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Maravilhosa Graça - Noiva de Cristo

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diante do prédio do Comitê Central do Partido Comunista e, <strong>de</strong> hora em hora, os pelotões da marcha cantavam em<br />

uníssono: "Nós perdoamos, nós perdoamos!", ao passarem pelo edifício. Alguns gritavam as palavras com toda<br />

sincerida<strong>de</strong>. Outros gritavam quase com <strong>de</strong>sprezo, como se dissessem: "Vocês não são nada, nós nem mesmo<br />

odiámos vocês".<br />

Alguns anos <strong>de</strong>pois, Jerzy Popeiluszko, um padre <strong>de</strong> trinta e cinco anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, cujos sermões eletrificaram<br />

a Polônia, foi encontrado boiando no rio Vístula com os olhos furados e as unhas arrancadas. Novamente os<br />

católicos saíram às ruas marchando com ban<strong>de</strong>iras que diziam: "Nós perdoamos. Nós perdoamos". Popeiluszko<br />

pregara a mesma mensagem domingo após domingo às multidões que enchiam a praça diante <strong>de</strong> sua igreja:<br />

"Defendam a verda<strong>de</strong>. Vençam o mal com o bem". Depois <strong>de</strong> sua morte, eles continuaram lhe obe<strong>de</strong>cendo e, no<br />

final, foi exatamente este espírito <strong>de</strong> graça prevalecente que provocou o colapso do regime.<br />

Por toda a Europa Oriental a luta do perdão ainda está em andamento. Um pastor na Rússia <strong>de</strong>veria perdoar os<br />

oficiais da KGB que o pren<strong>de</strong>ram e arrasaram a sua igreja? Os romenos <strong>de</strong>veriam perdoar os médicos e<br />

enfermeiras que acorrentaram órfãos doentes às suas camas? Os cidadãos da Alemanha Oriental <strong>de</strong>veriam perdoar<br />

os <strong>de</strong>latores — inclusive professores <strong>de</strong> seminário, pastores e cônjuges traidores — que os espionaram? Quando a<br />

ativista dos direitos humanos Vera Wollenberger soube que fora o seu marido que a havia <strong>de</strong>nunciado para a<br />

polícia secreta, resultando em sua prisão e exílio, correu para o banheiro e vomitou. "Eu não gostaria <strong>de</strong> que<br />

ninguém experimentasse o inferno pelo qual passei", ela diz.<br />

Paul Tillich uma vez <strong>de</strong>finiu o perdão como lembrar o passado para que ele possa ser esquecido — um<br />

princípio que se aplica às nações como também aos indivíduos. Embora o perdão nunca seja fácil, e possa<br />

<strong>de</strong>morar por gerações, o que mais po<strong>de</strong>ria quebrar as ca<strong>de</strong>ias que escravizam as pessoas ao seu passado histórico?<br />

Nunca me esquecerei <strong>de</strong> uma cena que testemunhei na União Soviética em outubro <strong>de</strong> 1991. Contei a história<br />

num livro publicado logo após a visita, mas vale a pena recontá-la. Na ocasião, o império soviético estava se<br />

<strong>de</strong>smanchando. Mikhail Gorbachev estava pendurado em seu cargo por um fio e Boris Yeltsin consolidava seu<br />

po<strong>de</strong>r dia após dia. Eu acompanhei uma <strong>de</strong>legação <strong>de</strong> cristãos que se encontrou com lí<strong>de</strong>res russos em resposta ao<br />

pedido <strong>de</strong>les para ajudá-los a "restaurar a moralida<strong>de</strong>" no país.<br />

Embora Gorbachev e todos os oficiais do governo que visitamos nos recebessem calorosamente, os antigos do<br />

nosso grupo nos advertiram que aguardássemos tratamento diferente na noite em que visitamos o quartel-general<br />

da KGB. Uma estátua do seu fundador, Feliks Dzerzhinsky, podia ter sido <strong>de</strong>rrubada do pe<strong>de</strong>stal pela multidão no<br />

lado <strong>de</strong> fora do edifício, mas sua memória vivia ali <strong>de</strong>ntro. Uma gran<strong>de</strong> fotografia do conhecido lí<strong>de</strong>r ainda pendia<br />

<strong>de</strong> uma pare<strong>de</strong> em nossa sala <strong>de</strong> reuniões. Agentes, com os rostos tão inexpressivos e impassíveis quanto os <strong>de</strong><br />

seus estereótipos cinematográficos, estavam <strong>de</strong> pé junto à porta do auditório forrado <strong>de</strong> painéis <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira<br />

enquanto o general Nikolai Stolyarov, o vice-presi<strong>de</strong>nte da KGB, apresentava-se à nossa <strong>de</strong>legação. Nós nos<br />

preparamos.<br />

"Encontrar-se com os senhores aqui esta noite", começou o general Stolyarov, "é uma mudança no enredo que<br />

não po<strong>de</strong>ria ter sido concebida pelo mais louco escritor <strong>de</strong> ficção". Ele tinha razão. Em seguida, ele nos <strong>de</strong>ixou<br />

perplexos dizendo: "Nós aqui na URSS enten<strong>de</strong>mos que com muita freqüência fomos negligentes em aceitar os<br />

seguidores da fé cristã. Mas questões políticas não po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong>cididas até que haja sincero arrependimento, um<br />

retorno do povo à fé. Esta é a cruz que tenho <strong>de</strong> carregar. No estudo do ateísmo eficiente, há a idéia <strong>de</strong> que a<br />

religião divi<strong>de</strong> o povo. Agora vemos o oposto: o amor a Deus apenas po<strong>de</strong> unir".<br />

Nossas cabeças giravam. On<strong>de</strong> ele havia aprendido a frase "carregar uma cruz"? E a outra palavra —<br />

arrependimento? O tradutor havia acertado? Lancei um olhar para Peter e Anita Deyneka, banidos da Rússia há<br />

treze anos por causa <strong>de</strong> sua obra cristã, agora mastigando biscoitos no quartel-general da KGB.<br />

Yoel Ne<strong>de</strong>rhood, um homem gentil e educado que fazia programas <strong>de</strong> rádio e televisão para a Igreja Cristã<br />

Reformada, queria fazer uma pergunta a Stolyarov. "General, muitos <strong>de</strong> nós lemos o relatório <strong>de</strong> Solzhenitsyn a<br />

respeito do Gulag. Alguns <strong>de</strong> nós até mesmo per<strong>de</strong>mos membros da família ali." Seu atrevimento colocou alguns<br />

dos seus colegas em guarda, e a tensão na sala aumenta sensivelmente. "Seus agentes, naturalmente, são<br />

responsáveis pela fiscalização das prisões, inclusive aquela localizada no porão <strong>de</strong>ste edifício. Como o senhor<br />

respon<strong>de</strong> a esse passado?"<br />

Stolyarov respon<strong>de</strong>u cautelosamente: "Eu falei <strong>de</strong> arrependimento. Este é um passo essencial. Vocês<br />

provavelmente conhecem o filme <strong>de</strong> Abuladze com esse título. Não po<strong>de</strong> haver perestroika sem arrependimento.<br />

Chegou o momento <strong>de</strong> nos arrepen<strong>de</strong>rmos do passado. Nós transgredimos os Dez Mandamentos, e por isso<br />

estamos pagando".<br />

Eu havia assistido a Repentance [Arrependimento], <strong>de</strong> Tengiz Abuladze, e a alusão <strong>de</strong> Stolyarov ao filme foi<br />

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