Tradução de Ana Faria e Isabel Andrade - Saída de Emergência
Tradução de Ana Faria e Isabel Andrade - Saída de Emergência
Tradução de Ana Faria e Isabel Andrade - Saída de Emergência
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
corvos fi xos ao poste com pregos, e Nimue cheirou os corpos rígidos tentando<br />
<strong>de</strong>cidir que tipo <strong>de</strong> magia fora impregnada nas suas mortes.<br />
— Mija! Mija! — Merlim conseguiu dizer, <strong>de</strong>itado na sua liteira. —<br />
Depressa, rapariga! Mija! — Tossiu horrivelmente e <strong>de</strong>pois virou a cabeça<br />
para cuspir a expetoração para a vala.<br />
— Não vou morrer! — disse para si mesmo. — Não vou morrer! —<br />
Tornou a <strong>de</strong>itar-se enquanto Nimue se agachava junto ao poste.<br />
— Ele sabe que estamos aqui — advertiu-me Merlim.<br />
— Ele está aqui? — perguntei, baixando-me até junto <strong>de</strong>le.<br />
— Alguém está. Tem cuidado, Derfel. — Fechou os olhos e suspirou.<br />
— Estou tão velho — disse em voz baixa, — terrivelmente velho. — Existe<br />
uma maldição aqui, sobre nós. — Abanou a cabeça. — Leva-me para a<br />
ilha, nada mais. Chega à ilha, é tudo o que te peço. O Cal<strong>de</strong>irão curará<br />
tudo.<br />
Nimue terminou, <strong>de</strong>pois esperou para ver a direção que tomavam os<br />
vapores da sua urina, que o vento empurrou para a direita da bifurcação. E<br />
foi esse presságio que <strong>de</strong>cidiu o nosso caminho. Antes <strong>de</strong> partirmos, Nimue<br />
dirigiu-se até um dos póneis e procurou um saco <strong>de</strong> couro <strong>de</strong> on<strong>de</strong> tirou<br />
um punhado <strong>de</strong> pontas <strong>de</strong> seta em sílex e pedras-d’água que distribuiu pelos<br />
soldados.<br />
— Proteção — explicou enquanto <strong>de</strong>punha uma amotite na padiola<br />
<strong>de</strong> Merlim. — Em frente — or<strong>de</strong>nou ela.<br />
Caminhámos toda a manhã, retardando a marcha para transportar<br />
Merlim. Não vimos ninguém e essa ausência <strong>de</strong> vida fez nascer um medo<br />
terrível entre os meus homens, pois parecia que tínhamos penetrado numa<br />
terra <strong>de</strong> mortos. As sebes estavam cobertas <strong>de</strong> sorvas e bagas <strong>de</strong> azevinho,<br />
os ramos das árvores serviam <strong>de</strong> poiso a tordos e piscos, mas não havia<br />
gado, nem carneiros, nem homens. Vimos uma povoação <strong>de</strong> on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>sprendia<br />
uma coluna <strong>de</strong> fumo que se elevava nos ares, impelida pelo vento,<br />
mas estava muito distante <strong>de</strong> nós e ninguém parecia estar a observar-nos<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a muralha circular.<br />
No entanto, havia homens naquela terra <strong>de</strong>solada. Comprovámo-lo<br />
quando parámos para <strong>de</strong>scansar num pequeno vale, on<strong>de</strong> um ribeiro corria,<br />
indolente, entre as suas margens geladas, abrigado por um bosque <strong>de</strong><br />
pequenos carvalhos escuros e vergados pelo vento. Cada um dos intrincados<br />
ramos estava <strong>de</strong>licadamente ornamentado por uma camada <strong>de</strong> geada<br />
branca. Descansámos sob eles até Gwilym, um dos soldados que guardava<br />
a nossa retaguarda, me ter chamado.<br />
Fui até à orla <strong>de</strong> carvalhos e vi que uma fogueira tinha sido ateada em<br />
baixo, na encosta montanhosa. Não havia vestígios <strong>de</strong> chamas, apenas um<br />
véu espesso <strong>de</strong> fumo cinzento que se agitava furiosamente antes <strong>de</strong> ser var-<br />
110