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Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

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indivíduo em unificar passa<strong>do</strong>, presente e futuro na escrita, ou seja, como função de<br />

linguagem, bem como em sua vida psíquica, o esquizofrênico é justamente aquele<br />

indivíduo incapaz de percorrer o caminho temporal, tanto na sentença quanto, conseqüentemente,<br />

em sua experiência biográfica.<br />

Essa ruptura da temporalidade libera, segun<strong>do</strong> Jameson (1996: 54), “esse presente<br />

<strong>do</strong> tempo de todas as atividades e intencionalidades que possam focalizá-lo e<br />

torná-lo um espaço de práxis”, permitin<strong>do</strong>-o falar em arte esquizofrênica, narrativas<br />

cíclicas, exercícios de descontinuidades e até em uma possível reemergência de um<br />

senti<strong>do</strong> global mais unifica<strong>do</strong> ao longo dessas sentenças desconexas.<br />

Para esse autor, por trás <strong>do</strong> pastiche de múltiplos estilos nas formas culturais que<br />

mimetizam a atual tendência da vida social contemporânea para a fragmentação<br />

das <strong>no</strong>rmas linguísticas, está o apagamento <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> de história. Assim, o fio que<br />

conecta algumas características sociais da contemporaneidade, como o crescente<br />

poder da publicidade e da mídia eletrônica e a ascensão da informação como valor<br />

às mudanças estéticas e culturais é teci<strong>do</strong> na perda da capacidade de conhecer o<br />

próprio passa<strong>do</strong>.<br />

A dificuldade de analisar os diários virtuais <strong>íntimos</strong> em termos lingüísticos e<br />

<strong>discursivo</strong>s passa pela articulação entre teoria e análise. Embora pareça verossímil<br />

falar em perda da historicidade, na dissolução <strong>do</strong> eu centra<strong>do</strong> e na prática <strong>do</strong> pastiche,<br />

o desafio se constitui justamente em articular as margens sociais, culturais<br />

e históricas desse fenôme<strong>no</strong>. Nem to<strong>do</strong>s os posts mimetizam diretamente uma ordem<br />

temporal em que pre<strong>do</strong>mina a perda da historicidade. Alguns, pelo contrário,<br />

resistem às formas fragmentárias da temporalização, buscan<strong>do</strong> constituir um efeito<br />

de senti<strong>do</strong> que unifique passa<strong>do</strong>, presente e futuro em uma escrita que possa ser<br />

atualizada na leitura de forma que considere a sucessividade <strong>do</strong>s acontecimentos.<br />

A importância dessa observação acentua-se com os enfáticos apelos de certos<br />

teóricos que buscam, inadvertidamente, criar uma ponte entre a liberdade <strong>do</strong> sig<strong>no</strong><br />

de sua função de referir-se ao mun<strong>do</strong> e alguns fenôme<strong>no</strong>s aparentemente “descentra<strong>do</strong>s”,<br />

ou seja, que tentam criar uma relação de causa e efeito diretos entre a ruptura<br />

na cadeia de significantes e a escrita <strong>no</strong> ambiente hipertextual, por exemplo. A<br />

afirmação de que o ciberespaço incorpora, em sua totalidade, aspectos da cultura<br />

e estética pós-modernas é repetida acriticamente, basean<strong>do</strong>-se em formulações<br />

apoiadas em análises superficiais <strong>do</strong> tipo de texto que se propaga pela Internet,<br />

bem como pelas formas de interatividade propostas.<br />

V.5 - ESPAçO DA MORtE, ESPAçO DO SEXO<br />

O trecho a seguir ilustra esse descompasso entre uma forma sintaxical que explora<br />

a sucessividade <strong>do</strong>s acontecimentos frente a um ambiente hipertextual que<br />

sugere formas de apropriação e leitura não-lineares.<br />

Feliz 2009<br />

Liliana | Agora que eu sei disso, posso morrer em paz. | Sunday, December 21st,<br />

2008<br />

Hoje é <strong>do</strong>mingo, dia 21 de dezembro de 2008.<br />

E eu fiquei pensan<strong>do</strong> na vida.<br />

Pouca gente tem a oportunidade de reavaliar tão minuciosamente seus conceitos<br />

de vida, felicidade, objetivos, aspirações quanto certas pessoas que estão<br />

<strong>do</strong>entes em camas de hospitais sem saber o que tem.<br />

ESPAçO E tEMPO | 161

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