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Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

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A Internet é um <strong>meio</strong> de comunicação extremamente apoia<strong>do</strong> nas representações<br />

estereotípicas de mun<strong>do</strong>, apesar da heterogeneidade e dinamicidade a ela<br />

associada. Se a ocultação da identidade corporal elimina um processo de estereotipia<br />

pela visão <strong>do</strong> corpo físico, ela o favorece de forma prévia, ou seja, pela interface<br />

apresentada ao leitor, bem como pelo conteú<strong>do</strong>. Assim, o leitor se apóia em representação<br />

sociais pré-determinadas que circulam pela própria Internet para formular<br />

ou incorporar o ethos mostra<strong>do</strong>.<br />

Se, para o autor, a incorporação não é um processo uniforme; ela se modula em<br />

função <strong>do</strong>s gêneros e <strong>do</strong>s tipos de discurso, o simulacro de ethos sobre o qual se<br />

apóia o leitor para construir a corporalidade <strong>do</strong> autor não depende apenas <strong>do</strong> tom<br />

íntimo, marca <strong>do</strong> ethos <strong>no</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong>. A indução de expectativas em<br />

matérias de ethos também ocorre em função de o texto pertencer a um certo gênero<br />

<strong>do</strong> discurso. A estrutura composicional epistolar, caracterizada por uma espacialização<br />

e uma temporalização com referências ao momento da enunciação, já se ocupa<br />

de levar o leitor a crer em um mo<strong>do</strong> priva<strong>do</strong> de dizer.<br />

No entanto, apesar da pretensa estabilidade <strong>do</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong> como<br />

um gênero <strong>discursivo</strong>, sua enunciação joga com o ethos sobre o qual ela se apóia.<br />

Espera-se que os enuncia<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong> estejam em concordância<br />

com o ethos íntimo que deles se supõe. Assim, <strong>no</strong> processo de adesão <strong>do</strong>s sujeitos a<br />

certo posicionamento, em um texto desse tipo, um caráter público não é um da<strong>do</strong><br />

espera<strong>do</strong>.<br />

No entanto, como o ethos visa<strong>do</strong> não implica necessariamente <strong>no</strong> ethos produzi<strong>do</strong>,<br />

o caráter público <strong>do</strong> ambiente hipertextual logo corrompe o ethos íntimo, brincan<strong>do</strong><br />

com a marca íntima desses diários virtuais, trazen<strong>do</strong> para dentro dessa privacidade<br />

uma característica com qual eles não se identificam, pois a questão <strong>do</strong> Ethos está<br />

ligada à da construção da identidade, uma vez que cada acontecimento <strong>discursivo</strong><br />

implica a consideração de representações que os parceiros fazem um <strong>do</strong> outro.<br />

Por <strong>meio</strong> <strong>do</strong> ethos, o destinatário está, de fato, convoca<strong>do</strong> a um lugar, inscrito na<br />

cena de enunciação que o texto implica. Se, para Maingueneau, o texto não é um<br />

conjunto de sig<strong>no</strong>s inertes, mas o rastro deixa<strong>do</strong> por um discurso em que a fala é<br />

encenada, é necessário classificar e ordenar essas encenações. O conceito de cena<br />

da enunciação na Análise <strong>do</strong> Discurso permite que se fale em momento e lugar de<br />

onde o discurso surge, mas fugin<strong>do</strong> de concepções sociologistas da enunciação, que<br />

poderiam clamar por categorias como <strong>contexto</strong> e situação de comunicação. Ao falar<br />

em cena da enunciação, acentua-se o fato de que a enunciação acontece em um<br />

espaço instituí<strong>do</strong>, defini<strong>do</strong> pelo gênero <strong>do</strong> discurso, mas também sobre a dimensão<br />

construtiva <strong>do</strong> discurso, que “se coloca em cena”, instaura seu próprio espaço de<br />

enunciação. A cena <strong>do</strong> discurso é constitutiva, e não independente dele. Maingueneau<br />

propõe uma análise da cena da enunciação em três cenas distintas, dentre as<br />

quais apenas duas estão necessariamente presentes.<br />

A cena englobante é aquela que corresponde ao tipo de discurso. É aquela que<br />

atribui um estatuto pragmático ao tipo de discurso a que pertence um texto, define<br />

o estatuto <strong>do</strong>s parceiros e um certo quadro sociotemporal. Assim, deve-se opor tipo<br />

de discurso a gênero de discurso, sen<strong>do</strong> que o tipo pode recobrir múltiplos gêneros.<br />

O tipo de discurso autobiográfico caracteriza a cena englobante tanto <strong>do</strong>s diários<br />

virtuais <strong>íntimos</strong> quanto <strong>do</strong>s diários tradicionais<br />

Dada a liberdade com que os enuncia<strong>do</strong>res <strong>do</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong> textualizam,<br />

pode-se imaginar que não haja regularidades entre as diversas cenas enunciativas<br />

propostas. Isso ocorre essencialmente porque é impossível pensar em uma<br />

ce<strong>no</strong>grafia única para to<strong>do</strong> um diário virtual íntimo, uma vez que ele é composto<br />

78 | BLOgS ÍNtIMOS: PERCuRSOS DE SENtIDO NO CONtEXtO DISCuRSIVO DO MEIO DIgItAL

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