12.05.2013 Views

Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

é passível de crítica se implicar a negação da existência de graus possíveis: <strong>do</strong> momento<br />

em que aceitamos, o ponto de referência da confissão permite avaliar outras<br />

estratégias de escrita e de leitura (Lejeune, 2008:56).<br />

O ambiente on-line favorece, portanto, tal flexibilidade ao facilitar a um contrato<br />

autobiográfico de duplo processo: o compromisso e o sistema de apresentação escolhi<strong>do</strong><br />

pelo autor e o mo<strong>do</strong> de leitura escolhi<strong>do</strong> pelo leitor. O hipertexto embaralha as<br />

<strong>no</strong>ções de autoria, narrativa, escrita e leitura, acentuan<strong>do</strong> a diferença interpretativa<br />

entre a primeira proposta e a intenção que será atribuída pelo leitor. A leitura reverte,<br />

portanto, um jogo antes fixo. No hipertexto, tal jogo é representa<strong>do</strong> a partir da<br />

heterogeneidade, pela visão <strong>do</strong> outro.<br />

Ao proclamar a morte <strong>do</strong> autor, essa visão da autoria sugere a emergência <strong>do</strong><br />

leitor como ponto central de atividade interpretativa <strong>no</strong> texto. O surgimento <strong>do</strong> leitor<br />

como questão essencial parece corroborar a idéia de que, <strong>no</strong> hipertexto, o leitor<br />

tem papel similar ao <strong>do</strong> autor, uma vez que seria o leitor o ordena<strong>do</strong>r da seqüência<br />

narrativa à medida que lê ou navega. Assim, se é impossível imaginar que o leitor de<br />

uma enciclopédia, apenas por poder escolher a ordem de leitura, pode ser chama<strong>do</strong><br />

de autor, em termos de autoria hipertextual, ele pode ser de<strong>no</strong>mina<strong>do</strong> autor por<br />

“escrever” sua leitura.<br />

Possenti assinala uma dubiedade que marca a produção acadêmica sobre o hipertexto:<br />

para ele, o leitor, nesses casos, é caracteriza<strong>do</strong> para<strong>do</strong>xalmente. Ora como<br />

to<strong>do</strong>-poderoso, ora como leitor desinteressa<strong>do</strong>. No entanto, o leitor não pode ser<br />

nem mais poderoso que o autor nem pode deixar de ser interpela<strong>do</strong> pela História,<br />

condições sociais e, principalmente, pressões econômicas. Se se afirma que o leitor<br />

<strong>no</strong> hipertexto pode navegar por onde desejar, pois sua liberdade seria total <strong>no</strong><br />

ambiente da interconexão generalizada, é porque não se prestou ainda atenção às<br />

condições de escolha permitidas (sim, o mar percorri<strong>do</strong> tem dimensões gigantescas,<br />

mas o capitão só pode navegar por um lugar a cada vez e as rotas que escolher nem<br />

sempre estão despidas de qualquer interesse ou objetivo). Ou seja:<br />

O leitor com história, leva<strong>do</strong> ao limite, é o leitor interpela<strong>do</strong> pela ideologia e submeti<strong>do</strong><br />

por sua formação discursiva, e, seja ou não patrulha<strong>do</strong>, lerá só o que pode ler, com<br />

algumas exceções e pequenas escapadas, independentemente <strong>do</strong>s <strong>meio</strong>s que tiver à<br />

sua disposição. O leitor sem interesses parece um leitor que tem a sua disposição um<br />

tempo infinito, é um leitor em férias permanentes, que pode dispersar suas consultas<br />

ao bel-prazer <strong>do</strong>s impulsos imediatos (Possenti, 2002: 218).<br />

Será que o leitor <strong>do</strong> hipertexto tem, realmente, toda a liberdade que lhe foi imputada?<br />

Será que ele realmente perde tempo e se distrai a tal ponto de perder o dia<br />

to<strong>do</strong> percorren<strong>do</strong> esses caminhos hipertextuais? Possenti responde:<br />

Em resumo, supor que, <strong>no</strong> livro tradicional o autor era uma autoridade maior que o<br />

leitor, significa, em geral, não especificar os diversos tipos de leitura, de texto e de<br />

autoria. Por outro la<strong>do</strong>, supor que o hipertexto é o rei<strong>no</strong> <strong>do</strong> leitor, é supor que <strong>no</strong> livro<br />

o autor decidia tu<strong>do</strong>, determinava como o texto seria li<strong>do</strong>. Sabemos quanto ambas<br />

as suposições foram questionadas e esmiuçadas. Não temos o direito de fazer essa<br />

discussão como se ela estivesse sen<strong>do</strong> inaugurada agora, como efeito das redes de<br />

computa<strong>do</strong>res (Possenti, 2002: 220).<br />

60 | BLOgS ÍNtIMOS: PERCuRSOS DE SENtIDO NO CONtEXtO DISCuRSIVO DO MEIO DIgItAL

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!