jaqueline fátima roman fundamentos de legitimidade do ... - Unioeste
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1.1.2 Pieda<strong>de</strong><br />
A pieda<strong>de</strong> 19 po<strong>de</strong>ria ser consi<strong>de</strong>rada como a repugnância inata ao ver sofrer. A<br />
pieda<strong>de</strong> natural seria um movimento da própria natureza que faz com que o homem, e até<br />
mesmo alguns animais pa<strong>de</strong>çam ao ver sofrer seus semelhantes. Não se trata <strong>de</strong> uma ação que<br />
passa pelo crivo da razão, mas sim <strong>de</strong> um sentimento anterior a ela: “tal o movimento puro da<br />
natureza, anterior a qualquer reflexão; tal a força da pieda<strong>de</strong> natural que até os costumes mais<br />
<strong>de</strong>prava<strong>do</strong>s tem dificulda<strong>de</strong> em <strong>de</strong>struir” (ROUSSEAU, 1983, p. 253). O próprio Rousseau<br />
conceitua o que enten<strong>de</strong> pela pieda<strong>de</strong> natural:<br />
Falo da pieda<strong>de</strong>, disposição conveniente a seres tão fracos e sujeitos a<br />
tantos males como o somos; virtu<strong>de</strong> tanto mais universal e tanto mais útil no<br />
homem quanto nele prece<strong>de</strong> ao uso <strong>de</strong> qualquer reflexão e tão universal que<br />
as próprias bestas, às vezes são <strong>de</strong>la alguns sinais perceptíveis. Sem falar da<br />
ternura das mães pelos filinhos e <strong>do</strong>s perigos que enfrentam para garantilos,<br />
comumente se observa a repugnância que tem um cavalo ao pisar em<br />
um ser vivo. Um animal não passa sem inquietação ao la<strong>do</strong> <strong>de</strong> um animal<br />
morto <strong>de</strong> sua espécie; há alguns que lhe dão uma espécie <strong>de</strong> sepultura, e os<br />
mugi<strong>do</strong>s tristes <strong>do</strong> ga<strong>do</strong> entran<strong>do</strong> no mata<strong>do</strong>uro exprimem a impressão que<br />
tem <strong>do</strong> horrível espetáculo que o impressiona (ROUSSEAU, 1983, p. 253).<br />
Essa paixão natural, não somente ao homem como também a alguns animais, faz<br />
com que se coloque no lugar <strong>do</strong> outro, no lugar daquele que sofre. “A pitié apresenta-se,<br />
simultaneamente, portanto, como a mais privada e imediata das paixões e a paixão capaz <strong>de</strong><br />
produzir, pela mediação a alterida<strong>de</strong>” (GARCIA, 1999, p. 204).<br />
Rousseau afirma que da pieda<strong>de</strong> natural, outros sentimentos surgem: “com efeito,<br />
que são a generosida<strong>de</strong>, a clemência, a humanida<strong>de</strong>, senão a pieda<strong>de</strong> aplicada aos fracos, aos<br />
culpa<strong>do</strong>s ou a espécie humana em geral?” (ROUSSEAU, 1983, p. 254). Essa paixão, segun<strong>do</strong><br />
o nosso autor, está mais fortemente presente no esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> natureza <strong>do</strong> que propriamente no<br />
esta<strong>do</strong> social. “Sentimento obscuro e vivo no homem selvagem, <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong>, mas fraco no<br />
homem social” (ROUSSEAU, 1983, p. 254). No esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> natureza o homem é racional, mas<br />
esse não é um esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> raciocínio, é um esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> sentimentos, e <strong>de</strong>ntre esses sentimentos a<br />
19 “Se nossas escolhas são feitas sempre a partir das paixões que já amamos, o teatro apenas purga as paixões que<br />
não temos e fomenta as que temos, só reforça o que a natureza e os costumes inculcaram no coração <strong>do</strong> homem.<br />
É a pitié -sentimento inato-, e não a sua educação, o que “sustenta” nosso interesse e sentimento <strong>de</strong> compaixão<br />
para com nossos semelhantes. Mais ainda: a distância produzida entre a realida<strong>de</strong> e sua representação permite<br />
que tomemos sem dificulda<strong>de</strong> o parti<strong>do</strong> <strong>do</strong> justo, <strong>do</strong> bom e <strong>do</strong> belo” (GARCIA, 1999, p. 37).