A reconstrução da identidade em A jangada de pedra, de José ...
A reconstrução da identidade em A jangada de pedra, de José ...
A reconstrução da identidade em A jangada de pedra, de José ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
125<br />
[...] Maria Guavaira disse <strong>em</strong> voz alta e clara, Há um t<strong>em</strong>po para<br />
estar e um t<strong>em</strong>po para partir, ain<strong>da</strong> não chegou o t<strong>em</strong>po <strong>de</strong> voltar. 295<br />
Como se po<strong>de</strong> notar, o movimento <strong>da</strong>s personagens está associado ao<br />
t<strong>em</strong>po. Fala-se do t<strong>em</strong>po neste romance como o fator exigente <strong>de</strong> mu<strong>da</strong>nças no<br />
rumo <strong>da</strong> história, pessoal e coletiva. É o t<strong>em</strong>po que se encarrega tanto <strong>de</strong> tornar<br />
ultrapassa<strong>da</strong>s certas estruturas sociais quanto <strong>de</strong> <strong>de</strong>struí-las, para <strong>da</strong>r lugar à<br />
construção <strong>de</strong> novos valores. Se, como é dito na narrativa, o rompimento dos<br />
Pireneus não se explica por causas naturais, e, como conseqüência, o sobrenatural<br />
é apontado como o <strong>de</strong>stinador-manipulador <strong>da</strong>s transformações <strong>em</strong>preendi<strong>da</strong>s pela<br />
península, o “sujeito” que se encontra por trás <strong>de</strong> todos os acontecimentos, como<br />
<strong>de</strong>stinador manipulador inclusive dos fatos tidos como sobrenaturais, é o próprio<br />
t<strong>em</strong>po. Tal conclusão <strong>em</strong>erge mais claramente <strong>da</strong> passag<strong>em</strong> <strong>em</strong> que Joana Car<strong>da</strong>,<br />
já <strong>em</strong> companhia dos três homens, risca novamente o chão <strong>de</strong> Ereira com a vara <strong>de</strong><br />
negrilho, e o risco, <strong>de</strong>sta vez, é apagado com facili<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
[...] Disse <strong>José</strong> Anaiço, Não é <strong>da</strong> vara, não é <strong>da</strong> pessoa, foi do<br />
momento, o momento é que conta [...] Pedro Orce [...] Tomou <strong>da</strong>s mãos<br />
<strong>de</strong> Joana Car<strong>da</strong> a vara <strong>de</strong> negrilho e disse, Po<strong>de</strong> parti-la, atirá-la fora,<br />
queimá-la, já não serve para na<strong>da</strong>, a sua vara, a <strong>pedra</strong> <strong>de</strong> Joaquim Sassa,<br />
os estorninhos <strong>de</strong> <strong>José</strong> Anaiço, serviram uma vez, não servirão mais. 296<br />
Nota-se, portanto, que o encantamento não resi<strong>de</strong> nas pessoas, n<strong>em</strong> nos<br />
pássaros, n<strong>em</strong> nos objetos. O mágico é colocado sob o âmbito do t<strong>em</strong>po, até<br />
mesmo quando ele parece suspenso, como ocorre no instante <strong>em</strong> que a península<br />
pára <strong>de</strong> girar sobre si própria:<br />
294 Ibid<strong>em</strong>, p. 143.<br />
295 Ibid<strong>em</strong>, p. 234.<br />
296 Ibid<strong>em</strong>, p. 141.<br />
[...] Não era inverno, outono não era, primavera n<strong>em</strong> pensar, verão<br />
também não podia ser. Era uma estação suspensa, s<strong>em</strong> <strong>da</strong>ta, como se