Monopólios Digitais
Concentração e Diversidade na Internet
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<strong>Monopólios</strong><br />
<strong>Digitais</strong><br />
A suposta promessa da possibilidade de maior concorrência na Internet pela<br />
redução de custos se mostra, também nesse segmento, um argumento frágil. Ao contrário,<br />
a condição de liderança internacional do Netflix e a consequente receita auferida<br />
em razão disso permite à empresa instalar servidores com o seu conteúdo em pontos<br />
de troca de tráfego, melhorando o sinal e impedindo interrupções nos streamings.<br />
Qualquer empresa, indivíduo ou organização que queira ter um alcance como o do<br />
Netflix hoje tem na qualidade do sinal um desafio, e bastante custoso.<br />
De outro lado, o único serviço de vídeo online nacional que aparece nas listas<br />
debatidas é o da Globo (Globo Play). Não por acaso, não se trata de um novo grupo<br />
surgido no contexto da Internet ou uma produtora sem fins lucrativos, mas do maior<br />
conglomerado de mídia do Brasil, como mostra o estudo “Quem controla a mídia no<br />
Brasil – Media Ownership Monitor”, elaborado pelo Intervozes em parceria com a organização<br />
Repórteres Sem Fronteiras (RSF) 9 . O grupo possui faturamento cinco vezes<br />
maior do que o segundo colocado (Record). A Rede Globo tem cinco emissoras próprias<br />
e 118 afiliadas, cujo sinal chega a 99% da população. A audiência ficou em 37%,<br />
mais do que o dobro da rede segunda colocada, o SBT (14,9%) 10 .<br />
No caso da Globo, há um elemento a mais para além do domínio de mercado<br />
que faz com que os veículos do grupo, por exemplo, tenham participação no bolo publicitário<br />
muito superior à sua audiência. A companhia não se limita à finalidade de lucro<br />
de seus negócios. Ela tem atuação ativa nas esferas política, cultural e social do país. Embora<br />
não seja possível aprofundar este tema, diversos pesquisadores já documentaram<br />
a ação do Grupo Globo 11 na história do Brasil, em momentos como a ditadura militar, os<br />
protestos pelas Diretas Já (invisibilizados pela cobertura da rede), diversas eleições (cujo<br />
episódio histórico é a edição do debate entre os candidatos Fernando Collor de Mello<br />
e Luiz Inácio Lula da Silva, em 1989), na agenda política nos mais diversos temas e gestões<br />
12 e, mais recentemente, no impeachment da Presidenta Dilma Rousseff em 2016.<br />
citado anteriormente indicou que 71% dos respondentes afirmaram ter visto vídeos por meio do serviço.<br />
Em seguida, com 50%, vem a Globo, com 40% o Google Play, 20% a Amazon e 17% o Itunes (EMARKETER,<br />
2016). Não há, entre os demais serviços internacionais, uma ameaça concreta a essa liderança, tendo o<br />
Netflix desempenho 177% melhor que o segundo colocado e 350% melhor que o terceiro.<br />
9 O projeto, as informações levantadas e as análises podem ser conhecidas em https://brazil.mom-rsf.org/br/<br />
10 Informações compiladas pelo projeto “Quem Controla a Mídia no Brasil”. Disponíveis em: <br />
11 Como Herz, Daniel, Celso Augusto Schröder e Nilo André Piana de Castro. A história secreta da Rede<br />
Globo,. Dom Quixote Editora, 2009; Brittos, Valério Cruz e César Bolaño. Rede Globo: 40 anos de poder<br />
e hegemonia. Paulus, 2005; Bolaño, César. Mercado brasileiro de televisão. Editora da PUC-SP, 2004; De<br />
Lima, Venicio Artur. Mídia: crise política e poder no Brasil. Editora Fundação Perseu Abramo, 2006; e<br />
Miguel, Luís Felipe. Biroli, Flávia. Notícias em disputa: mídia, democracia e formação de preferências no<br />
Brasil. São Paulo: Contexto, 2017.<br />
12 Em 1985, Ulysses Guimarães, figura-chave do PMDB, interpelou o então presidente Tancredo Neves<br />
criticando a indicação de Antônio Carlos Magalhães para o Ministério das Comunicações a pedido do<br />
patriarca da Globo, Roberto Marinho. E ouviu como resposta: “Olha, Ulysses, eu brigo com o papa, eu<br />
brigo com a Igreja Católica, eu brigo com o PMDB, com todo mundo, eu só não brigo com o doutor Roberto”,<br />
conforme retratado em Pieranti, Octavio Penna. Políticas públicas para radiodifusão e imprensa.<br />
FGV Editora, 2007. Em 2002, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva despontava nas eleições e foi alvo de<br />
uma onda de pânico provocada por empresários e setores contrários. Antônio Palocci, então coordenador<br />
de campanha, que depois se tornaria ministro da Fazenda de Lula, redigiu um documento intitulado<br />
“Carta ao Povo Brasileiro” com compromissos para acalmar esses setores. O conteúdo foi negociado<br />
com João Roberto Marinho, hoje presidente do Conselho do grupo e herdeiro de Roberto Marinho. O<br />
episódio foi relatado pelo próprio em seu livro “Sobre Formigas e Cigarras” (Objetiva, 2007). Em 2017, foi<br />
noticiado que o atual presidente do Brasil, Michel Temer, se encontrou com João Roberto Marinho para<br />
discutir a cobertura sobre seu governo e a aprovação da Reforma da Previdência proposta pelo Execu-<br />
GRAU DE<br />
DIVERSIDADE E<br />
PLURALIDADE<br />
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