Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP
Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP
Blogs íntimos: percursos no contexto discursivo do meio - ECA-USP
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Uma vez afirmada a inscrição da AD <strong>no</strong> espaço lingüístico, é conveniente questionar<br />
de que forma ela deve pensar sua relação com a lingüística. (...) é preciso ser lingüista<br />
e deixar de sê-lo, ao mesmo tempo (...). Situação de desequilíbrio perpétuo que tanto<br />
impede a AD de deixar esse campo quanto enclausurar-se nesta ou naquela de suas<br />
escolas ou de seus ramos. (...) não é pois uma parte da lingüística que estudaria os<br />
textos da mesma forma que a fonética estuda os sons, mas ela atravessa o conjunto<br />
<strong>do</strong>s ramos da lingüística (...) (Maingueneau, 1997:17).<br />
A Análise <strong>do</strong> Discurso foi escolhida como méto<strong>do</strong> de observação desta pesquisa,<br />
pois permite alcançar o diário virtual em sua instância interpretativa, já que ela:<br />
Visa à compreensão de como um sujeito simbólico produz senti<strong>do</strong>s, como ele está<br />
investi<strong>do</strong> de significância para e por sujeitos. Essa compreensão, por sua vez, implica<br />
em explicitar como o texto organiza os gestos de interpretação que relacionam sujeito<br />
e senti<strong>do</strong> (Orlandi, 1999: 26).<br />
O caráter interpretativo <strong>do</strong> discurso <strong>no</strong>s diários virtuais traz a necessidade de<br />
reflexão epistemológica pelo pesquisa<strong>do</strong>r, pois cada analista formula questões diferentes<br />
em relação a uma mesma questão ou objeto, mobilizan<strong>do</strong> conceitos diversos<br />
e fazen<strong>do</strong> distintos recortes conceituais.<br />
Orlandi distingue entre um dispositivo teórico da interpretação e um dispositivo<br />
analítico construí<strong>do</strong> pelo pesquisa<strong>do</strong>r a cada análise, individualiza<strong>do</strong> pelo pesquisa<strong>do</strong>r<br />
em uma análise específica. Para a autora, “o dispositivo teórico é o mesmo,<br />
mas os dispositivos analíticos não. O que define a forma <strong>do</strong> dispositivo analítico é<br />
a questão posta pelo analista, a natureza <strong>do</strong> material que analisa e a finalidade da<br />
análise” (Orlandi, 1999: 27).<br />
O pesquisa<strong>do</strong>r não deve portar-se como um simples leitor <strong>do</strong> diário virtual, que<br />
efetua interpretações daquilo que lê, mas como um analista que constrói dispositivos<br />
de análise a partir de recortes e conceituações anteriores. Ele deve, portanto,<br />
efetuar esta ruptura epistemológica, passan<strong>do</strong> de simples leitor que interpreta, de<br />
acor<strong>do</strong> com as percepções e seu repertório cultural, a analista, aparamenta<strong>do</strong> pelas<br />
ferramentas meto<strong>do</strong>lógicas de observação que escolheu. E os enfoques teóricos e<br />
analíticos estarão sempre subordina<strong>do</strong>s a seu olhar sobre a maneira como o sujeito<br />
é constituí<strong>do</strong> na trama de senti<strong>do</strong>s <strong>do</strong> diário virtual assim como sua problemática<br />
teórica.<br />
O pesquisa<strong>do</strong>r deve buscar descrever o gesto de interpretação <strong>do</strong> sujeito que<br />
constitui o senti<strong>do</strong>, o que também pode ser compreendi<strong>do</strong> como uma interpretação<br />
por parte <strong>do</strong> pesquisa<strong>do</strong>r. O pesquisa<strong>do</strong>r também está envolvi<strong>do</strong> na interpretação e,<br />
por isso, é necessário:<br />
Introduzir-se um dispositivo teórico que possa intervir na relação <strong>do</strong> analista com<br />
os objetos simbólicos que analisa, produzin<strong>do</strong> um deslocamento em sua relação de<br />
sujeito com a interpretação: esse deslocamento vai permitir que ele trabalhe <strong>no</strong> entre<strong>meio</strong><br />
da descrição com a interpretação (Orlandi, 1999: 60).<br />
Em apenas uma navegação superficial pelo mun<strong>do</strong> <strong>do</strong>s diários virtuais <strong>íntimos</strong><br />
não é fácil verificar marcas enunciativas ou regularidades que remetem à instância<br />
social ou ideológica. Os textos (ou posts) parecem estar mais próximos de uma definição<br />
<strong>do</strong> caos <strong>discursivo</strong> <strong>do</strong> que de uma ordem, remeten<strong>do</strong> a pequenas pílulas sem<br />
conexão entre si e incapazes de fornecer uma coerência global. No entanto, a esco-<br />
uMA VISãO LINgüÍStICO-DISCuRSIVA | 41