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Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

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Enquanto eu preenchia to<strong>do</strong>s os relatórios, o pessoal da enfermagem levou o<br />

corpo sem vida para o quartinho <strong>do</strong> la<strong>do</strong> e começou a embalá-lo com lençóis e<br />

tampar os orifícios com algodão para não sair nenhum fluí<strong>do</strong> <strong>no</strong>jento de dentro.<br />

Foi quan<strong>do</strong>, <strong>do</strong> nada, ele começou a se mexer.<br />

Os enfermeiros começaram a gritar me chaman<strong>do</strong>: Doutora! Venha logo! O<br />

morto se mexeu!<br />

Eu entrei <strong>no</strong> quartinho e logo percebi: um zumbi.<br />

Eu fugi?<br />

Não!<br />

Fiquei lá e enfrentei o zumbi.<br />

E assim que amanheceu fui na Patologia e cortei a cabeça dele, arranquei o<br />

cérebro para fora e piquei inteirinho.<br />

E para quem duvidar da minha história, devo ter os slides ainda por aqui em<br />

algum lugar.<br />

Ao longo de toda a narrativa <strong>do</strong> post, o enuncia<strong>do</strong>r dá a sua versão <strong>do</strong> episódio<br />

ocorri<strong>do</strong>, em forma de embreagens actoriais enunciativas. No entanto, <strong>no</strong> clímax<br />

da história narrada, ou seja, <strong>no</strong> momento em que o cadáver dá mostras de ainda<br />

estar vivo, o narra<strong>do</strong>r subordina a enunciação ao locutor, que se encarrega de <strong>do</strong>tar<br />

o trecho de marcas enunciativas e elementos expressivos, logo após os <strong>do</strong>is pontos<br />

que demarcam tal fronteira: em frases curtas que mimetizam a fala <strong>do</strong> interlocutor<br />

e caracterizadas pela presença de pontos de exclamação. Passa<strong>do</strong> o ápice da história<br />

narrada, o narra<strong>do</strong>r volta a apagar as marcas expressivas <strong>do</strong> discurso <strong>do</strong> interlocutor.<br />

No blog Nós, mulheres o enuncia<strong>do</strong>r descreve uma situação de diálogo com uma colega,<br />

parte da enunciação. No entanto, em momento algum, o narra<strong>do</strong>r dá a palavra<br />

à colega, mas reproduz semanticamente sua fala por <strong>meio</strong> de traços enunciativos.<br />

Vejamos:<br />

AQUELE ATAQUE DE NERVOS<br />

Seg, 15/09/08<br />

Sempre me perguntam se não é difícil encontrar assunto pra falar diariamente<br />

sobre mulheres. E minha resposta é sempre a mesma: quan<strong>do</strong> se trata <strong>do</strong> sexo<br />

femini<strong>no</strong>, os assuntos são inesgotáveis. É só ouvir uma de <strong>no</strong>ssas conversas e<br />

já está pronto mais um texto pro blog. Outro dia viajei com uma moça super<br />

simpática, a Renata, que trabalha pra uma empresa onde fiz palestra. Conversa<br />

vai, conversa vem, nós duas falan<strong>do</strong> sobre o quanto as mulheres andam<br />

estressadas, e a Renata me revela que anda tão ansiosa, mas tão ansiosa, que<br />

man<strong>do</strong>u manipular um calmante pro seu cachorro, que - segun<strong>do</strong> ela - está<br />

sen<strong>do</strong> afeta<strong>do</strong> por seu esta<strong>do</strong> emocional. Antes que você imagine que a Renata<br />

é uma dessas madames cheias de frescuras, tenho que dizer que ela é uma<br />

mulher batalha<strong>do</strong>ra, casada, 32 a<strong>no</strong>s, que está fazen<strong>do</strong> sua segunda faculdade<br />

e trabalha oito horas por dia. Justamente porque tem acumula<strong>do</strong> tantas tarefas,<br />

Renata anda permanentemente à beira daquele famoso ataque de nervos e<br />

começou a perceber sinais de ansiedade <strong>no</strong> Bidu, seu cachorrinho de estimação.<br />

Comportamentos imprevisíveis, atitudes estranhas, olhar assusta<strong>do</strong> - Renata<br />

IDENtIFICAçõES E SuBjEtIVAçõES CONtEMPORâNEAS | 123

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