jaqueline fátima roman fundamentos de legitimidade do ... - Unioeste
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67<br />
Imediatamente, esse ato <strong>de</strong> associação produz, em lugar da pessoa particular<br />
<strong>de</strong> cada contratante, um corpo moral e coletivo, composto <strong>de</strong> tantos<br />
membros quantos são os votos da assembléia, e que por esse mesmo ato<br />
ganha sua unida<strong>de</strong>, seu eu comum, sua vida e sua vonta<strong>de</strong>. Essa pessoa<br />
pública, que se forma, <strong>de</strong>sse mo<strong>do</strong>, pela união <strong>de</strong> todas as outras, tomava<br />
antigamente o nome <strong>de</strong> cida<strong>de</strong> e hoje, o <strong>de</strong> república ou <strong>de</strong> corpo político, o<br />
qual é chama<strong>do</strong> por seus membros <strong>de</strong> Esta<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> passivo, soberano<br />
quan<strong>do</strong> ativo e potência quan<strong>do</strong> compara<strong>do</strong> a seus semelhantes. Quanto aos<br />
associa<strong>do</strong>s recebem eles, coletivamente o nome <strong>de</strong> povo e se chamam, em<br />
particular, cidadãos, enquanto partícipes da autorida<strong>de</strong> soberana e súditos<br />
enquanto submeti<strong>do</strong>s às leis (ROUSSEAU, 1983, p. 33-4).<br />
Já no Discurso sobre a Economia Política 56 Rousseau antecipava o que<br />
posteriormente estaria na obra Do Contrato Social 57 , quan<strong>do</strong> afirmou que o corpo político é<br />
<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>, é essa vonta<strong>de</strong> é a regra para se diferenciar o que justo <strong>de</strong> seu contrário “o<br />
corpo político é também um ser moral 58 , <strong>do</strong>ta<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma vonta<strong>de</strong>; e essa vonta<strong>de</strong> geral que<br />
ten<strong>de</strong> à conservação e ao bem-estar <strong>de</strong> to<strong>do</strong> e <strong>de</strong> cada parte e que é a fonte das leis, é para<br />
to<strong>do</strong>s os membros <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> a regra <strong>do</strong> justo e <strong>do</strong> injusto” (ROUSSEAU, 1995, p. 25). É<br />
<strong>de</strong>ssa soma <strong>de</strong> elementos que resulta o Do Contrato Social 59 , que se trata <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ia<br />
regula<strong>do</strong>ra, um objetivo a ser alcança<strong>do</strong>. Trata-se <strong>de</strong> um projeto “um jogo puro <strong>de</strong> imaginação<br />
oscilan<strong>do</strong> no plano <strong>de</strong> um horizonte <strong>de</strong> contato entre o i<strong>de</strong>al (<strong>de</strong>ver ser) e a resistência e<br />
opacida<strong>de</strong> efetiva <strong>do</strong> real (o que veio a ser)” (GARCIA, 1999, p. 71). Portanto, o Contrato<br />
seria um i<strong>de</strong>al a ser aplica<strong>do</strong> ao mun<strong>do</strong> <strong>do</strong> ser, para que nele o <strong>de</strong>ver ser possa existir. No<br />
entanto, a aplicabilida<strong>de</strong> da teoria <strong>de</strong>senvolvida no Do Contrato Social, não foi analisada por<br />
Rousseau, que tão-só visou fundamentar a legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito político nas socieda<strong>de</strong>s<br />
humanas.<br />
portanto é também um ser moral, que tem uma vonta<strong>de</strong>, e essa vonta<strong>de</strong> geral, que ten<strong>de</strong> sempre à conservação e<br />
ao bem-estar <strong>do</strong> to<strong>do</strong> e <strong>de</strong> cada parte, é que é fonte das leis, constitui para to<strong>do</strong>s os membros <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, em<br />
relação a eles e a si próprio, a regra <strong>do</strong> justo e <strong>do</strong> injusto.” Assim, a vonta<strong>de</strong> geral surge como a expressão direta<br />
e autêntica <strong>do</strong> grupo, que também é seu constante objetivo, e jamais po<strong>de</strong>rá contrariar os interesses <strong>do</strong> corpo ou<br />
<strong>do</strong>s membros porquanto resultante <strong>de</strong> sua integração mútua. I<strong>de</strong>ntifica-se à lei e, enfim, à regra moral – trata-se<br />
se, dúvida, <strong>do</strong> termo mais necessário ao pensamento <strong>de</strong> Rousseau que, por seu intermédio atinge a síntese final”<br />
(MACHADO, 1968, p. 141).<br />
56 Publica<strong>do</strong> em 1755.<br />
57 Publica<strong>do</strong> em 1762.<br />
58 José Oscar <strong>de</strong> Almeida Marques comenta na nota 12 <strong>do</strong> Livro Economia política que A concepção <strong>de</strong> seres<br />
morais <strong>de</strong> Pufen<strong>do</strong>rf certamente influenciou Rousseau: “Portanto, na minha opinião, a <strong>de</strong>finição mais exata que<br />
se po<strong>de</strong> dar <strong>de</strong> SERES MORAIS é a seguinte: trata-se <strong>de</strong> certos mo<strong>do</strong>s que os seres inteligentes acrescentam às<br />
coisas naturais ou aos movimentos físicos, procuran<strong>do</strong> restringir ou dirigir a liberda<strong>de</strong> das ações voluntárias <strong>do</strong><br />
homem, com o objetivo <strong>de</strong> colocar em or<strong>de</strong>m, conveniência e beleza na vida humana” (Samuel Pufen<strong>do</strong>rf, Lê<br />
Droit <strong>de</strong> Nature et dês Gens, trad. Jean Barbeyrac, Londres, Jean Nours, 1740, Liv. I, cap. III, 3, p.3.<br />
59 “O Contrato Social nada mais é senão a transposição, para o plano da consciência, da realida<strong>de</strong> social e<br />
formulação explicita, em regra racionalmente formulada e voluntariamente aceita, <strong>do</strong> processo natural da<br />
formação <strong>do</strong>s grupos e da transfiguração <strong>do</strong> individuo pelas relações sociais” (MACHADO, 1968, p. 172).