Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP
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sujeitos interpela<strong>do</strong>s pela ideologia. No entanto, a partir de uma singularização<br />
pelas formas subjetivas de actorialização, esses sujeitos buscam diferenciar-se <strong>do</strong>s<br />
outros, resistem às formas de sujeição e instalam-se imaginariamente como possui<strong>do</strong>res<br />
de seus discursos. Essa é uma subjetividade organizada num horizonte<br />
estético e estilístico, marcada pela intersecção entre o eu e o tu, presentes <strong>no</strong><br />
discurso.<br />
Enuncia<strong>do</strong>r e enunciatário estão inscritos <strong>no</strong> texto, e se permitem serem descortina<strong>do</strong>s<br />
pela exploração de um recurso inter<strong>discursivo</strong> metafórico presente <strong>no</strong> final<br />
<strong>do</strong> texto, momento em que o enuncia<strong>do</strong>r relata a finalidade de sua jornada diária:<br />
descobrir o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> pote de ouro. Não surpreende, assim, que dentro <strong>do</strong> tal<br />
pote de ouro que se esconde por trás desse arco-íris exista um espelho, instrumento<br />
que permite construir uma imagem de si, bem como <strong>do</strong> outro, por <strong>meio</strong> de um<br />
simulacro. Em um pla<strong>no</strong> mais profun<strong>do</strong>, o enuncia<strong>do</strong>r metaforiza a presença <strong>do</strong><br />
enunciatário, o autor explicita o desejo de ver e ser visto na rede.<br />
A intersecção eu-tu fica ainda mais clara quan<strong>do</strong> ilustrada pelo próprio enuncia<strong>do</strong>r:<br />
_ just sit and stare and sigh<br />
hoje eu contei. até as 18h00 foram 185 as vezes em que eu falei a palavra EU (e<br />
só até agora, neste post, foram mais 3). não sei de onde tirei essa conta maluca.<br />
estava conversan<strong>do</strong> com minha mãe hoje de manhã quan<strong>do</strong> de repente me<br />
incomodei com o fato de dizer tanto eu, eu, eu, que coisa mais chata tanto EU<br />
assim <strong>no</strong> mun<strong>do</strong>. daí comecei a contar. e até agora há pouco foram 185 eus. nem<br />
eu, que sou eu, sou eu tanto assim. me incomo<strong>do</strong>u. uma coisa assim, <strong>meio</strong> autoreferente,<br />
<strong>meio</strong> ego desgoverna<strong>do</strong>, <strong>meio</strong> auto-afirmação. vou tentar desistir <strong>do</strong>s<br />
eus, pelo me<strong>no</strong>s até o final <strong>do</strong> dia, o que me parece um pouco difícil posto que o<br />
programa da <strong>no</strong>ite é enfrentar com unhas e dentes o shopping center em busca<br />
<strong>do</strong>s últimos mimos de natal. engraça<strong>do</strong> pensar em tu<strong>do</strong> isso justo <strong>no</strong> dia em que<br />
resolvi fazer meu jejum vata-kapha mensal. pode ter super a ver. ou não. sei lá.<br />
A afirmação de Benveniste (1995, 286), de que “é na e pela linguagem que o<br />
homem se constitui como sujeito,” corresponde-se com a reclamação <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong>r<br />
para com uma atitude recorrente de auto-referencialização por <strong>meio</strong> da palavra<br />
eu. No entanto, é por <strong>meio</strong> dessas asserções que o sujeito pode identificar-se como<br />
um eu, bem como por oposição ao tu. Abdicar de tal palavra, nem que por um dia,<br />
representa o reconhecimento de que a pessoa se constitui na reversibilidade eu-tu.<br />
A confissão “nem eu, que sou eu, sou eu tanto assim” demonstra com clareza esta<br />
imbricação subjetiva.<br />
As narrativas de si <strong>no</strong> ciberespaço são marcadas por um projeto de construção<br />
<strong>do</strong> sujeito em forma de tentativa de unificação <strong>do</strong> eu em tor<strong>no</strong> de um esboço com<br />
fronteiras bem definidas.<br />
A partir <strong>do</strong> que Bauman (2005) de<strong>no</strong>mina como crise de pertencimento, em<br />
que a <strong>no</strong>ção de comunidade baseada na proximidade física entra em colapso para<br />
dar lugar à pre<strong>do</strong>minância de comunidades por afinidade, a questão identitária<br />
emerge como um problema. Deixa de ser uma determinação atribuída e herdada<br />
para tornar-se uma tarefa obrigatória, na qual os atores sociais devem arcar com os<br />
dissabores de seu desempenho individualmente, conforme pode ser observa<strong>do</strong> <strong>no</strong><br />
trecho a seguir, de Continua Valen<strong>do</strong>:<br />
IDENtIFICAçõES E SuBjEtIVAçõES CONtEMPORâNEAS | 115