Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP
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ater <strong>no</strong>s gatinhos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e eu tenho que dar um jeito da chuva parar. Ah,<br />
gatinho preto, com tantas coisas mais simples totalmente fora da minha alçada,<br />
como que eu vou controlar justo a chuva? “e que a possibilidade esteja sempre<br />
co<strong>no</strong>sco...” Vera Guimarães citan<strong>do</strong> a amada Esther Lucio Bittencourt<br />
Semelhante ao provérbio, a alusão a slogans também se destina a repetir indefinidamente<br />
uma fórmula curta, apoiada em rimas e que supõe a interpretação <strong>do</strong> coenuncia<strong>do</strong>r.<br />
No entanto, enquanto o provérbio, segun<strong>do</strong> Maingueneau (2008:171),<br />
é “uma asserção sobre a maneira como funcionam as coisas, sobre como funciona o<br />
mun<strong>do</strong>, dizen<strong>do</strong> o que é verdadeiro”, o slogan “está associa<strong>do</strong> sobretu<strong>do</strong> à sugestão<br />
e se destina, acima de tu<strong>do</strong>, a fixar na memória <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res potenciais a<br />
associação entre uma marca e um argumento persuasivo para a compra”. Assim, <strong>no</strong><br />
trecho a seguir, o enuncia<strong>do</strong>r de All Made of Stars utiliza um slogan <strong>do</strong> Ministério da<br />
Saúde, que faz parte de sua campanha contra o tabaco, para efetuar uma recomendação<br />
profissional, empregan<strong>do</strong>-o para argumentar a favor de seu conselho:<br />
E sempre – SEMPRE! – que puder supervisionar seu trabalho com OUTRA<br />
pessoa que NÃONÃONÃODEFINITIVAMENTENÃO dê choque e nem tenha<br />
LINDOSLINDOSLINDOSOSMAISLINDOS olhos acinzenta<strong>do</strong>s, o faça.<br />
O ministério da saúde adverte.<br />
Juro.<br />
IV.4 – ARtICuLAçõES INtERDISCuRSIVAS<br />
O estu<strong>do</strong> das embreagens e debreagens actanciais demonstra os mecanismos de<br />
colocação <strong>do</strong> sujeito <strong>no</strong> discurso, <strong>do</strong>s quais destaca-se a alternância de efeitos de<br />
senti<strong>do</strong> de subjetividade e objetividade materializa<strong>do</strong>s <strong>no</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong>,<br />
mas enfatizan<strong>do</strong> uma subjetividade formada a partir <strong>do</strong> outro, e não <strong>do</strong> eu, apenas.<br />
Os procedimentos de discurso direto e indireto, o emprego das aspas, <strong>do</strong> diálogo e da<br />
estilização por <strong>meio</strong> de músicas, ironia, frases feitas e jargões atestam uma característica<br />
primordial desse objeto: a heterogeneidade de seus enuncia<strong>do</strong>s, seja em relação<br />
à <strong>no</strong>ção de polifonia de Bakhtin ou de uma heterogeneidade constitutiva <strong>do</strong> próprio<br />
discurso, produzida pela dispersão <strong>do</strong> sujeito e que se expressa <strong>no</strong> texto por diversas<br />
formações discursivas, remeten<strong>do</strong> a diferentes posições enunciativas <strong>do</strong> sujeito.<br />
Como a função-autor exerce forte influência <strong>no</strong>s diários virtuais (geralmente<br />
relacionada ao pseudônimo ou <strong>no</strong>me emprega<strong>do</strong> pelo enuncia<strong>do</strong>r), essa heterogeneidade<br />
é trabalhada sempre na oscilação entre um efeito de senti<strong>do</strong> de unidade<br />
de vozes, fazen<strong>do</strong> com que o texto adquira uma coerência autoral e um efeito de<br />
senti<strong>do</strong> polifônico, expresso por <strong>meio</strong> das diversas vozes. O senti<strong>do</strong> não se dá apenas<br />
<strong>no</strong> enuncia<strong>do</strong>, mas também pela relação entre esse enuncia<strong>do</strong> e as vozes discordantes<br />
ocultas pelo enuncia<strong>do</strong>r. Por isso, é importante buscar a “voz <strong>do</strong> Outro” <strong>no</strong>s<br />
enuncia<strong>do</strong>s, uma “heterogeneidade que liga de maneira constitutiva o Mesmo <strong>do</strong><br />
discurso com seu Outro, ou, em outros termos, que permite a inscrição <strong>no</strong> discurso<br />
daquilo que se costuma chamar seu ‘exterior’” (Brandão, 1991: 71).<br />
Certamente um <strong>do</strong>s pontos mais interessantes explora<strong>do</strong>s nesta dissertação envolve<br />
uma problemática <strong>do</strong> interdiscurso, exposta por Maingueneau. Segun<strong>do</strong> o<br />
autor, o discurso pode ser defini<strong>do</strong> como dispersão de textos cujo mo<strong>do</strong> de inscrição<br />
histórica permite definir como um espaço de regularidades enunciativas. Só uma<br />
IDENtIFICAçõES E SuBjEtIVAçõES CONtEMPORâNEAS | 129