percebia na penumbra produzida pelo quebra -luz da minha lâmpada. A primeira idéia que me veiofoi a de que, sem dúvida, eu a<strong>do</strong>rmec<strong>era</strong> e que experime ntava a sensação de um sonho. Contu<strong>do</strong>,reconhecia que nunca tiv<strong>era</strong> sonho semelhante e que me parecesse tão intensivamente umarealidade. Direi mais: tinha a impressão de que jamais estiv<strong>era</strong> tanto na realidade. Por isso, aoverificar que não podia tratar-se de um sonho, o segun<strong>do</strong> pensamento que se me apresentou desúbito à imaginação foi a de que morr<strong>era</strong>. Ao mesmo tempo, lembrei -me de ter ouvi<strong>do</strong> dizer que háEspíritos e acudiu-me a idéia de que me tornara Espírito. Tu<strong>do</strong> o que eu pud<strong>era</strong> aprender a esserespeito longamente se desenrolou, diante da minha visão interior, mas em menos tempo <strong>do</strong> que épreciso para pensá-lo. Lembro-me muito bem de haver si<strong>do</strong> toma<strong>do</strong> de uma como angústia e depesar pela falta de acabamento de algumas coisas. Minha vida se me apresentou como uma fórmula.Aproximei-me de mim, ou, antes, <strong>do</strong> meu corpo, ou daquilo que eu supunha fosse o meucadáver. Chamou-me de pronto a atenção um espetáculo que não compreendi: vi -me a respirar e,ainda mais, vi o interior <strong>do</strong> meu peito e o meu coração a pul sar lento, com pancadas fracas, mascom regularidade. Nesse momento, compreendi que dev<strong>era</strong> ter ti<strong>do</strong> uma sincope de gênero especial,a menos que os que têm sincopes, pensei de mim para mim, não se recordem, durante o desmaio, <strong>do</strong>que lhes sucedeu. Temi, então, não mais me lembrar de nada, quan<strong>do</strong> recobrasse os senti<strong>do</strong>s...Um pouco tranqüiliza<strong>do</strong>, lancei o olhar ao meu derre<strong>do</strong>r, procuran<strong>do</strong> saber quanto tempo iaaquilo durar. Depois, não mais me ocupei com o meu corpo, com o outro eu que continuava emrepouso. Atentei no lampião, que se mantinha aceso silenciosamente e fiz a reflexão de que, estan<strong>do</strong>muito perto da cama, poderia incendiar os meus cortina<strong>do</strong>s. Peguei a cabeça <strong>do</strong> parafuso da mecha,para apagá-la; porém, nova surpresa me esp<strong>era</strong>va! Eu sentia perfeitamen te o disco <strong>do</strong> parafuso,percebia-lhe, por assim dizer, todas as moléculas, mas, de nada servia torcê -lo com os de<strong>do</strong>s:somente estes executavam o movimento. Em vão me esforçava por atuar sobre o disco.Examinei-me então e vi que, conquanto minha mão pudesse passar através de mim mesmo,eu sentia bem o meu corpo, que me pareceu, se não me falha a memória, vesti<strong>do</strong> de branco.Coloquei-me em seguida diante <strong>do</strong> espelho defronte <strong>do</strong> fogão. Em vez de distinguir no vidro aminha imagem, verifiquei que meu olhar se dis tendia à minha vontade, de tal sorte que se metornaram visíveis, primeiro, a parede, depois, a parte posterior <strong>do</strong>s quadros e <strong>do</strong>s móveis existentesno aposento <strong>do</strong> meu vizinho e, por fim, o interior desse apartamento to<strong>do</strong>. Percebi que não havia luznaquelas peças onde, entretanto, a minha visão distinguia tu<strong>do</strong>. Dei, então, com um raio luminosoque, partin<strong>do</strong> <strong>do</strong> meu epigástrio, clareava os objetos.Veio-me a idéia de penetrar na casa <strong>do</strong> vizinho, a quem eu, aliás, não conhecia e que nomomento se achava ausente de Paris. Mal se formou em mim o desejo de visitar a