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Uma Epopeia entre o Sagrado e o Profano: - Estudo Geral ...

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Inscritos, assim, na via menos severa da opção canonical de Santo Agostinho, os<br />

monges crúzios caracterizavam-se por uma vivência religiosa e quotidiana mais<br />

permissiva, que “Aceitava o consumo de carne em determinadas circunstâncias, não<br />

impunha aos seus cónegos o trabalho manual, defendia a pobreza e a partilha de todos<br />

os bens pela comunidade.” 75 e que, acima de tudo, por via do modelo de São Rufo de<br />

Avinhão, pressupunha o cumprimento de uma missão pastoral que os aproximava<br />

inevitavelmente dos centros urbanos. Apesar da aparente indulgência da via canonical<br />

seguida em Santa Cruz desde a sua fundação, em 1131, exigia-se aos seus seguidores<br />

rigor no cumprimento das suas funções, comedimento na sua relação (desde sempre<br />

muito próxima) com o poder e cautela perante os encantos da ambição. Esta seria, aliás,<br />

uma preocupação muito específica dos crúzios, que desde cedo revelam uma aguda<br />

noção das vantagens mas também dos perigos da sua umbilical relação com o poder<br />

régio. De acordo com Saul António Gomes, a partir da transcrição de uma tábua moral<br />

sobre o modelo canonical, redigida no scriptorium de Santa Cruz nos alvores do século<br />

XV, o cónego regrante de Santa Cruz tinha o dever de “ensinar e preegar e sementar a<br />

palavra do seu Rey e Senhor”, sempre com a noção de que “A fortuna do mundo, as<br />

honrarias e dignidades podiam elevar o religioso a posições cimeiras na Igreja e na<br />

sociedade, mas quanto maior a honra, tanto maior a queda nas «profundezas do<br />

Inferno nom embargante que este mundo lhe vaa muito bem».” 76<br />

Embora não saibamos ao certo qual a eficácia dos crúzios em relação à pregação, se<br />

bem que a fortuna da escola crúzia faça prever o sucesso dessa sua empresa, sabemos<br />

que a oração não só foi levada muito a sério na igreja, como elevada a expoentes de<br />

excelência, pela sua ligação à música e ao canto litúrgico, em que os cónegos de Santa<br />

Cruz eram exímios. Se esta simples constatação, merecedora de outros<br />

desenvolvimentos, é desde logo suficiente para antevermos uma das razões que teriam<br />

explicado as preocupações tidas com a reformulação do espaço coral e,<br />

consequentemente, conduzido ao empenho colocado na encomenda de um cadeiral de<br />

coro, ela tornar-se-á tão mais interessante quanto nos for possível prolongar as já<br />

distantes palavras de Joaquim de Carvalho, quando diz que “A musica em Santa Cruz<br />

75 GOMES, Saul António, “A religião dos clérigos: vivências espirituais, elaboração doutrinal e<br />

transmissão cultural”, História Religiosa de Portugal, AZEVEDO, Carlos Moreira (dir.), Lisboa, Círculo<br />

de Leitores, 2000, vol. I, pp.362 e 363.<br />

76 GOMES, Saul António, “A religião dos clérigos: vivências espirituais, elaboração doutrinal e<br />

transmissão cultural”, pp.362 e 363.<br />

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