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Uma Epopeia entre o Sagrado e o Profano: - Estudo Geral ...

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soldados, cativos, gente vária” 417 , Robert Smith vê nelas “imagens de cavaleiros,<br />

mendigos e mercadores” 418 , Augusto Nunes Pereira sugere a presença de “reis,<br />

guerreiros, escravos, figuras populares, talvez a representar a sociedade daquele<br />

tempo” 419 , enquanto Rafael Moreira, avança já para a captação de “um mostruário de<br />

tipos e cenas do «mundo às avessas» e do sentido cómico-trágico digno de um<br />

Brueghel” 420 .<br />

Perante uma observação atenta de cada escultura, identificam-se de imediato três<br />

aspectos fundamentais, do ponto de vista interpretativo: estatutos distintos – guerreiro,<br />

rei ou nobre, cativo 421 – que por vezes se fundem, numa clara referência à instabilidade<br />

e transitoriedade dos mesmos; grupos etnográficos e culturais distintos – judeus,<br />

mouros, negros e, talvez mesmo, cristãos – que resumem o mundo humano dominado<br />

pelo Rei e a Igreja; estados de alma distintos – desespero, raiva, resignação,<br />

introspecção – cuja variedade concorre sempre para um sentimento geral de<br />

irremediável desânimo 422 . Perfilhamos, portanto, e sem excluir a oportunidade das<br />

interpretações anteriormente referidas, a opinião de Pedro Dias, que relaciona<br />

directamente estas figuras com a Expansão, numa “clara alusão aos reinos submetidos<br />

pelas nossas armas, na África e no Índico”, numa altura em que “se estava no auge do<br />

poder de Afonso de Albuquerque, em terras da Índia e do Mar Arábico” 423 .<br />

Concorrendo, assim, para a confirmação dos sucessos imperiais da Coroa, nas suas<br />

múltiplas vertentes de sujeição económica, social e cultural do Outro e, sobretudo, de<br />

esforço de Evangelização, estas estatuetas constituem simultaneamente uma galeria de<br />

gestos e expressões, bem como de apontamentos etnográficos (obviamente turvados<br />

pela idealização germânica dos povos em questão) que, conforme desenvolveremos<br />

adiante, servem de complemento aos quadros urbanos da cimalha, numa alusão<br />

simbólica aos diversos contornos - de maior ou menor imposição bélica, consoante a<br />

resistência oferecida por cada porto – que assumiu a Expansão portuguesa.<br />

Perante o longo desfile de personagens, quase figuras-tipo de uma sociedade já de<br />

si complexa e em vias de maior complexificação, não podemos, no entanto, deixar de<br />

417<br />

GONÇALVES, António Nogueira, Igreja de Santa Cruz de Coimbra (Breve guia históricaarqueológica),<br />

Coimbra, 1940, p.38.<br />

418<br />

SMITH, Robert C., Cadeirais de Portugal, p.12.<br />

419<br />

PEREIRA, Augusto Nunes, Do Cadeiral de Santa Cruz, p.146.<br />

420<br />

MOREIRA, Rafael, Dois Escultores Alemães em Alcobaça, p.109.<br />

421<br />

Vide Vol. II, Anexo I, inventário dos atlantes que suportam o friso corrido do peitoril das estantes.<br />

422<br />

BRAGA, Maria Manuela, Os Cadeirais de Coro no Final da Idade Média em Portugal, p.227.<br />

423<br />

DIAS, Pedro, “O Cadeiral de Santa Cruz de Coimbra”, O Brilho do Norte, p.240.<br />

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