primeira sala,achei-me nela. Como? Não sei, mas, parece -me que atravessei a parede com tanta facilidade quantativ<strong>era</strong> o meu olhar para transpô-la. Em suma, pela primeira vez na minha vida, achei -me na casa <strong>do</strong>meu vizinho. Inspecionei os quartos, gravei na memória o aspecto que apresentavam e meencaminhei para uma biblioteca, onde notei muito particularmente os títulos de diversas obrasalinhadas numa das prateleiras à altura <strong>do</strong>s meus olhos.Para mudar de lugar, não me <strong>era</strong> preciso mais <strong>do</strong> que querer ia imediatamente onde desejarair.A partir desse momento, muito confusas são as minhas lembranças. Sei que fui longe, muitolonge, à Itália, creio, mas não me seria possível dizer como empreguei o meu tempo. Foi como se,não ten<strong>do</strong> mais o <strong>do</strong>mínio de mim mesmo, não sen<strong>do</strong> mais senhor <strong>do</strong>s meus pensamentos, andasseleva<strong>do</strong> para aqui e para ali, para onde estes se dirigiam. Ainda não os ten<strong>do</strong> submeti<strong>do</strong> à minhavontade, eles como que me dispersavam, antes que eu houv esse podi<strong>do</strong> prendê-los. A imaginação,naqueles instantes, carregava consigo, para onde entendia, a sua sede.Por concluir, o que posso acrescentar é que despertei às cinco horas da madrugada, rígi<strong>do</strong>,frio, no meu sofá, e conservan<strong>do</strong> ainda entre os de<strong>do</strong>s o charuto não consumi<strong>do</strong>. O lampião seapagara, depois de enfumaçar a manga de vidro. Atirei -me na cama e aí fiquei sem poder <strong>do</strong>rmir ecom um frêmito por to<strong>do</strong> o corpo. Afinal, peguei no sono. Era dia alto, quan<strong>do</strong> acordei.Por meio de inocente estratagema, ind uzi o encarrega<strong>do</strong> da habitação a ir verificar se noapartamento <strong>do</strong> meu vizinho não haveria alguma coisa de anormal e, subin<strong>do</strong> com ele, dei com os48
quadros, os móveis que vira na noite precedente, assim como os livros de cujos títulos guardavalembrança.Tive o cuida<strong>do</strong> de não falar de tu<strong>do</strong> isto a quem quer que fosse, temen<strong>do</strong> passar por louco oualucina<strong>do</strong>.E eminentemente instrutivo este relato. Prova, primeiramente, que essa exteriorização daalma não resultou de uma alucinação, nem foi apenas um sonho, porqu anto é inteiramente real avisão <strong>do</strong> apartamento vizinho, que o grava<strong>do</strong>r não conhecia e no qual penetrara pela primeira vezenquanto estiv<strong>era</strong> naquele esta<strong>do</strong> particular. Em segun<strong>do</strong> lugar, faculta -nos comprovar que a alma,quan<strong>do</strong> desprendida <strong>do</strong> corpo, possui uma forma definida e tem o poder de passar através <strong>do</strong>sobstáculos materiais, sem experimentar resistência, bastan<strong>do</strong> a sua vontade para transportá -la aositio onde deseje achar-se. Em terceiro, demonstra que a alma, assim desprendida, tem uma vistamais penetrante <strong>do</strong> que no esta<strong>do</strong> normal, pois que o moço via o seu próprio coração a bater, dentro<strong>do</strong> peito. (92)A conservação da lembrança <strong>do</strong>s acontecimentos ocorri<strong>do</strong>s durante o des<strong>do</strong>bramento é,neste caso, muito nítida; mas, pode, noutros, ser menos viva, de so rte que o agente, ao despertar,fique sem saber se sonhou, ou se, com efeito, sua alma aban<strong>do</strong>nou temporariamente o envoltóriofísico. Enfim, as mais das vezes, o Espírito, voltan<strong>do</strong> ao