Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP
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O autor empírico <strong>do</strong> diário virtual agrega características de arquiteto e de viajante.<br />
Constituí<strong>do</strong> por um para<strong>do</strong>xo em função da facilidade de publicação de conteú<strong>do</strong>s<br />
em diários virtuais <strong>íntimos</strong>, ao mesmo tempo em que é um arquiteto, para<br />
Lúcia Leão (1999), um autor-modelo, seguin<strong>do</strong> a <strong>no</strong>menclatura de Umberto Eco<br />
(2002), que planeja os caminhos da leitura a partir de uma visão global da estrutura<br />
da rede em que se insere e <strong>do</strong> mapa de seu diário, ele é também um viajante<br />
de tantos outros caminhos propostos em leituras na rede. Ele arquiteta seu diário<br />
virtual em cada post, como se semeasse caminhos ten<strong>do</strong> em vista o percurso <strong>do</strong> seu<br />
leitor-viajante. Essa construção arquitetônica é criada, <strong>no</strong> entanto, com elementos<br />
coleta<strong>do</strong>s pelo autor como viajante na rede. A partir <strong>do</strong> primeiro grande labirinto da<br />
rede <strong>no</strong> qual viaja, ele desenha um segun<strong>do</strong> labirinto, com seus passos e escolhas.<br />
E é desse fio que irá arquitetar, “escrever”, um terceiro labirinto.<br />
O autor-modelo-arquiteto propõe um roteiro de viagem ao leitor-modelo-viajante,<br />
que pode escolher seguir os rastros lineares e cro<strong>no</strong>lógicos deixa<strong>do</strong>s pelo arquiteto<br />
<strong>do</strong> diário virtual íntimo ou atravessar esse labirinto transversalmente, sem seguir a<br />
ordem <strong>do</strong>s posts nem o caminho de leitura proposto pelo autor.<br />
SujEItO, ESPAçO E tEMPO<br />
A questão da subjetividade e da identidade torna-se um prisma de análise para<br />
outros aspectos tópicos da vida contemporânea, e a conjunção <strong>do</strong> surgimento <strong>do</strong><br />
discurso sobre a identidade com a emergência <strong>do</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong> introduz<br />
a discussão a respeito das formas de subjetivação e identificação nas comunicações<br />
mediadas por computa<strong>do</strong>r.<br />
Como a comunicação mediada por computa<strong>do</strong>r permite que o diarista fale sem<br />
que, necessariamente, tenha que desenvolver uma relação face-a-face com o leitor,<br />
ela torna-se um significante laboratório social para experimentos de construção e<br />
desconstrução <strong>do</strong> “eu interior”, onde a crise da <strong>no</strong>ção de identidade e de sujeito<br />
constituí<strong>do</strong> na modernidade se expressa. Mudanças estruturais importantes teriam<br />
desloca<strong>do</strong> as identidades culturais de classe, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade,<br />
que passaram a ter fronteiras me<strong>no</strong>s definidas, provocan<strong>do</strong> <strong>no</strong> indivíduo uma<br />
crise de identidade.<br />
A partir <strong>do</strong> que Bauman de<strong>no</strong>mina crise de pertencimento, em que a <strong>no</strong>ção de<br />
comunidade baseada na proximidade física entra em colapso para dar lugar à pre<strong>do</strong>minância<br />
de comunidades por afinidade, a questão identitária emerge como problema.<br />
Deixa de ser uma determinação herdada para tornar-se uma tarefa obrigatória,<br />
na qual os atores sociais devem arcar com seu desempenho individualmente:<br />
As identidades na modernidade líquida “flutuam <strong>no</strong> ar”, algumas de <strong>no</strong>ssa própria<br />
escolha, mas outras infladas e lançadas pelas pessoas em <strong>no</strong>ssa volta, e é preciso<br />
estar em alerta constante para defender as primeiras em relação às últimas (Bauman,<br />
2005: 19).<br />
Quan<strong>do</strong> as estruturas nas quais a identidade nacional se apoiava começam a ruir,<br />
a questão da identidade emerge. Nesse senti<strong>do</strong>, a evolução <strong>do</strong>s transportes e das<br />
telecomunicações tiveram papel importante <strong>no</strong>s questionamentos a respeito desse<br />
conceito. Uma crise de pertencimento coloca a questão da identidade em pauta.<br />
Se, de acor<strong>do</strong> com Bauman (2008:185), “as colocações individuais na sociedade<br />
e os lugares aos quais os indivíduos podem ganhar acesso e <strong>no</strong>s quais podem desejar<br />
se estabelecer estão derreten<strong>do</strong> com rapidez e dificilmente podem servir como<br />
alvos para ‘projetos de vida’”, o enuncia<strong>do</strong>r apóia-se na caracterização sequencial<br />
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