Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP
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Atravessada também pelos Estu<strong>do</strong>s de Linguagem e pela Psicanálise, aborda-se a<br />
identidade sob uma perspectiva discursiva “que encontra na psicanálise seu ponto<br />
de apoio, voltada sobretu<strong>do</strong> para a constituição <strong>do</strong> sujeito <strong>do</strong> inconsciente que,<br />
imerso <strong>no</strong> discurso – que sempre provém <strong>do</strong> outro –, é mais fala<strong>do</strong> <strong>do</strong> que fala<br />
(Lacan)” (Coracini, 2003: 15).<br />
Pelo narcisismo, segun<strong>do</strong> Birman (Birman in Pinheiro, 2003: 17). “a unidade<br />
<strong>do</strong> eu se forja como mo<strong>do</strong> de se contrapor ao descentramento, sen<strong>do</strong>, portanto ficcional,<br />
uma vez que o descentramento, real, continua se processan<strong>do</strong> pelo viés das<br />
pulsões e <strong>do</strong>s objetos”. Assim, a identidade passa a ser da ordem da ficção inventada<br />
pelo sujeito com a intenção de restaurar a unidade perdida <strong>do</strong> eu, sempre narcísico,<br />
uma tentativa de construir a unidade e o centramento <strong>do</strong> sujeito em face <strong>do</strong> descentramento<br />
representa<strong>do</strong> pela força pulsional. As narrativas de si <strong>no</strong> ciberespaço<br />
devem ser compreendidas nesse <strong>contexto</strong> narcísico, <strong>no</strong> qual a identidade como<br />
unidade seria uma espécie de ficção, permeada por multiplicidades e diversidades<br />
a serem resgatadas pelos processos de identificação.<br />
A<strong>do</strong>ta-se como perspectiva teórica uma abordagem discursiva de senti<strong>do</strong> e sujeito,<br />
a qual postula que os senti<strong>do</strong>s são constituí<strong>do</strong>s na relação entre diferentes<br />
regiões <strong>do</strong> interdiscurso. O intradiscurso, as formulações produzidas pelo sujeito<br />
na enunciação, se relacionam diretamente, ou seja, encontram suas significações<br />
na relação com o interdiscurso, enuncia<strong>do</strong>s <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> repetível. Distancia-se<br />
de perspectivas teóricas da Sociologia ou da Psicologia que postulam um sujeito<br />
racional e centra<strong>do</strong>, fruto das concepções iluministas de sujeito, que ainda vigoram<br />
por algumas correntes teóricas. Supõe-se um sujeito descentraliza<strong>do</strong>, heterogêneo<br />
e disperso, perpassa<strong>do</strong> pelo seu inconsciente, que permite a ele o estranhamento<br />
diante da alteridade e interpela<strong>do</strong> pela ideologia, pela qual o indivíduo vem a ser<br />
sujeito de seus dizeres.<br />
Quan<strong>do</strong> o tema se torna uma questão discursiva, deve-se falar em identificações<br />
e não mais em identidade. Coracini também compartilha dessa necessidade de uma<br />
<strong>no</strong>va conceituação:<br />
Nessa perspectiva, não deveríamos falar de identidade, já que, como dissemos, o termo<br />
remete ao mesmo, ao u<strong>no</strong>, mas de identificações: é apenas momentaneamente<br />
que podemos flagrar pontos <strong>no</strong> discurso que remetem a identificações conscientes,<br />
introjetadas sempre a partir <strong>do</strong> outro mas que, por estarem já lá, provocam reações,<br />
atitudes de recusa ou de aproximação; quan<strong>do</strong> os autores falam de identidade, é<br />
preciso compreendê-la sempre em movimento, em constante mutação (Coracini,<br />
2003: 15).<br />
A crise da identidade seria, portanto, fruto de um duplo deslocamento, psicanalítico<br />
e social. O descentramento social sugere transformações estruturais sofridas<br />
pela sociedade <strong>no</strong> século XX, que fragmentam as agregações por classe, gênero,<br />
sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, bem como movimentos em direção à individualização<br />
das sociedades, em que <strong>no</strong>vos regimes de visibilidade transformam os<br />
mo<strong>do</strong>s de ver e ser visto, bem como os mo<strong>do</strong>s de ser.<br />
A crise de pertencimento, fruto da globalização, coloca a perspectiva sociológica<br />
frente a uma orientação que prioriza a identidade como diferença, fragmentação e<br />
descontinuidade, e não como unidade. O tema passa, assim, a ser intensamente<br />
debati<strong>do</strong>, tanto por estudiosos das Ciências Sociais quanto por aqueles que se interessam<br />
por questões relacionadas à linguagem e ao sujeito:<br />
112 | BLOgS ÍNtIMOS: PERCuRSOS DE SENtIDO NO CONtEXtO DISCuRSIVO DO MEIO DIgItAL