corpo, esquece o que ocorreu no curso <strong>do</strong>desprendimento. Devemos precata r-nos de concluir – como amiúde o fazem – que essas saídas sãouma manifestação inconsciente da alma. A verdade é que apenas desaparece a memória <strong>do</strong>fenômeno, <strong>do</strong> qual, porém, a alma tinha conhecimento perfeito, enquanto ele se produzia.Façamos uma última observação acerca da impossibilidade, em que se encontrou o moçograva<strong>do</strong>r, para mover o disco <strong>do</strong> parafuso <strong>do</strong> seu lampião, a fim de abaixar a mecha e apagá -la,embora ele lhe percebesse a estrutura íntima. Essa impossibilidade, peculiar a to<strong>do</strong>s os Espíritos noespaço, decorre da rarefação <strong>do</strong> perispírito. Entretanto, pode dar -se também que, graças a um afluxode energia tomada ao corpo material, o envoltório fluídico adquira o poder de objetivação em grausuficiente para atuar sobre objetos materiais. A apari ção da mãe de Helena (página 91) evidenciavaessa substancialidade.Até aqui, as aparições, qualificadas de telepáticas, de que acabamos de falar, nada revelaramsobre a natureza íntima que lhes é própria. Não fossem os movimentos que executam, o abrirem efecharem portas, como parece que o fazem, e elas poderiam ser tomadas por projeções <strong>do</strong>pensamento, por imagens, por simples aparências. Eis, porém, muitos casos em que a tangibilidadeainda mais se positiva.Aparição tangível de um estudanteDiz o reveren<strong>do</strong> P. H. Newnham, Vicariato de Devonport: (93)No mês de março de 1856, estava eu em Oxford, fazen<strong>do</strong> o último ano <strong>do</strong> meu curso, eocupava um quarto mobila<strong>do</strong>. Era sujeito a violentas <strong>do</strong>res de cabeça nevrálgicas, sobretu<strong>do</strong>enquanto <strong>do</strong>rmia. Uma noite, por v olta das nove horas, a <strong>do</strong>r se tornou insuportável; atirei -me nacama sem me despir e logo peguei no sonoTive então um sonho de nitidez e intensidade notáveis. Guar<strong>do</strong> ainda na memória, tão vivoscomo quan<strong>do</strong> o estava ten<strong>do</strong>, to<strong>do</strong>s os pormenores desse sonho. Sonhei que me achava em casa dafamília daquela que mais tarde se tornou minha mulher. To<strong>do</strong>s os rapazes e raparigas tinham i<strong>do</strong>deitar-se e eu ficara a conversar, de pé, junto ao fogão; depois, dei boa -noite aos que comigoconversavam, tomei da minha vela e fui também me deitar. Chegan<strong>do</strong> ao vestíbulo, verifiquei queminha noiva ainda estava subin<strong>do</strong> para o andar superior e que no momento chegava ao topo daescada. Subi quatro a quatro a escada e, alcançan<strong>do</strong> -a no último degrau, passei-lhe o braço pelacintura. Ao subir a escada, levava eu na mão esquerda o meu castiçal, o que, entretanto, no sonho,não me atrapalhava. Despertei então e quase de seguida um relógio da casa deu dez horas.Foi tão forte a impressão em mim produzida por esse sonho, que no dia seguin te, pelamanhã, escrevi à minha noiva, fazen<strong>do</strong> dele minuciosa narração. Recebi dela uma carta, porém nãoem resposta à minha, pois que as duas se cruzaram no caminho. Dizia assim: Dar -se-á que você hajapensa<strong>do</strong> em mim, de mo<strong>do</strong> particular, ontem à noite, ce rca das dez horas? Quan<strong>do</strong> subia a escada49
- Page 1 and 2: GABRIEL DELANNEA ALMA E IMORTAL
- Page 4: CAPITULO III - O MUNDO ESPIRITUAL E
- Page 7 and 8: da distinção existente entre a al
- Page 10 and 11: o como dessa imortalidade. Qual, no
- Page 12 and 13: De certas passagens do Avestá se h
