Tradução de Ana Faria e Isabel Andrade - Saída de Emergência
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ambulavam entre os convivas. — Lancelote <strong>de</strong>pressa se cansará da Silúria!<br />
Não estou a ver o nosso galante Lancelote capaz <strong>de</strong> suportar aqueles preguiçosos<br />
feios e enegrecidos pelo carvão durante muito tempo. Assim sendo,<br />
se sobreviver ao parto, o que eu duvido, a pobre Ceinwyn será abandonada<br />
tendo apenas um monte <strong>de</strong> carvão e um bebé chorão por companhia. Isso<br />
será o fi m <strong>de</strong>la! — A perspetiva parecia agradar-lhe. — Já reparaste, Derfel,<br />
em como encontramos uma jovem no auge da sua beleza, com um rosto<br />
capaz <strong>de</strong> fazer <strong>de</strong>saparecer as próprias estrelas dos céus, e um ano mais tar<strong>de</strong><br />
surpreendêmo-la a tresandar a leite e a excremento <strong>de</strong> bebé e perguntamos<br />
a nós próprios como pu<strong>de</strong>mos tê-la consi<strong>de</strong>rado bela? Os bebés fazem<br />
isso às mulheres. Por isso olha para ela agora, Derfel, olha para ela agora,<br />
pois ela nunca mais voltará a ser tão encantadora.<br />
Estava encantadora, e pior do que isso, parecia feliz. Usava um vestido<br />
branco nessa noite e em torno do pescoço trazia uma estrela prateada enfi<br />
ada numa corrente <strong>de</strong> prata. Os cabelos dourados estavam presos por um<br />
laço prateado e eram igualmente <strong>de</strong> prata as gotas <strong>de</strong> chuva que pendiam<br />
das suas orelhas. E Lancelote estava tão atraente quanto Ceinwyn, nessa<br />
noite. Era consi<strong>de</strong>rado o homem mais belo da Bretanha e assim era, caso se<br />
gostasse do seu rosto moreno, comprido e magro, quase reptiliano. Estava<br />
vestido com um casaco preto às riscas brancas, usava um colar dourado <strong>de</strong><br />
metal torcido e um aro em ouro prendia os seus longos cabelos negros e<br />
oleados, que acompanhavam os contornos do couro cabeludo antes <strong>de</strong> cair<br />
em cascata ao longo das suas costas. A barba, aparada para formar um bico,<br />
estava também oleada.<br />
— Ela disse-me — disse eu a Merlim, consciente <strong>de</strong> que estava a expor<br />
em <strong>de</strong>masia os segredos do meu coração àquele velho perverso — que não<br />
está segura quanto a um casamento com Lancelote.<br />
— Bom, é natural que diga isso, não é? — respon<strong>de</strong>u Merlim <strong>de</strong>spreocupadamente,<br />
fazendo sinal a um escravo que levava um prato com carne<br />
<strong>de</strong> porco <strong>de</strong>stinado à mesa principal. Serviu-se <strong>de</strong> uma mão-cheia <strong>de</strong> costeletas,<br />
que colocou no regaço da sua imunda túnica branca, e começou a<br />
chupar cupidamente uma <strong>de</strong>las. — Ceinwyn — prosseguiu <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> já ter<br />
<strong>de</strong>scarnado a quase totalida<strong>de</strong> da costeleta — é uma tola romântica. Não<br />
sei como nem porquê, conseguiu convencer-se a si própria que podia casar<br />
com quem quisesse, ainda que só os Deuses saibam por que razão tal<br />
i<strong>de</strong>ia cruzaria o espírito <strong>de</strong> qualquer rapariga! Agora — disse com a boca<br />
cheia <strong>de</strong> carne <strong>de</strong> porco, — é claro que tudo muda. Ela conheceu Lancelote!<br />
A esta altura estará <strong>de</strong>slumbrada por ele. Talvez nem espere até ao dia do<br />
casamento. Quem sabe? Talvez, esta mesma noite, na privacida<strong>de</strong> dos seus<br />
aposentos, ela cubra o malandro. No entanto, é pouco provável que isso<br />
aconteça. É uma rapariga muito convencional. — As três últimas palavras<br />
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