Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP
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CAPíTuLO IV<br />
IDENTIfICAçõES E SubjETIVAçõES<br />
CONTEMPORâNEAS<br />
Seguin<strong>do</strong> um percurso meto<strong>do</strong>lógico que busca observar as diversas instâncias<br />
<strong>do</strong>s enuncia<strong>do</strong>s proferi<strong>do</strong>s, passan<strong>do</strong> pelos mecanismos actoriais, pela tematização<br />
e a figurativização e pelos cruzamentos inter<strong>discursivo</strong>s, são investiga<strong>do</strong>s os processos<br />
de identificação e as formas de subjetividade que se configuram <strong>no</strong>s diários<br />
virtuais <strong>íntimos</strong>. Embora o caminho proposto parta <strong>do</strong> texto materializa<strong>do</strong> em direção<br />
às circunstâncias sociais <strong>do</strong> tema identidade, é importante ter como perspectiva<br />
teórica tanto a evolução <strong>do</strong>s conceitos envolvi<strong>do</strong>s ao longo da história <strong>do</strong> século<br />
XX quanto o pa<strong>no</strong>rama <strong>do</strong> <strong>contexto</strong> histórico, ideológico e social em que os diários<br />
virtuais <strong>íntimos</strong> emergem como fenôme<strong>no</strong> das mídias digitais.<br />
IV. 1 – A PERSPECtIVA DESCENtRADA DE IDENtIDADE<br />
Os movimentos de subjetivação e objetivação inspiram a inserção <strong>do</strong> sujeito em<br />
determinadas ordens discursivas pelas interpelações ideológicas, bem como deixam<br />
espaço para a constituição imaginária de um sujeito singular. Oscilações e tensões,<br />
por outro la<strong>do</strong>, assinalam um lugar virtual que só emerge com a entrada da subjetividade<br />
humana, ou seja, sua capacidade de, por <strong>meio</strong> de interações cognitivas e<br />
perceptivas com a tela <strong>do</strong> computa<strong>do</strong>r, projetar e introjetar sentimentos, palavras e<br />
desejos, num <strong>contexto</strong> social marca<strong>do</strong> pela crise da modernidade. Os diários virtuais<br />
<strong>íntimos</strong>, objetos-cifra dessa oscilação, exploram justamente a situação de crise<br />
da identidade na contemporaneidade.<br />
A presença constante <strong>do</strong> outro, explícita ou não, <strong>no</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong>,<br />
marca profundamente as características desse gênero. Uma constante tensão entre<br />
efeitos de centralidade e descentralidade pode ser observada. Em termos da<br />
constituição <strong>do</strong> eu, a Psicanálise, principalmente em Lacan, coloca a identidade<br />
como construída pela linguagem e através dela e o sujeito como uma multiplicidade<br />
de partes e fragmentos, uni<strong>do</strong>s por ligações privadas de desejo e para Turkle<br />
(1997:22): “Nos meus mun<strong>do</strong>s media<strong>do</strong>s pelo computa<strong>do</strong>r, o eu é múltiplo, flui<strong>do</strong><br />
e constituí<strong>do</strong> em interação com uma rede de máquinas; é forma<strong>do</strong> e transforma<strong>do</strong><br />
pela linguagem”.<br />
A essa perspectiva descentrada psicanalítica pode ser acoplada uma outra, discursiva.<br />
A análise de discurso de linha francesa, uma perspectiva da semântica da<br />
enunciação que postula a heterogeneidade constitutiva <strong>do</strong> sujeito (Authier-Revuz) e<br />
a concepção psicanalítica de um sujeito cindi<strong>do</strong> e descentra<strong>do</strong> contribuem para esse<br />
reposicionamento em relação à questão <strong>do</strong> sujeito e da identidade. Também com o<br />
auxílio das orientações de estu<strong>do</strong>s filosóficos de Foucault, a questão passa a ser tratada<br />
como uma questão filosófica que busca “compreender o sujeito como dispersão,<br />
sujeito cindi<strong>do</strong>, dividi<strong>do</strong>, atravessa<strong>do</strong> pelo inconsciente” (Coracini 2003: 15).