- Page 14 and 15: O mestre das sentenças, Pedro Lomb
- Page 16 and 17: assunto. E de admirar-se a lógica
- Page 18 and 19: Não ignoramos que a crítica conte
- Page 20 and 21: Alucinação auditiva, dirá o dout
- Page 22 and 23: As narrações de ChardelVamos agor
- Page 24 and 25: visões. Para provar o que avançav
- Page 26 and 27: O padre Almignana, já citado, pare
- Page 28 and 29: CAPITULO III - TESTEMUNHOS DOS MÉD
- Page 30 and 31: pouco, se foram reunindo os ensinam
- Page 32 and 33: R: — E. Ele se encontra ao lado d
- Page 34 and 35: Sentaram-se à mesa da tiptologia d
- Page 36 and 37: R: - Posso.Após um instante de exp
- Page 38 and 39: com efeito, a sua figura cheia de n
- Page 40 and 41: perdida. Suicidou-se então nas cer
- Page 42 and 43: 3 - As impressões que os fantasmas
- Page 44 and 45: saía de flanela da mãe de Helena,
- Page 46 and 47: A Sr Varley estava noutro quarto po
- Page 50 and 51: para me ir deitar, ouvi distintamen
- Page 52 and 53: Disse em resposta: Quase me afoguei
- Page 54 and 55: em leitos diferentes. Estando sua a
- Page 56 and 57: Espera! há uma carta nessa fumaça
- Page 58 and 59: Fazemos a respeito algumas observa
- Page 60 and 61: Se o fenômeno se houvera produzido
- Page 62 and 63: dizer coisa alguma, pois já sei qu
- Page 64 and 65: um morto, ou a realidade de um fen
- Page 66 and 67: Eu nunca tivera nenhuma alucinaçã
- Page 68 and 69: O caso do Sr. SteadO Borderland, de
- Page 70 and 71: que - embora fluídico - tinha para
- Page 72 and 73: comunicação dos Espíritos dos vi
- Page 74 and 75: um poderoso eletroímã - com o aux
- Page 76 and 77: provavelmente de seus corpos materi
- Page 78 and 79: Dassier cita muitos casos semelhant
- Page 80 and 81: A 14 de março de 1874, convidado,
- Page 82 and 83: O Sr. Bonner ainda obteve a fotogra
- Page 84 and 85: uma mão pequenina, da mesma indivi
- Page 86 and 87: O Sr. Harrison atendeu a 25 de abri
- Page 88 and 89: grande braço de homem, nu até a e
- Page 90 and 91: Uma das mais interessantes fotograf
- Page 92 and 93: às comunicações, em número de u
- Page 94 and 95: também a configuração física, q
- Page 96 and 97: Até mais amplos esclarecimentos, c
- Page 98 and 99:
Tem-se dito que o Espírito é uma
- Page 100 and 101:
eternamente pelo espaço em pensame
- Page 102 and 103:
A unidade da matériaA primeira vis
- Page 104 and 105:
As famílias químicasProcedendo à
- Page 106 and 107:
As forçasCitemos de novo o nosso i
- Page 108 and 109:
Sendo tudo relativo, esses fluidos
- Page 110 and 111:
infinitamente pequeno; a chapa foto
- Page 112 and 113:
Com efeito, segundo cálculos de pr
- Page 114 and 115:
Incontestavelmente, reina continuid
- Page 116 and 117:
Como a esfera dágua de igual raio
- Page 118 and 119:
examinado e freqüentemente despido
- Page 120 and 121:
Se as materializações não passam
- Page 122 and 123:
Logo duas figuras de mulher, que co
- Page 124 and 125:
Quando o duplo inteiro de Eglinton
- Page 126 and 127:
Outra observação também muito im
- Page 128 and 129:
caracteres pareciam verdadeiramente
- Page 130 and 131:
não é mais do que o resíduo do E
- Page 132 and 133:
fantasma se apresentou, oscilando o
- Page 134 and 135:
contingências da matéria, acha-se
- Page 136 and 137:
O farmacêutico de Charmes aplica n
- Page 138 and 139:
A ação da vontade sobre os fluido
- Page 140 and 141:
Exemplo: Se por sugestão se faz ap
- Page 142 and 143:
Em seu livro: O magnetismo animal,
- Page 144 and 145:
diante desses dois mil casos perfei
- Page 146 and 147:
(7) Xaspéro - Arqueologia Egípcia
- Page 148 and 149:
Entretanto, vendo que o Dr. Moroni
- Page 150 and 151:
(135) Veja-se a Revista Científica
- Page 152 and 153:
21 séculos de irradiação, vê-se