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“Senhora dona Bahia, /<br />
nobre e opulenta<br />
cidade, / madr<strong>as</strong>ta dos<br />
naturais, / e dos<br />
estrangeiros madre...”.<br />
que <strong>as</strong> identidades se dissolvem na situação comum, do espaço<br />
comungado na pobreza, na feiúra e na vida de sacrifícios cotidianos<br />
em relação aos serviços públicos d<strong>as</strong> cidades.<br />
Tomemos o exemplo da cidade do Salvador, a qual consideramos,<br />
em um artigo, como “cidade d<strong>as</strong> desigualdades” (1999),<br />
e, em um outro, mais como “cidade invisível e dissimulada”<br />
(2002), ou ainda como em Mal-estar na baianidade: perd<strong>as</strong> e danos<br />
(2002). A cidade “tão dessemelhante” de Gregório de Matos<br />
(s.d., p. 30), m<strong>as</strong> também “cidade madr<strong>as</strong>ta” 5 (p. 39), demonstra<br />
a diversidade de olhares, dos lugares em que se posicionam os<br />
observadores. O olhar social da diversidade social obrigatoriamente<br />
deve ser o da economia, da divisão de cl<strong>as</strong>ses sociais; o<br />
olhar alienado da cultura é o da dissimulação e da afirmação<br />
d<strong>as</strong> diferenç<strong>as</strong> como um direito e, a igualdade de oportunidades,<br />
como uma alienação d<strong>as</strong> condições sociais de produção da<br />
riqueza. A afirmação ideológica dos direitos sociais não garante<br />
a aplicação real, concreta, desses direitos.<br />
Consegue-se que a capoeira seja reconhecida como patrimônio<br />
cultural; que o acarajé também o seja; que o candomblé e<br />
a umbanda sejam religiões respeitáveis, quando outrora eram<br />
vist<strong>as</strong> como magia e feitiçaria, na esteira do estigma e preconceito<br />
com a cultura africana. Reconhece-se o dia da consciência negra<br />
e uma estátua de Zumbi é erguida na Praça da Sé de Salvador.<br />
A <strong>para</strong>da gay reúne milhares de pesso<strong>as</strong>, <strong>as</strong>sim como <strong>as</strong> manifestações<br />
dos evangélicos e <strong>as</strong> procissões dos católicos. Ciclist<strong>as</strong>,<br />
motociclist<strong>as</strong>, corredores e maratonist<strong>as</strong> também se encenam<br />
n<strong>as</strong> ru<strong>as</strong>, <strong>as</strong>sim como os mais diversos grupos da terceira idade.<br />
Vez por outra, são moradores revoltados que fecham <strong>as</strong> ru<strong>as</strong> principais,<br />
em protesto contra chacin<strong>as</strong> e homicídios cometidos por<br />
policiais. A cidade fala, protesta e se revela, por uns momentos,<br />
m<strong>as</strong> logo volta à normalidade do destino consentido, conformado,<br />
à impotência de ir além do “juris esperneandi”.<br />
202 gey espinheira