12.05.2013 Views

Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

ali <strong>do</strong> la<strong>do</strong> conversan<strong>do</strong> com ele, protegen<strong>do</strong> e acarician<strong>do</strong> até que ele desse o<br />

último suspiro. porque era assim que queríamos que ele partisse: sentin<strong>do</strong>-se<br />

seguro e ama<strong>do</strong>, sem <strong>do</strong>r.<br />

o groo viveu até os 8 a<strong>no</strong>s - um ancião. foram meses de cuida<strong>do</strong>s especiais, pois<br />

ele não comia e nem andava sozinho. não fazia mais xixi ou cocô <strong>no</strong>s lugares<br />

certos, sujava a casa toda, os paninhos, trocávamos tu<strong>do</strong> mais de uma vez por<br />

dia. ele tomava remédios 4 vezes ao dia, comia só quan<strong>do</strong> estimula<strong>do</strong> várias<br />

vezes ao dia e precisava de exames constantes de sangue. o fer passou muitas<br />

<strong>no</strong>ites em claro com ele, eu passei muitos fins de semana limpan<strong>do</strong> a casa e<br />

ajudan<strong>do</strong> com os remédios. até que chegou o dia em que ele já não podia mais<br />

ficar em casa, sua glicemia estava tão baixa que teria que ficar interna<strong>do</strong> até que<br />

seus órgãos parassem por completo.<br />

fosse ele um huma<strong>no</strong>, teria i<strong>do</strong> para a UTI e ficaria vivo às custas de aparelhos,<br />

até não se sabe quan<strong>do</strong>. sem comer, beber, andar, isola<strong>do</strong> <strong>do</strong>s amigos e de nós,<br />

cerca<strong>do</strong> por médicos e enfermeiros eficientes porém distantes.<br />

ele passou 2 dias interna<strong>do</strong>, <strong>no</strong> terceiro dia fomos <strong>no</strong>s despedir. pegamos<br />

<strong>no</strong> colo, fizemos muita festa, demos to<strong>do</strong> <strong>no</strong>sso amor e dissemos adeus.<br />

agradecemos a ele por to<strong>do</strong>s os a<strong>no</strong>s de alegria que <strong>no</strong>s proporcio<strong>no</strong>u. ele foi<br />

seda<strong>do</strong> e a injeção final foi aplicada. <strong>no</strong>ssa veterinária e amiga ficou ali co<strong>no</strong>sco,<br />

escutan<strong>do</strong> o coraçãozinho dele e fazen<strong>do</strong> carinho até que ele desse seu último<br />

suspiro.<br />

não foi triste, chocante e nem ruim. choramos, é claro, porque nunca é fácil<br />

dizer adeus. e o mun<strong>do</strong> fica fora de prumo quan<strong>do</strong> alguém que <strong>no</strong>s é caro(*) o<br />

aban<strong>do</strong>na. nós sabemos que a decisão que tomamos foi por ele e para ele, que<br />

estava cansa<strong>do</strong> e fraco, sem esperanças de qualquer melhora. não há um fiapo<br />

de arrependimento ou de dúvida em mim, tenho absoluta certeza que fizemos o<br />

que era melhor pra ele.<br />

quanto mais penso mais acho que manter vivo alguém que sofre sem esperança<br />

ou que não tem mais vontade própria é egoísmo. é difícil aceitar que alguém que<br />

amamos vai embora para sempre. preferimos manter alguém sofren<strong>do</strong> porém<br />

vivo a abrir mão da existência <strong>do</strong> outro.<br />

bom... o assunto é difícil e acho que não existe resposta certa ou errada, <strong>no</strong> fim<br />

das contas. sei o que sinto e acho hoje. e neste momento fico feliz por ter ti<strong>do</strong><br />

coragem de escolher a eutanásia para os <strong>no</strong>ssos peque<strong>no</strong>s. estou certa que eles<br />

são gratos, onde quer que estejam.<br />

(*) há quem ache que é bobagem amar animais, eu sei, mas deixo pra lá. aqui<br />

nesta casa não trabalhamos com amor categoriza<strong>do</strong>. amamos sem reservas,<br />

independente da espécie.<br />

Já <strong>no</strong> final <strong>do</strong> texto, a tematização volta a pre<strong>do</strong>minar, investin<strong>do</strong> semanticamente<br />

conceptualmente as figuras relatadas anteriormente. A explicação <strong>do</strong> mun<strong>do</strong><br />

por <strong>meio</strong> <strong>do</strong>s temas sugeri<strong>do</strong>s justificam a ordem social <strong>no</strong> diário virtual íntimo, ou<br />

seja, da defesa da eutanásia como uma alternativa ao sofrimento em vida, ordem<br />

exemplificada pelo termo gratidão.<br />

A figura da proprietária <strong>do</strong> animal de estimação é tematizada, <strong>no</strong> texto, pelo papel<br />

social <strong>do</strong> médico, responsável por favorecer ou não a prática da morte induzida por<br />

medicamentos. A figura <strong>do</strong> animal de estimação é tematizada como um paciente,<br />

alheio às decisões da instituição de saúde, explicitamente, o hospital. Tanto o animal<br />

de estimação quanto o seu <strong>do</strong><strong>no</strong> são substituí<strong>do</strong>s com a finalidade de inseri-los<br />

134 | BLOgS ÍNtIMOS: PERCuRSOS DE SENtIDO NO CONtEXtO DISCuRSIVO DO MEIO DIgItAL

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!