Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP
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campo <strong>discursivo</strong> e espaço <strong>discursivo</strong>. Universo <strong>discursivo</strong> é o conjunto de formações<br />
discursivas que interagem numa conjuntura dada. É o horizonte a partir <strong>do</strong><br />
qual serão construí<strong>do</strong>s os campos <strong>discursivo</strong>s, constituí<strong>do</strong>s por um conjunto de<br />
formações discursivas que se encontram em concorrência, delimitan<strong>do</strong>-se reciprocamente<br />
em uma região determinada <strong>do</strong> universo <strong>discursivo</strong>. Espaços <strong>discursivo</strong>s<br />
são subconjuntos de formações discursivas que o analista julga relevante para seu<br />
propósito colocar em relação 7 .<br />
Os diários virtuais <strong>íntimos</strong>, como gênero <strong>discursivo</strong>, fazem parte <strong>do</strong> universo<br />
<strong>discursivo</strong> <strong>do</strong> ciberespaço, <strong>no</strong> qual concorrem formações discursivas por vezes conflitantes.<br />
Os sistemas de coerções semânticas <strong>do</strong> ciberespaço permitem afirmar, de<br />
antemão, que algumas continuidades e regularidades serão descobertas <strong>no</strong> pla<strong>no</strong> <strong>do</strong><br />
conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong>.<br />
Estamos diante de uma vasto conjunto textual, produzi<strong>do</strong> por inúmeros indivíduos,<br />
porém to<strong>do</strong>s inseri<strong>do</strong>s em um <strong>contexto</strong> espaço-temporal semelhante, ou<br />
seja, são pessoas inseridas socialmente nas cidades modernas, marcadas por um<br />
tempo em que os <strong>meio</strong>s de comunicação transformam os processos de subjetivação<br />
e identificação, regem a velocidade da transmissão da informação, alteram os esta<strong>do</strong>s<br />
emotivos e as memórias <strong>do</strong> indivíduo, subvertem a relação tradicional moderna<br />
entre o público e o priva<strong>do</strong>, além de sugerirem uma <strong>no</strong>va relação entre o sujeito e o<br />
espaço em que convive.<br />
Para acessar a diversidade de campos ideológicos da época contemporânea, pretende-se<br />
navegar entre a singularidade desses conteú<strong>do</strong>s, pois cria<strong>do</strong>s por sujeitos<br />
autô<strong>no</strong>mos, e a integridade semântica desses conteú<strong>do</strong>s, mergulha<strong>do</strong>s na rede ideológica<br />
<strong>do</strong> ciberespaço. Nas heterogeneidades singulares, buscam-se as regularidades<br />
de uma época, por <strong>meio</strong> de análises textuais, investigan<strong>do</strong> as descontinuidades<br />
sintáticas, bem como as intermitências discursivas.<br />
É <strong>no</strong> interior desse campo <strong>discursivo</strong> que se constituem os discursos a respeito<br />
da função da morte na vida <strong>do</strong> sujeito contemporâneo, permitin<strong>do</strong>-o reconhecer-se<br />
como ser biológico, capaz de alcançar o progresso e a evolução por <strong>meio</strong> da razão,<br />
mas também alheio às vontades de uma ordem sagrada, que toma ares de transcendentalidade<br />
<strong>no</strong>s tempos contemporâneos. Os discursos sobre o amor femini<strong>no</strong><br />
também revelam o estatuto da mulher na sociedade contemporânea, ora como um<br />
ser independente e racional, ora sujeito às variações hormonais impostas pela comunidade<br />
científica. O amor ora adquire tons de liberdade, ora de dependência, da<br />
qual busca-se desassociar imediatamente. Nesse senti<strong>do</strong>, o sexo é visto tanto como<br />
um momento de libertação e independência, como de fraqueza e abertura. Os temas<br />
sexo, amor e morte propõem relações e confrontos inter<strong>discursivo</strong>s <strong>do</strong>s quais se<br />
pode depreender a função da figura <strong>do</strong> indivíduo-sujeito na sociedade contemporânea,<br />
deti<strong>do</strong> entre uma unidade mo<strong>no</strong>lógica individual e uma constante necessidade<br />
<strong>do</strong> outro, como fundamento de sua descentralidade, ambos ata<strong>do</strong>s a uma terceira<br />
ordem, a da culpa católica.<br />
Assim, os discursos sobre a morte, o amor e o sexo na contemporaneidade se<br />
formam <strong>no</strong> interior de um “sistema <strong>no</strong> qual a definição da rede semântica que<br />
circunscreve a especificidade de um discurso coincide com a definição das relações<br />
desse discurso com seu Outro” (Maingueneau, 2008: 36). Admite-se, assim, sempre<br />
um espaço de trocas e traduções, e jamais de identidade fechada. O outro, <strong>do</strong><br />
7. Conceito de interdiscurso defini<strong>do</strong> a partir de resenha da página 33 de Génese <strong>do</strong>s Discursos, de<br />
autoria de Dominique Maingueneau.<br />
IDENtIFICAçõES E SuBjEtIVAçõES CONtEMPORâNEAS | 131