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Tradução de Ana Faria e Isabel Andrade - Saída de Emergência

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muito mais do que apenas encorajar a campanha <strong>de</strong> Merlim contra o Deus<br />

cristão, também faria <strong>de</strong> Guinevere minha inimiga. Fechei os olhos. Po<strong>de</strong>ria<br />

a esposa do meu senhor ser minha inimiga? E se o fosse? Artur continuaria<br />

a amar-me, eu a ele, e as minhas lanças e escudos estrelados tinham<br />

mais valor para ele do que toda a fama <strong>de</strong> Lancelote.<br />

Levantei-me e recuperei o pregador, o osso e a espada. Issa viu-me<br />

tirar um fi o <strong>de</strong> lã ver<strong>de</strong> da minha capa, que <strong>de</strong>pus entre as pedras.<br />

— Não estavas em Caer Sws — perguntei-lhe — quando Artur rompeu<br />

o noivado com Ceinwyn?<br />

— Não, senhor. Mas ouvi falar nisso.<br />

— Foi durante a festa <strong>de</strong> noivado — disse eu, — uma festa exatamente<br />

igual àquela a que assistiremos esta noite. Artur estava sentado na mesa<br />

principal com Ceinwyn a seu lado quando viu Guinevere no fundo do salão.<br />

Ela vestia uma capa velha e gasta e tinha os galgos a seu lado. Artur viu-a<br />

ali e as coisas nunca mais foram as mesmas. Só os Deuses sabem quantos<br />

homens morreram por ele ter visto aquela cabeleira ruiva. — Virei-me para<br />

o muro <strong>de</strong> pedra baixo e reparei que havia um ninho abandonado no interior<br />

<strong>de</strong> um dos crânios forrados <strong>de</strong> musgo. — Merlim diz que os Deuses<br />

amam o caos — disse eu.<br />

— Merlim ama o caos — disse Issa num tom <strong>de</strong>spreocupado, embora<br />

as suas palavras contivessem mais verda<strong>de</strong> do que ele supunha.<br />

— Merlim ama-o, sim — concor<strong>de</strong>i, — mas a maioria <strong>de</strong> nós teme o<br />

caos e é por isso que tentamos impor a or<strong>de</strong>m. — Pensei na pilha <strong>de</strong> ossos<br />

cuidadosamente or<strong>de</strong>nada. — Mas quando se tem or<strong>de</strong>m, não se precisa<br />

dos Deuses. Quando tudo está bem or<strong>de</strong>nado e disciplinado, não há espaço<br />

para o inesperado. Quando compreen<strong>de</strong>mos tudo — disse, cuidadoso,<br />

— <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> haver espaço para a magia. E é só no momento em que nos<br />

sentimos perdidos e assustados e mergulhados no escuro que invocamos<br />

os Deuses, e eles gostam que nós os invoquemos. Fá-los sentir po<strong>de</strong>rosos,<br />

e é por isso que eles gostam que vivamos no caos. — Limitava-me a repetir<br />

as lições que apren<strong>de</strong>ra na infância, as lições que nos eram dadas no Tor <strong>de</strong><br />

Merlim. — E agora temos oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolher — disse eu a Issa. —<br />

Po<strong>de</strong>mos viver na Bretanha bem or<strong>de</strong>nada <strong>de</strong> Artur ou po<strong>de</strong>mos seguir<br />

Merlim rumo ao caos.<br />

— Eu seguir-vos-ei, senhor, em quaisquer circunstâncias — disse Issa.<br />

Não creio que ele tenha compreendido o que eu tinha estado a dizer, mas<br />

estava contente por confi ar em mim <strong>de</strong> qualquer maneira.<br />

— Quem <strong>de</strong>ra saber o que fazer — confessei.<br />

Quão fácil seria, pensei, se os Deuses andassem pela Bretanha como<br />

antes. Nesses tempos podíamos vê-los, ouvi-los, falar-lhes. Agora, somos como<br />

homens <strong>de</strong> olhos vendados procurando uma agulha num palheiro.<br />

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