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A reconstrução da identidade em A jangada de pedra, de José ...

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[...] O hom<strong>em</strong>, que era português, <strong>de</strong> nome Sousa, e viajava com a<br />

mulher e os sogros, voltou para o carro e disse, Até parece que já<br />

entrámos <strong>em</strong> Portugal, imagina, uma vala enorme, podia amolgar-me<br />

as jantes, partir um s<strong>em</strong>ieixo [...] A mulher, s<strong>em</strong> <strong>da</strong>r muita atenção à<br />

informação, respon<strong>de</strong>u, Vê lá tu. 85<br />

No trecho a seguir, é possível notar como, por meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>breagens internas,<br />

são instalados no enunciado três interlocutores. O que se observa, na utilização<br />

<strong>de</strong>ste mecanismo, é um efeito <strong>de</strong> sentido <strong>de</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, pois se t<strong>em</strong> a impressão <strong>de</strong><br />

que são as próprias personagens que tomam, ca<strong>da</strong> uma por seu turno, a palavra.<br />

[...] Pedro Orce faz um gesto que abrange a mísera al<strong>de</strong>ia [...] Não<br />

passa ninguém, não se ouve ladrar um cão, os estorninhos sumiram-se, um<br />

longo arrepio percorre as costas <strong>de</strong> Joaquim Sassa, que não consegue<br />

reprimir o mal-estar, e <strong>José</strong> Anaíço pergunta, Que nome t<strong>em</strong> aquela serra<br />

ao fundo, É a serra <strong>de</strong> Sagra [é Pedro Orce qu<strong>em</strong> respon<strong>de</strong>], E esta, à<br />

nossa direita, É a serra <strong>de</strong> Maria, Quando o hom<strong>em</strong> <strong>de</strong> Orce morreu, <strong>de</strong>ve<br />

ter sido ela a última imag<strong>em</strong> que os seus olhos levaram, Como lhe teria ele<br />

chamado quando falava com os outros homens <strong>de</strong> Orce, os que não<br />

<strong>de</strong>ixaram crânios, perguntou Joaquim Sassa, Nesse t<strong>em</strong>po ain<strong>da</strong> na<strong>da</strong><br />

tinha nome, disse <strong>José</strong> Anaíço, Como se po<strong>de</strong> olhar uma coisa s<strong>em</strong> lhe<br />

por nome, T<strong>em</strong> <strong>de</strong> se esperar que o nome nasça. Ficaram os três a olhar,<br />

s<strong>em</strong> outras palavras, enfim Pedro Orce disse, Vamos. 86<br />

A <strong>de</strong>breag<strong>em</strong> interna será <strong>de</strong> terceiro grau se o sujeito <strong>de</strong>breado <strong>em</strong> segundo<br />

grau fizer outra <strong>de</strong>breag<strong>em</strong> e <strong>de</strong>senvolver uma narrativa que irá instalar um segundo<br />

diálogo e assim por diante. No trecho abaixo, cinco interlocutores, já instalados no<br />

discurso por meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>breag<strong>em</strong> actancial enunciva <strong>de</strong> segundo grau, passam a<br />

dialogar <strong>em</strong> pensamento − por meio <strong>de</strong> discurso direto − com um sexto interlocutor<br />

(o cão), também pertencente ao enunciado. A partir <strong>de</strong> certo momento do diálogo,<br />

ca<strong>da</strong> interlocutor <strong>de</strong>senvolve uma narrativa que instala, ca<strong>da</strong> um por seu turno, um<br />

novo sujeito, cuja voz é relata<strong>da</strong> <strong>em</strong> terceiro grau por meio <strong>de</strong> discurso direto.<br />

85 A janga<strong>da</strong> <strong>de</strong> <strong>pedra</strong>, p. 25.<br />

86 Ibid<strong>em</strong>, pp.81-2.<br />

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