Uma Epopeia entre o Sagrado e o Profano: - Estudo Geral ...
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um vincado carácter religioso e hagiológico, o de Coimbra destaca-se por um tom<br />
discursivo muito peculiar, que não deixa de ser religioso no conteúdo mas que se<br />
apresenta eminentemente profano na forma, aproximando-se do formulário iconográfico<br />
de Tomar mais do que qualquer outro, mas afastando-se dele por um tom imperialista<br />
que não partilha com mais nenhum.<br />
Se não duvidamos, portanto, em ver D. Manuel atentamente envolvido nas duas<br />
primeiras obras de mobiliário coral desse novo tipo que ele tanto terá apreciado em<br />
Toledo – e às quais imprimiu com maior intensidade os signos do seu discurso político,<br />
expansionista e evangelizador –, cremos também que ele tenha deixado à<br />
responsabilidade de D. Pedro Gavião as minudências burocráticas e da correcta<br />
observância da vontade régia que deu o mote à obra.<br />
Já no que diz respeito à reunião da equipa de trabalho, um terceiro elemento terá<br />
de ser tido em consideração: o próprio Mestre entalhador, ou carpinteiro de marcenaria,<br />
que seria, no fundo, o mestre-de-obras de um estaleiro cuja forma e regras só podemos<br />
imaginar, com base em pistas desejavelmente sólidas. Ainda que à distância de cerca de<br />
várias décadas, o Livro dos Regimentos dos Oficiais Mecânicos da mui nobre e sempre<br />
leal cidade de Lisboa, de 1572 167 , não deixa de nos permitir o vislumbre das normas<br />
fundamentais do trabalho e organização destes artistas e artífices da madeira que, com<br />
as devidas reservas a que a distância temporal nos obriga, terão pautado<br />
transversalmente o exercício do ofício de marceneiro e entalhador durante o século<br />
XVI.<br />
Se, por um lado, se prevê que os oficiais visados neste regimento sejam, ao nível do<br />
trabalho artístico da madeira, já maioritariamente portugueses, progressivamente<br />
formados nas oficinas dos mestres entalhadores estrangeiros que aportavam a Portugal,<br />
talvez não seja de todo inverosímil que as próprias práticas denunciadas nestes<br />
documentos normativos provenham tanto de uma vivência empírica do próprio ofício,<br />
como dos aportes específicos desses mesmos mestres, maioritariamente flamengos e<br />
germânicos, e depois também franceses, cuja regulamentação e organização oficinal<br />
estariam necessariamente mais desenvolvidas.<br />
167 Cf. CORREIA, Vergílio. Livro dos Regimẽtos dos officiaes mecanicos da mui nobre e sẽpre leal<br />
cidade de Lixboa (1572), Coimbra, Imprensa da Universidade, 1926.<br />
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