Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP
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Desenvolvi<strong>do</strong>s os conceitos linguísticos e <strong>discursivo</strong>s que condicionam a visão<br />
teórica <strong>do</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong>, bem como descritas as particularidades <strong>do</strong> ambiente<br />
digital, exploramos a interseção entre o suporte hipertextual e as formas narrativas<br />
e discursivas dispostas pelo objeto de pesquisa. Desse cruzamento emergem,<br />
portanto, a problemática da linearidade narrativa digital, da autoria, <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> e,<br />
por último, mas não me<strong>no</strong>s importante, a discussão <strong>do</strong> estatuto de diário <strong>do</strong> objeto<br />
em questão.<br />
Toman<strong>do</strong> um perío<strong>do</strong> semestral (de 01 de julho a 31 de dezembro de 2008)<br />
de dez diários virtuais <strong>íntimos</strong> como amostra foi possível verificar as formas de<br />
emergência <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> de si e <strong>do</strong> outro <strong>no</strong> ciberespaço, sugerin<strong>do</strong> um paralelo entre<br />
as estratégias de interação homem-máquina e os mecanismos de construção discursiva<br />
<strong>do</strong> sujeito e seus processos de identificação media<strong>do</strong>s por computa<strong>do</strong>r. Em<br />
trabalhos pauta<strong>do</strong>s por outras orientações teóricas, fala-se em formação <strong>do</strong> self <strong>no</strong><br />
ciberespaço para descrever tais fenôme<strong>no</strong>s.<br />
Na rede emerge um <strong>no</strong>vo tipo de percepção, uma faculdade que envolve a capacidade<br />
de perceber e habitar o ciberespaço da qual surge um tipo de presença<br />
para<strong>do</strong>xal <strong>do</strong> huma<strong>no</strong>: “As interações – perceptivas e cognitivas – que exercemos<br />
com o advento das redes de hipermídia <strong>no</strong>s levam a redefinir o próprio conceito de<br />
identidade e presença” (Leão, 1999: 110).<br />
Para habitar tanto o mun<strong>do</strong> dito “real” quanto o ciberespaço ainda é empregada<br />
a palavra escrita, ou seja, para interagir e deixar marcas de presença, em ambos os<br />
ambientes, recorre-se à narração <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> por <strong>meio</strong> da escrita, apesar <strong>do</strong> potencial<br />
hipermidiático <strong>do</strong>s <strong>meio</strong>s digitais. Essa narração constitui-se a partir da alteridade,<br />
<strong>do</strong> contato com a diferença. Na rede essa interação é mediada e ocorre a partir de<br />
recortes que traduzem a desordem da rede em uma ordem reconstituída em um<br />
to<strong>do</strong> aparentemente coerente.<br />
Apesar da aparente sutura e unidade que uma biografia materializada em diário<br />
virtual íntimo produzi<strong>do</strong> por um indivíduo na rede possa apresentar, se olhadas a<br />
partir de uma lupa discursiva, as narrativas virtuais singulares guardam, em suas<br />
palavras e, principalmente, em seus links, as heterogeneidades constitutivas e mostradas,<br />
que pululam <strong>no</strong> ambientes on-line, descentralizan<strong>do</strong> o sujeito justamente<br />
na rede em que ele busca tecer sua biografia ilusória. Uma complexidade que os<br />
indivíduos não são capazes de controlar, apesar da vontade e da insistência.<br />
Com a narração autobiográfica na rede busca-se na interação a diferença, para<br />
então conseguir distinguir a semelhança com a qual possa se associar. O caráter<br />
público da rede facilita essa realização, pois coloca, la<strong>do</strong> a la<strong>do</strong>, ainda que virtualmente,<br />
os indivíduos sedentos por saberem quem são, para onde vão, ou até de<br />
onde vieram. Constitui-se representativamente um presente com base nas fantasias<br />
da realidade <strong>do</strong> autor, arquitetan<strong>do</strong> verbalmente um mun<strong>do</strong> virtual. Um mun<strong>do</strong><br />
<strong>no</strong> qual se instala um efeito de senti<strong>do</strong> de realidade que busca uma coerência de<br />
identidade e unidade por parte <strong>do</strong> sujeito <strong>discursivo</strong> ali instala<strong>do</strong>.<br />
A aparência de desordem que pre<strong>do</strong>mina na rede constituiu, desde o desenvolvimento<br />
da problemática da pesquisa, um pressuposto meto<strong>do</strong>lógico o qual o<br />
analista deveria enfrentar e empregar como uma estratégia de pesquisa. Embora<br />
possa sugerir uma configuração indisciplinada, a análise efetuada a partir de posts<br />
como uma unidade segmentada e isolada <strong>do</strong> to<strong>do</strong> <strong>do</strong> blog, unidade cro<strong>no</strong>lógica que<br />
será de<strong>no</strong>minada aqui de vertical (em razão da direção da barra de rolagem criada<br />
pela sucessão de textos), nada tinha de despropositada. Ela fun<strong>do</strong>u um modelo<br />
meto<strong>do</strong>lógico que previa um recorte analítico horizontal que perpassasse por to<strong>do</strong>s<br />
os blogs, deixan<strong>do</strong> necessariamente de relacionar seu proprietário ao conteú<strong>do</strong> ana-<br />
CONSIDERAçõES FINAIS | 173