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1<br />
Jornal A TARDE.<br />
Salvador, 22 out. 2005.<br />
Existem muitos diagnósticos de Salvador que se mostram<br />
atentos a esta questão, eu vou tomar, como exemplo aqui, um que<br />
não é tão recente (m<strong>as</strong> não é também tão antigo, data de 2005)<br />
porque ele é curto, direto e emblemático. Quando o cientista<br />
senegalês Doudou Diène esteve aqui, por conta de uma visita da<br />
Organização d<strong>as</strong> Nações Unid<strong>as</strong>, estudando a discriminação racial,<br />
ele disse que o que acontecia em Salvador podia, sem muita<br />
ressalva, ser referido como uma “limpeza étnica”. São palavr<strong>as</strong> de<br />
Doudou Diène, que p<strong>as</strong>so a citar: “O racismo econômico-social<br />
se traduz por violência do aparelho do Estado, da polícia, dos<br />
serviços da ordem, do perfilhamento racial e da marginalização,<br />
também há pesso<strong>as</strong> sendo <strong>as</strong>s<strong>as</strong>sinad<strong>as</strong>, m<strong>as</strong> o <strong>as</strong>s<strong>as</strong>sinato de<br />
jovens como vemos aqui em Salvador é muito preocupante”. 1<br />
A minha intervenção neste ciclo de debates quer b<strong>as</strong>icamente<br />
firmar que o breve quadro ou a síntese que acabo de apresentar,<br />
do que vejo como peculiar a Salvador, exige de nós, urgentemente,<br />
a ampliação e a problematização da nossa noção de cultura.<br />
Não podemos continuar entendendo cultura como o domínio<br />
dos bens simbólicos ou d<strong>as</strong> linguagens, ou do patrimônio material<br />
e imaterial. Para a formulação de qualquer política cultural<br />
destinada a Salvador, temos que entender que a violência, o racismo<br />
e a discriminação fazem parte da cultura da cidade.<br />
Uma política cultural <strong>para</strong> a cidade certamente deve, como,<br />
aliás, vem-se tentando fazer desde o início de 2007, “democratizar<br />
o acesso à cultura”, seja dos receptores seja da condição de<br />
criadores de cultura. M<strong>as</strong>, no meu entender, a política cultural<br />
também deveria se dar conta da necessidade inadiável de um<br />
trabalho, de um planejamento de ações e de met<strong>as</strong> que possam<br />
afetar o <strong>para</strong>doxo a que me referi, pois ele está praticamente<br />
sedimentado e pacificado em Salvador, todos nós o sabemos.<br />
Pode parecer um tanto de mau gosto ou mais ou menos impertinente,<br />
falar nesta direção, num ciclo de discussões sobre<br />
Política Cultural, pois usualmente não pensamos muito nesta<br />
170 eneida leal cunha