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Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP

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(segregação da loucura) e controla<strong>do</strong> por uma vontade de verdade, procedimentos<br />

descritos por Foucault (1996). Além desses processos exter<strong>no</strong>s de delimitação, o<br />

discurso <strong>no</strong>s diários virtuais é efeito também de regimes exter<strong>no</strong>s, como: comentário,<br />

autoria e disciplina.<br />

Desta maneira, se “nem os textos toma<strong>do</strong>s em sua singularidade, nem os corpora<br />

tipologicamente pouco marca<strong>do</strong>s dizem respeito verdadeiramente à AD” (Maingueneau,<br />

1997: 14), como resolver o problema da subjetividade e da singularidade<br />

<strong>no</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong>? Como conjugar as coerções sociais <strong>do</strong> discurso e a<br />

aparente liberdade de expressão na rede?<br />

Como relato de si, os diários virtuais promovem um exercício de si mesmo. Ao<br />

estimularem essa prática, permitem a abertura ao olhar <strong>do</strong> outro, prática de duplo<br />

trabalho que implica em introspecção: trabalho de si por si mesmo e de si pelo outro.<br />

Assim como a correspondência, os diários virtuais <strong>íntimos</strong> atuam “<strong>no</strong> senti<strong>do</strong> da<br />

subjetivação <strong>do</strong> discurso verdadeiro, isto é, na sua assimilação como bem próprio”.<br />

Além disso, também operam uma objetivação da alma, pois colocam as experiências<br />

de si à prova <strong>do</strong> outro, por <strong>meio</strong> da palavra escrita: “Se o papel <strong>do</strong>s hypomnemata é<br />

permitir a constituição de si a partir da recolha <strong>do</strong> discurso <strong>do</strong>s outros, o papel da<br />

correspondência é aquele da troca <strong>do</strong> serviço da alma” (Foucault, 1992: 152).<br />

A subjetivação de si e a objetivação da alma pelo discurso permitem formas de<br />

construção da identidade, ativan<strong>do</strong> a qualidade de um mo<strong>do</strong> de ser. No hipertexto,<br />

estas possibilidades de expressão pessoal são ainda mais acentuadas, pela distância<br />

temporal e espacial entre enuncia<strong>do</strong>r e enunciatário, bem como pelas imagens<br />

que podem fazer crer ser, através <strong>do</strong>s instrumentos interativos da rede. É esta a<br />

função etopoiética de que fala Foucault, de construção de um “caráter” por <strong>meio</strong><br />

da narrativa.<br />

Tanto a subjetivação de si quanto a objetivação da alma se dão discursivamente.<br />

É por <strong>meio</strong> <strong>do</strong> discurso de si que o autor <strong>do</strong> diário virtual se reconhece como<br />

singular e se diferencia ilusoriamente <strong>do</strong> outro na rede. A subjetivação por <strong>meio</strong> <strong>do</strong><br />

discurso produz um saber de si, bem como um cuidar de si que tem como base a<br />

singularidade discursiva. No entanto, talvez seja mais simples buscar as formas e<br />

estratégias de subjetivação em sua objetivação.<br />

A objetivação <strong>do</strong> sujeito por <strong>meio</strong> <strong>do</strong>s dispositivos e das práticas discursivas permite<br />

que o indivíduo se reconheça como sujeito inscrito em dada ordem histórica<br />

e social. No entanto, ao mesmo tempo em que o sujeito é objetiva<strong>do</strong> pelos dispositivos<br />

e pelas práticas institucionais, subjetiva-se <strong>no</strong> mesmo movimento. Inseri<strong>do</strong>s<br />

<strong>no</strong> mun<strong>do</strong> como objetos, é como se os sujeitos não se permitissem reconhecer-se<br />

homogeneamente numa sociedade e, para isso, necessitassem construírem-se em<br />

cima de e por <strong>meio</strong> de uma subjetividade singular.<br />

As formas de objetivação <strong>do</strong> sujeito contemporâneo são também formas de submissão<br />

dessa subjetividade. As relações de poder subjugam, tornam sujeito, mas<br />

também marcam a individualidade e dão forma à subjetividade por <strong>meio</strong> das resistências<br />

que buscam trazer o indivíduo de volta ao sujeito. Lutas contra as formas<br />

de exploração e <strong>do</strong>minação e contra aquilo que liga o indivíduo a si mesmo e o<br />

submete ao outro. Enfim, são disputas contra as diversas formas de sujeição, que<br />

buscam atacar as relações de poder alavancadas pelos dispositivos e pelas práticas<br />

discursivas.<br />

Essa subjetivação, portanto, é a maneira como os sujeitos objetiva<strong>do</strong>s apropriamse<br />

dessa objetivação e, a partir dela, se fazem reconhecer como sujeitos. Também<br />

pode ser compreendida como um uma estratégia de rebeldia contra a objetivação,<br />

com a finalidade de se fazerem e se acreditarem como seres singulares.<br />

uMA VISãO LINgüÍStICO-DISCuRSIVA | 49

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