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Uma Epopeia entre o Sagrado e o Profano: - Estudo Geral ...

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cantos e ritos corais, em demonstrações de preguiça e indolência, negligência e<br />

desobediência 29 . No segundo caso, a existência de críticas tão ácidas como as de<br />

Sebastian Brant leva-nos a reconhecer que a estes delitos menores se juntavam por<br />

vezes episódios de verdadeira desordem, incumprimento total das regras e ritos<br />

estabelecidos para o coro, altercações e mesmo agressões físicas <strong>entre</strong> os religiosos 30 ,<br />

cuja generalização tem de ser evitada mas cuja existência não se deve considerar como<br />

absolutamente pontual, ainda que alguma moderação possa ser aplicada ao previsível<br />

exagero literário.<br />

Efectivamente, facilmente se compreende que o clero não estava completamente<br />

fechado à vida profana – não tanto quanto se desejava, talvez – e que nesta vida profana<br />

se encontram os negativos de grande parte das imagens que nos surgem nas margens<br />

dos cadeirais. A desmistificação da ideia de absoluta gravidade do coro e dos seus<br />

ocupantes, pode continuar através das palavras de um contemporâneo: “Muito antes de<br />

serem homens, os rapazes são impelidos para as ordens… A maior parte resigna-se a<br />

isso para satisfazer o estômago; não têm nenhuma espécie de gosto pelo<br />

sacerdócio…galhofam alegremente, autênticos gatos com cio.” 31 Quaisquer que sejam<br />

as limitações de semelhante afirmação, a verdade é que várias fontes corroboram esta<br />

falta de identificação vocacional com a vida de oração e dedicação a Deus por parte de<br />

vários religiosos que, por isso mesmo, facilmente se <strong>entre</strong>gavam a actividades e<br />

ocupações perfeitamente mundanas. A exigência dos Ofícios Divinos, aliás, afastava<br />

muitas vezes os cónegos do coro transformando o absentismo numa das principais faltas<br />

apontadas pelo clero a si próprio. Os que, por sincera tentativa ou por interesse na<br />

merecida prebenda, se esforçavam por participar em todos os ofícios, acabavam muitas<br />

vezes por se aborrecer e sair do coro “para ir dar uma volta e olear a carruagem” 32 ou<br />

ficavam <strong>entre</strong>gues a conversas, jogos e tagarelices. <strong>Uma</strong> vez mais, Sebastian Brant é<br />

29<br />

“Ao prior, no entanto, como ao subprior e ao chantre mandamos firmemente que vigiem e espevitem<br />

todos e cada um dos monges, jovens, adolescentes ou de menor idade, presentes no coro, à celebração<br />

das horas nocturnas, para que cantem solícita e diligentemente os Salmos, os Hinos, os Responsório e as<br />

Antífonas. Os néscios serão apontados nos livros convenientes e necessários. Os jovens, no entanto,<br />

molengões, sonolentos, negligentes, atrevidos ou desobedientes sejam apontados no Capítulo e, segundo<br />

a culpa, assim recebam em qualidade e em quantidade a pena devida”. GOMES, Saul António.<br />

Visitações a Mosteiros Cistercienses em Portugal, Séculos XV e XVI, Lisboa, IPPAR, 1998, p.157.<br />

30<br />

Vide Vol. II, Anexo II, Fig. 8.<br />

31<br />

Apud cit, HEERS, Jacques, Festas de Loucos e Carnavais, (trad. Carlos Porto), Lisboa, Publicações D.<br />

Quixote, 1987, p. 28.<br />

32<br />

LOCKER, Jakob (1471-1528), “De cauillatione sacerdotum in choro”, Stultifera navis mortalium. Olim<br />

a Sebastiano Brant Germanicis rhythmis conscriptus et per Iacobum Locher Latinitati donatus<br />

(disponível online em: http://www.uni-mannheim.de/mateo/camena/locher2/jpg/s213.html, consultado a<br />

15/07/10).<br />

22

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