You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
166 paola berenstein jacques<br />
Para fechar, eu queria falar um pouco da questão da diversidade,<br />
da heterogeneidade, da multiplicidade, por quê? Porque essa<br />
espetacularização a que eu me referi está diretamente relacionada<br />
a uma diminuição da própria experiência d<strong>as</strong> cidades enquanto<br />
prática cotidiana, que acredito que possa nos mostrar alguns<br />
caminhos alternativos, ou seja, microdesvios nesta lógica espetacular.<br />
Essa prática cotidiana não é fixa, não é estática, é uma<br />
construção coletiva e subjetiva, ela não está dada e depende da<br />
tensão entre os diferentes, entre <strong>as</strong> diferenç<strong>as</strong>. Não vejo a diversidade,<br />
talvez multiplicidade seja um termo melhor, como uma<br />
variedade de cultur<strong>as</strong>, m<strong>as</strong> sim como um leque de possibilidades<br />
múltipl<strong>as</strong>, diferentes, de relacionar ess<strong>as</strong> cultur<strong>as</strong> heterogêne<strong>as</strong>.<br />
Valorizar <strong>as</strong> diferenç<strong>as</strong> não significa então valorizar <strong>as</strong> cultur<strong>as</strong><br />
diferentes em si, m<strong>as</strong> sim valorizar a tensão entre el<strong>as</strong>, <strong>as</strong> possibilidades<br />
de relação e de conflito entre el<strong>as</strong>. Para mim, o que legitima<br />
o caráter público de algo, por exemplo, do espaço público,<br />
ou ainda, d<strong>as</strong> polític<strong>as</strong> públic<strong>as</strong> – sejam el<strong>as</strong> culturais ou urban<strong>as</strong>,<br />
ou amb<strong>as</strong> – seria exatamente essa tensão entre diferenç<strong>as</strong>, esse<br />
espaço de possibilidades, um espaço que não evita o conflito, não<br />
é pacificador, padronizado ou homogeneizado. Seriam espaços<br />
abertos, espaços em movimento, em transformação permanente.<br />
Os espaços espetacularizados ou privatizados que são espaços<br />
fixos, pacificados, onde se tenta a eliminação dos conflitos, d<strong>as</strong><br />
diferenç<strong>as</strong>, onde se busca viver entre iguais, idênticos, como na<br />
proposta dos condomínios fechados, do new urbanism que está<br />
sendo importado <strong>para</strong> cá, <strong>as</strong> “cidades disneylândia”, cidades que<br />
são feit<strong>as</strong> <strong>para</strong> uma mesma “identidade”, uma mesma etnia, uma<br />
mesma idade, uma mesma opção sexual... <strong>Cidades</strong> exclusiv<strong>as</strong><br />
<strong>para</strong> jovens, velhos, negros, gays etc., que é a “moda” dos empreendimentos<br />
nos eua. Para mim, ao contrário, é exatamente<br />
a tensão entre <strong>as</strong> diferenç<strong>as</strong>, ou seja, o próprio conflito de interesses<br />
e desejos que caracteriza o que a cidade e a cultura têm de<br />
mais precioso, que seria precisamente o seu caráter dissensual<br />
de construção pública e coletiva.