contra-hegemonia como a que eu mesmo pretendo fortalecer com o<br />
presente texto, <strong>de</strong> suas disputas internas pelo po<strong>de</strong>r simbólico <strong>de</strong> dizer o<br />
que é e o que não é o direito, saem vitoriosos naquilo que é <strong>de</strong>terminante à<br />
93