Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
76 valdina pinto<br />
Essa identidade negra. Bom, pelo menos quando se vende a<br />
imagem de Salvador, a cultura é negra, não tem outra. Salvador<br />
desenvolveu-se sem atentar <strong>para</strong> como nós, sujeitos negros, vemos<br />
a natureza, encaramos o meio ambiente e nos sentimos<br />
nesse ambiente: não tem nada a ver com o que os nossos antep<strong>as</strong>sados<br />
nos legaram e com nosso jeito de pensar e de viver num<br />
meio ambiente que contempla a natureza, com os seres humanos<br />
interagindo e se inter-relacionando bem, dentro desse ambiente;<br />
nada tem a ver. E, mais recente, a gente vê um tal de pddu,<br />
que fez o que fez; lembrando um pouco do que Eugênio Lins<br />
falou sobre a geografia, realmente, ninguém respeitou morro,<br />
nem val<strong>as</strong>, nem riachos, nem o que se tinha. Eu, por exemplo,<br />
fui privilegiada. Minha geração ainda alcançou mat<strong>as</strong>, fontes<br />
de água pura, um ambiente em que podíamos viver bem, em<br />
comunidades, em bairros, como o que eu vivo, Engenho Velho,<br />
e a urbanização, o progresso chegou sem que se pens<strong>as</strong>se em<br />
manter um pouco do que antes tínhamos...<br />
Salvador desenvolveu-se sem que os responsáveis pela urbanização<br />
pens<strong>as</strong>sem nesse povo, como ele se relacionava com o<br />
ambiente onde estava, como era, como agia e a coisa foi esbarrar<br />
no que está hoje. Então, aqui está um apelo <strong>para</strong> <strong>as</strong> vári<strong>as</strong> outr<strong>as</strong><br />
cidades por esse Estado de Bahia afora, que ainda não conhecem<br />
esse desenvolvimento como Salvador, cuidado! Vê como é que<br />
o povo se relaciona com a natureza daquele lugar, com o morro,<br />
com a mata, com a fonte, com o rio. Se for construir uma rua,<br />
se precisa fazer urbanização, não precisa desmatar tudo <strong>para</strong><br />
depois plantar algo diferente do que ali estava. Quem vai fazer<br />
paisagismo, tem que pensar de modo diferente, gente, senão<br />
vai ficar como a Paralela, não é? No meio, algo plantado, outra<br />
rua ali. Por que tirou o que estava ali <strong>para</strong> botar outra coisa no<br />
lugar? E aí eu penso, cada vez que eu p<strong>as</strong>so pela Paralela e vejo<br />
aquele monte de plant<strong>as</strong> da mesma espécie uma atrás da outra,<br />
e eu digo: “Onde estão os muricis, onde estão <strong>as</strong> murt<strong>as</strong>, onde