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Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

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confere um valor negativo à incerteza e outro valor positivo à vontade individual <strong>do</strong><br />

sujeito frente à efemeridade da vida.<br />

Por fim, o ato da escrita de uma narrativa de si compõe esse quadro. A capacidade<br />

<strong>do</strong> indivíduo em unificar passa<strong>do</strong>, presente e futuro na escrita biográfica tornada<br />

discurso narra<strong>do</strong> pelo autor-narra<strong>do</strong>r-personagem instaura um campo de renegociação<br />

e reinvenção identitária ao promover a articulação entre a auto-percepção <strong>do</strong><br />

indivíduo e o <strong>contexto</strong> sócio-histórico. No entanto, essa conformidade identitária e<br />

narcísica emerge <strong>no</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong> como um efeito de senti<strong>do</strong>, uma vez<br />

que a desterritorialização e a virtualização espaço-temporais rompem o encadeamento<br />

das identificações da modernidade. A instantaneidade temporal, bem como a<br />

dispersão espacial, representadas pela dimensão imaterial <strong>do</strong> ciberespaço convocam<br />

o enuncia<strong>do</strong>r à criação de um caminho individual <strong>no</strong> labirinto hipermediático, um<br />

percurso descontínuo que institui um lugar e um tempo por <strong>meio</strong> da e na linguagem,<br />

reterritorializan<strong>do</strong>-o e crian<strong>do</strong> um simulacro da ação <strong>do</strong> homem <strong>no</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

A esse efeito de senti<strong>do</strong> particular pode ser relaciona<strong>do</strong> o estilo, um fato diferencial,<br />

apreensível numa totalidade cujo efeito de individualidade permite a<br />

construção <strong>do</strong> ator da enunciação que se manifesta por um ethos (um caráter, que<br />

pressupõe um corpo e uma voz). O ethos dispõe um ponto de vista singular <strong>do</strong> ator<br />

da enunciação, uma imagem que faz de si a partir da legitimação de uma cena<br />

enunciativa, que pressupõe uma cro<strong>no</strong>grafia e uma topografia, um momento e um<br />

lugar da enunciação. A cena forja o ethos, instauran<strong>do</strong> uma forma individualizada de<br />

articular temas e figuras que mira o discurso <strong>do</strong> outro, ora construin<strong>do</strong> um efeito de<br />

senti<strong>do</strong> polifônico, ora mo<strong>no</strong>fônico. Por isso, a cada post pode ser relaciona<strong>do</strong> um<br />

ethos construí<strong>do</strong> discursivamente, um corpo e uma voz identifica<strong>do</strong>s pela cadeia<br />

interpretativa. A maneira de usar temas e figuras e de referenciar a enunciação <strong>no</strong><br />

enuncia<strong>do</strong> difere de post a post, corroboran<strong>do</strong> com o princípio de organização e<br />

sistematização analítica emprega<strong>do</strong>, aporta<strong>do</strong> <strong>no</strong> paradigma <strong>do</strong> post.<br />

Quan<strong>do</strong> o ethos ao longo <strong>do</strong>s posts em um mesmo diário virtual íntimo compõe<br />

um corpo total é que se pode falar em estilo, “recorrência de traços de conteú<strong>do</strong> e<br />

de expressão, que produz um efeito de senti<strong>do</strong> de individualidade”. (Discini, 2003:<br />

31) Se o enuncia<strong>do</strong>r atinge essa especificidade estrutural estilística, ele foi introduzi<strong>do</strong><br />

na ordem da propriedade, traduzin<strong>do</strong> autoria como estatuto social e senti<strong>do</strong><br />

estético. Daí podermos falar <strong>no</strong> autor de Drops da Fal, blog desenvolvi<strong>do</strong> por uma<br />

escritora que teve as narrativas hipertextuais transcritas para o ambiente impresso,<br />

depois de transpostos os filtros editoriais:<br />

sába<strong>do</strong>, outubro 4, 2008<br />

A Maira<br />

Fal Azeve<strong>do</strong> há muito tempo alimenta um blog, como to<strong>do</strong>s nós. Um blog<br />

de opiniões pessoais lançadas com muito humor e melancolia. Um blog que<br />

congrega pessoas das mais diversas tendências políticas e existenciais. Um<br />

blog que não é de direita, não é de esquerda, não quer convencer ninguém,<br />

é o blog da Fal, a palavra certa, na hora certa. Simplesmente isso. Você vai lá<br />

e se diverte com ela, conversa com ela, sofre com ela. Mas você sabe que Fal<br />

escreve outras coisas além <strong>do</strong>s posts. Fal envere<strong>do</strong>u pela literatura e já está <strong>no</strong><br />

seu terceiro livro: Minúsculos assassinatos e alguns copos de leite. E neste livro<br />

você vai encontrar “carne crua” e “<strong>do</strong>ce de leite”, que é a melhor definição de Fal<br />

Azeve<strong>do</strong>. Não procure em Fal Danieis Galeras, Ruffatos, Mirisolas, Calcanhottos<br />

em surtos poético-psicóticos, ou Jabutis. Procure em Fal as palavras de quem<br />

180 | BLOgS ÍNtIMOS: PERCuRSOS DE SENtIDO NO CONtEXtO DISCuRSIVO DO MEIO DIgItAL

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