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Esfregando o rosto com uma das mãos, ele voltou seu olhar das armas que enfeitavam as paredes<br />
para os móveis do aposento. Sob a janela havia uma comprida bancada de trabalho, coberta com<br />
ferramentas de solda, aparelhos de medição, limas e muito mais. Em uma escrivaninha menor, ele<br />
encontrou um mecanismo de disparo desmontado. Era muito parecido com o padrão usado na<br />
maioria dos rifles, mas o percussor da arma tinha um formato incomum.<br />
“Posso?”, perguntou, estendendo a mão para pegá-lo.<br />
“Mas é claro.”<br />
Bram segurou o mecanismo e o virou nas mãos, inspecionando o maquinário intrincado.<br />
“É para ser um mecanismo de disparo aprimorado”, disse Sir Lewis. “Está quase perfeito, acredito.<br />
Mas deixei-o de lado por um instante, para trabalhar novamente no maldito canhão. Estou agonizando<br />
nisso há anos.”<br />
“Um canhão?” Ele notou o modelo de madeira, em escala, sobre a bancada. “Conte-me sobre isso.”<br />
Sir Lewis passou a mão pelo cabelo e soltou uma exclamação de frustração.<br />
“Estou brigando com essa ideia há décadas. É um canhão estriado.”<br />
Bram assobiou, impressionado. Todos os canhões possuíam canos lisos. Eram o equivalente, na<br />
artilharia, aos mosquetes; alcance e força decentes, mas precisão apenas razoável. Porém, se um<br />
canhão pudesse ser estriado, como o cano de um rifle, seus projéteis não apenas iriam mais longe e<br />
com mais velocidade, como sua precisão também seria muito maior. Um canhão estriado daria ao<br />
Exército Britânico uma boa vantagem em qualquer situação de ataque. Poderia ser o que Wellington<br />
precisava para chutar Napoleão para fora da Espanha.<br />
“Devo ter tentado umas doze variações no projeto”, disse Sir Lewis, gesticulando na direção da<br />
miniatura de canhão sobre a mesa. “E centenas de conceitos nunca saíram do desenho, mas estou com<br />
um bom pressentimento quanto a este.” Ele deu batidinhas no modelo. “Este é o bom. Posso sentir nos<br />
meus ossos velhos e cansados.”<br />
O velho sorriu para Bram.<br />
“Eu entendo você, Rycliff. Melhor do que pode imaginar. À nossa própria maneira, nós dois somos<br />
homens com objetivos, homens de ação. Nenhum de nós está pronto para abandonar o campo. Eu sei<br />
que é difícil ficar preso nesta vila minúscula e exótica, enquanto guerras são travadas. Deve ser uma<br />
tortura para você.”<br />
“Tortura descreve bem a situação.” Tortura doce, sardenta, do tipo mais puro.<br />
“Minha Susanna está lhe causando problemas?”<br />
Bram engasgou com a própria língua. Ele sentiu o rosto esquentar enquanto tossia com a boca<br />
coberta pelo braço.<br />
“Não se preocupe, você pode ser sincero comigo.” Sir Lewis deu-lhe tapinhas nas costas. “A garota<br />
tem boa intenção, mas eu sei que ela tem uma tendência a exagerar. Inteligente como é, a vila toda<br />
depende de seus conselhos. Ela gosta de ajudar.”<br />
Exatamente, pensou Bram. Ele estava começando a compreender que Susanna Finch tinha o<br />
impulso de cuidar daqueles à sua volta. Fosse oferecendo comida, encorajamento, pomada curativa…<br />
ou o mais doce e generoso abraço que um homem pudesse esperar receber.<br />
Você não precisa me atacar sempre que quiser ser tocado. Ou abraçado.<br />
Ele engoliu em seco, tentando apagar o gosto dela de sua boca.<br />
Sir Lewis continuou:<br />
“Mas minha filha nem sempre compreende a necessidade que um homem tem de se sentir útil. De<br />
continuar lutando, trabalhando por seus objetivos.” Ele abriu os braços, indicando a oficina. “Susanna<br />
preferiria que eu parasse totalmente com isto, mas não posso, não antes do dia em que irei parar de<br />
respirar. Eu sei que você me entende.”<br />
“Entendo”, anuiu Bram.