12.05.2013 Views

Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Se o suporte hipertextual transforma algumas características <strong>do</strong>s diários tradicionais,<br />

o mesmo não pode ser dito com relação à importância <strong>do</strong> <strong>no</strong>me para os<br />

diários virtuais <strong>íntimos</strong> e para o gênero autobiográfico em geral. Não apenas um<br />

<strong>no</strong>me próprio, mas um endereço na rede conecta uma página principal, parte ínfima<br />

de uma rede com a qual os autores e leitores interagem perceptivamente, a uma<br />

corporalidade, a um autor responsável por aqueles textos. Em vez de destruir a<br />

identidade entre o narra<strong>do</strong>r, o personagem e o autor, o formato <strong>do</strong>s diários virtuais<br />

<strong>íntimos</strong> a reforça:<br />

A autobiografia é o gênero literário que, por seu próprio conteú<strong>do</strong>, melhor marca a<br />

confusão entre autor e pessoa, confusão em que se funda toda a prática e a problemática<br />

da literatura ocidental desde o fim <strong>do</strong> século 18. Daí a espécie de paixão pelo<br />

<strong>no</strong>me próprio, que ultrapassa a simples “vaidade <strong>do</strong> autor” já que, através dela, é a<br />

própria pessoa que justifica sua existência. (Lejeune, 2008: 33)<br />

Uma das estratégias observadas com a finalidade de interpretação de um texto<br />

se baseia na autoria, ou seja, na busca de indícios autorais que dêem um senti<strong>do</strong><br />

coerente ao texto. Para além <strong>do</strong> construto meramente lingüístico, apela-se para<br />

a instância da autoria como estratégia de interpretação. Também seria o autor o<br />

responsável por organizar o texto linearmente, ou seja, dar-lhe coerência e unidade.<br />

Por esse motivo, não é de espantar que certas afirmações deleguem ao mun<strong>do</strong> digital<br />

a nãolinearização e a fusão da instância de autoria e leitura.<br />

No entanto, tal função da autoria é de sumária importância para os processos<br />

de identificação que regem os diários virtuais <strong>íntimos</strong>. Para Lejeune, o perigo da<br />

indeterminação da primeira pessoa leva à sua neutralização <strong>no</strong> <strong>no</strong>me próprio. A<br />

ligação entre esse <strong>no</strong>me e uma corporalidade autoral define o caráter <strong>do</strong> diário<br />

virtual íntimo:<br />

A aquisição <strong>do</strong> <strong>no</strong>me próprio é, certamente, na história <strong>do</strong> indivíduo, uma etapa tão<br />

importante quanto a fase <strong>do</strong> espelho. O primeiro <strong>no</strong>me recebi<strong>do</strong> e assumi<strong>do</strong> – o<br />

<strong>no</strong>me <strong>do</strong> pai – e sobretu<strong>do</strong> o <strong>no</strong>me próprio, que <strong>no</strong>s distingue dele, são, sem dúvida,<br />

da<strong>do</strong>s fundamentais na história <strong>do</strong> eu (Lejeune, 2008:35).<br />

Além de um gênero contratual, os diários são também textos referenciais pois se<br />

propõem a fornecer informações a respeito de uma “realidade” externa ao texto:<br />

(...) seu objetivo não é a simples verosimilhança, mas a semelhança com o verdadeiro.<br />

Não o efeito <strong>do</strong> real, mas a imagem <strong>do</strong> real. To<strong>do</strong>s esses textos referenciais<br />

comportam então o que chamarei de pacto referencial, implícito ou explícito, <strong>no</strong> qual<br />

se incluem uma definição <strong>do</strong> campo <strong>do</strong> real visa<strong>do</strong> e um enuncia<strong>do</strong> das modalidades<br />

e <strong>do</strong> grau de semelhança aos quais o texto aspira (Lejeune, 2008:36).<br />

O sujeito a que o leitor tem acesso <strong>no</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong> corresponde,<br />

necessariamente, ao sujeito <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong>, ou seja, ao narra<strong>do</strong>r e ao personagem,<br />

diretamente remeti<strong>do</strong>s ao sujeito da enunciação, um autor representa<strong>do</strong> na margem<br />

<strong>do</strong> texto por seu <strong>no</strong>me, ou pela assinatura ao final de cada post, um referente cujo<br />

caráter somente pode ser auferi<strong>do</strong> pelas afirmativas <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong>. To<strong>do</strong>s os diários<br />

virtuais <strong>íntimos</strong>, necessariamente, tem seus posts assina<strong>do</strong>s por um autor. Nem<br />

sempre o <strong>no</strong>me real <strong>do</strong> autor (seu <strong>no</strong>me próprio) corresponde ao <strong>no</strong>me assina<strong>do</strong> ao<br />

final de cada texto.<br />

56 | BLOgS ÍNtIMOS: PERCuRSOS DE SENtIDO NO CONtEXtO DISCuRSIVO DO MEIO DIgItAL

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!