Maravilhosa Graça - Noiva de Cristo
Maravilhosa Graça - Noiva de Cristo
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Claro que o fato dos presentes não merecidos e prazeres inesperados produzirem a maior alegria tem<br />
significado teológico. A graça se alteia. Ou, como dizem as palavras no pára-choque, "A graça acontece".<br />
Para muitos, o amor romântico é a experiência mais próxima <strong>de</strong> pura graça. Pelo menos alguém sente que eu<br />
— Eu!— sou a criatura mais <strong>de</strong>sejável, mais atraente, mais companheira do planeta. Alguém fica acordado <strong>de</strong><br />
noite pensando em mim. Alguém me perdoa antes que eu peça, pensa em mim quando está se vestindo. Alguém<br />
organiza a vida ao redor da minha. Alguém me ama exatamente como eu sou. Por causa disso, creio que escritores<br />
mo<strong>de</strong>rnos como John Updike e Walker Percy, que têm forte sensibilida<strong>de</strong> cristã, escolhem um relacionamento<br />
sexual como símbolo da graça em seus romances. Eles estão falando a linguagem que a nossa cultura<br />
compreen<strong>de</strong>: a graça como um rumor, e não uma doutrina.<br />
E, então, surge um filme como Forrest Gump, a respeito <strong>de</strong> um garoto com um baixo QI que conta<br />
banalida<strong>de</strong>s ouvidas <strong>de</strong> sua mãe. Este indivíduo retardado salva seus companheiros no Vietnã, mantém-se fiel à<br />
namorada Jenny, apesar da infi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong>la, mantém-se fiel ao filho e a si mesmo, e vive como se genuinamente<br />
não soubesse que é o alvo <strong>de</strong> todas as piadas. A cena mágica <strong>de</strong> uma pena inicia e termina o filme — uma nota <strong>de</strong><br />
graça tão leve que ninguém sabe on<strong>de</strong> vai parar. Forrest Gump foi para os tempos mo<strong>de</strong>rnos o que O Idiota foi<br />
para o tempo <strong>de</strong> Dostoiévski, e provocou reações semelhantes. Muitos acharam que era ingênuo, ridículo,<br />
manipulador. Outros, entretanto, viram nele um rumor <strong>de</strong> graça que trouxe forte alívio da violenta <strong>de</strong>sgraça <strong>de</strong><br />
Pulp Fiction e Natural Born Killers [Nascidos para Matar]. Como resultado, Forrest Gump tornou-se o filme <strong>de</strong><br />
maior sucesso no seu tempo. O mundo tem fome <strong>de</strong> graça.<br />
Peter Greave 16 escreveu reminiscências <strong>de</strong> sua vida com lepra, uma enfermida<strong>de</strong> que contraiu enquanto estava<br />
servindo na Índia. Voltou à Inglaterra, meio cego e parcialmente paralisado, para viver em um retiro dirigido por<br />
um grupo <strong>de</strong> irmãs anglicanas. Incapaz <strong>de</strong> trabalhar, um pária da socieda<strong>de</strong>, tornou-se uma pessoa amarga. Pensou<br />
em suicídio. Fez planos elaborados para fugir do retiro, mas sempre voltava porque não tinha para on<strong>de</strong> ir. Uma<br />
manhã, contra os seus hábitos, levantou-se muito cedo e ficou andando pela proprieda<strong>de</strong>. Ouviu um murmúrio e o<br />
seguiu até a capela, on<strong>de</strong> as irmãs estavam orando pelos pacientes cujos nomes estavam escritos nas pare<strong>de</strong>s.<br />
Entre os nomes, encontrou o seu. De alguma forma essa experiência <strong>de</strong> conexão, <strong>de</strong> ligação, mudou o rumo <strong>de</strong><br />
sua vida. Ele se sentiu <strong>de</strong>sejado. Ele sentiu a graça.<br />
A fé religiosa — com todos os seus problemas, apesar <strong>de</strong> sua enlouquecedora tendência para copiar a nãograça<br />
— sobrevive porque sentimos a beleza luminosa do dom imerecido que vem em momentos inesperados <strong>de</strong><br />
fora. Recusando-nos a crer que nossas vidas <strong>de</strong> culpa e vergonha não nos levam a nada a não ser à aniquilação,<br />
esperamos, sem nenhuma esperança, um outro lugar dirigido por regras diferentes. Crescemos famintos <strong>de</strong> amor<br />
e, <strong>de</strong> maneira tão profunda que não conseguimos expressar, ansiamos por que o nosso Criador nos ame.<br />
A graça não veio a mim inicialmente nas formas ou nas palavras <strong>de</strong> fé. Fui criado em uma igreja que, com<br />
freqüência, utilizava a palavra, mas com significado diferente. A graça, como muitos termos religiosos, ficou<br />
<strong>de</strong>sprovido <strong>de</strong> significado, <strong>de</strong> modo que eu já não podia mais confiar nela.<br />
Primeiro experimentei a graça por meio da música. Na faculda<strong>de</strong> cristã que freqüentava, eu era consi<strong>de</strong>rado<br />
um <strong>de</strong>sviado. As pessoas oravam por mim publicamente e me perguntavam se eu não precisava <strong>de</strong> exorcismo. Eu<br />
me sentia embaraçado, perturbado, confuso. As portas do dormitório eram trancadas à noite, mas felizmente eu<br />
morava no primeiro andar. Eu <strong>de</strong>scia pela janela do meu quarto e me esgueirava para a capela, que tinha um<br />
gran<strong>de</strong> piano Steinway. Na capela às escuras, a não ser por uma luzinha para ler a música, eu ficava sentado mais<br />
ou menos uma hora todas as noites para tocar as sonatas <strong>de</strong> Beethoven, os prelúdios <strong>de</strong> Chopin e os improvisos <strong>de</strong><br />
Schubert. Meus <strong>de</strong>dos pressionavam uma espécie <strong>de</strong> botão palpável para o mundo. Minha mente estava confusa,<br />
meu corpo estava confuso, o mundo estava confuso — mas ali eu sentia um mundo oculto <strong>de</strong> beleza, <strong>de</strong> graça e <strong>de</strong><br />
maravilhosa luz como uma nuvem e surpreen<strong>de</strong>nte como a asa <strong>de</strong> uma borboleta.<br />
Uma coisa parecida acontecia no mundo da natureza. Para fugir da pressão das idéias e das pessoas, eu fazia<br />
longas caminhadas nas florestas <strong>de</strong> pinheiros salpicadas <strong>de</strong> cornisos. Seguia os vôos em ziguezague das libélulas<br />
ao longo do rio, observava bandos <strong>de</strong> pássaros girando por sobre a minha cabeça e quebrava achas <strong>de</strong> lenha para<br />
encontrar <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>las muitos insetos. Eu gostava do jeito certo e inevitável da natureza dando forma e lugar a<br />
todos os seres viventes. Eu via evidências <strong>de</strong> que o mundo continha gran<strong>de</strong>za, gran<strong>de</strong> bonda<strong>de</strong> e, sim, traços <strong>de</strong><br />
alegria.<br />
Mais ou menos na mesma época, me apaixonei. Foi exatamente como levar um tombo, um trambolhão que me<br />
virou do avesso, <strong>de</strong>ixando-me em um estado <strong>de</strong> alegria incontrolável. A terra se inclinava sobre o seu eixo.<br />
Naquele tempo eu não acreditava em amor romântico, pensando que fosse uma construção humana, uma invenção<br />
dos poetas italianos do século XVI. Estava tão <strong>de</strong>spreparado para o amor quanto estivera para a bonda<strong>de</strong> e a<br />
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