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Contudo, referindo-me agora à questão do Patrimônio<br />
Histórico Cultural, desejo ressaltar o seguinte: n<strong>as</strong> sociedades<br />
atuais, ao se tratar de “p<strong>as</strong>sados presentes”, estes dependem de<br />
três variáveis. Não devemos falar de patrimônio, hoje, sem nos<br />
referirmos, primeiro, à mídia (processos midiáticos da construção<br />
de subjetividades individuais e/ou coletiv<strong>as</strong>, hoje dominante<br />
n<strong>as</strong> “sociedades de controle”, no novo estágio do capitalismo);<br />
segundo, sem entender a forte presença do mercado (pois, na<br />
atual f<strong>as</strong>e do capitalismo informacional, tudo vira mercadoria,<br />
inclusive os bens culturais); e, terceiro, sem sublinhar a relação<br />
saber/poder sob a égide da ação política, pois se torna impossível,<br />
hoje, pensar em patrimônio sem ess<strong>as</strong> variáveis. Além del<strong>as</strong>,<br />
surge uma nova conceituação de tempo, da temporalidade enquanto<br />
p<strong>as</strong>sado, e se deve relacionar tal abordagem ao conceito<br />
de memória. Neste sentido, como afirma Andrea Huyssen 2 , em<br />
tempos conturbados e conflitantes como os de hoje, acabamos<br />
sendo “seduzidos pela memória”, um apego ao p<strong>as</strong>sado face à<br />
conflitante realidade do presente.<br />
É cada vez mais intensa a necessidade de retorno, de volta e<br />
culto ao p<strong>as</strong>sado, e isso pode significar o desejo de uma ancoragem,<br />
um refúgio seguro, face às inquietantes contingênci<strong>as</strong> do<br />
atual momento. A propósito, vale salientar que sobre a questão<br />
do tempo, enquanto enfocado no âmbito de sua concepção tradicional,<br />
isso é, enquanto p<strong>as</strong>sado, presente e futuro (tempo<br />
dimensional, cronométrico, Cronos), emerge, em contraponto,<br />
um novo e importante entendimento do tempo, ou seja, o tempo<br />
de aion, ou seja, o tempo não dimensional, não mensurável do<br />
instante e da eternidade, sem princípio e sem fim.<br />
No contexto filosófico da Modernidade, surge um novo atributo<br />
do tempo: o conceito de duração, criado por Bergson 3 e que<br />
dele emana o seguinte <strong>para</strong>doxo: “O p<strong>as</strong>sado coexiste com o<br />
presente que p<strong>as</strong>sa”. Essa sedimentação, ou seja, essa acumulação<br />
da experiência p<strong>as</strong>sada coexiste com o presente que p<strong>as</strong>sa, pois<br />
2<br />
huyssen, Andrea.<br />
Seduzidos pela<br />
memória. Rio de<br />
Janeiro: Aeroplano,<br />
2000.<br />
3<br />
Conceito de duração de<br />
Henri Bergson, referido<br />
por Gilles Deleuze em<br />
seu livro O bergsonismo.<br />
diferença versus identidade nos processos culturais 71